AGENDA CULTURAL

31.7.10

Vote em mim!

Hélio Consolaro*

As eleições ameaçam as ruas com certa timidez. Assim, neste julho, os comitês ainda estão surgindo, os candidatos estão grávidos de esperança, todos se sentem eleitos. Já começa a surgir um santinho aqui, outro acolá. Carros pintados. “Santinho” porque todos os candidatos se tornam santos em campanha eleitoral, e os cabos eleitorais imitam os antigos padres que davam santinhos (imagens em papéis) nas portas das igrejas.

Aliás, a palavra “candidato” se origina de “cândido” que significa puro, pois em Roma os candidatos a cargos eletivos vestiam toga branca.

Os candidatos, então, já esgoelam:

- Vote em mim! Pense em mim! Não pense no outro!

- Eu sou o bom! Bom demais!

Eles podem fazer isso, são cândidos e distribuem sua própria santidade ao eleitorado. Há aqueles que se consideram super-homens. Fazem, arrebentam, vão endireitar o mundo, mas na verdade, como já dizia Gregório de Matos no século 17, não conseguem administrar nem sua própria casa.

Há algumas mentiras que a repetimos demais, portanto, se tornaram verdades. Exemplos: quem é bom nas pequenas coisas, tem chance de ser bom nas grandes; boas árvores produzem bons frutos. Essas verdades pétreas nem sempre são verdadeiras; filho de peixe, peixinho é. Cuidado com tais frases em campanha eleitoral.

Professor ou professora conhecem bem o processo eleitoral, pois sempre estão promovendo a eleição do representante de classe. Nunca vence o aluno cê-dê-efe, mas o cara do fundão, porque não existe pessoa mais chata que o cumpridor de seus deveres. Ela quer que todos sejam iguais a ela.

Por isso é que, em 1986, o povo paulista preferiu Orestes Quércia a Antônio Ermírio de Moraes para governar o estado. O empresário ia querer que todos trabalhassem 24 horas por dia. Já pensou? Eu, hein!

Outra coisa esquisita é dizer que o outro não sabe votar. A classe média, por exemplo, se comporta como dona da verdade, meio moralista, e diz que votar bem é digitar na urna eletrônica os números dos candidatos dela. Claro!

Votar bem é muito relativo, porque cada eleitor faz da urna caixa eletrônico de banco: vota de acordo com seus interesses. Esse negócio de dizer que o bom cidadão vota com o coração, a favor do município e da pátria é conversa para boi dormir. Se a ética do político é se manter no poder, a do cidadão é sobreviver. A política é a arte de dissimular, dizer que está defendendo os interesses coletivos, quando, na verdade, sobressaem os interesses pessoais e grupais. O candidato é bom porque prometeu algum cargo para familiares, o sujeito vira santo.

Os candidatos, neste julho, estão grávidos de esperança, mas em outubro, eles poderão estar grávidos de dívidas. E a palavra de ordem ser um queixume:

- Fui traído!

*Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras. Atualmente é secretário da Cultura de Araçatuba.

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