AGENDA CULTURAL

29.9.10

Conservatória

Excursionistas de Araçatuba
Defronte à Pousada Chácara Imperial


Hélio Consolaro*

Uma cidade fluminense, 4.500 habitantes, distrito de Valença. Tão romântica que nem quiseram ter prefeito e vereadores. Seus moradores vivem cantando. De segunda a quarta-feira, se preparam para receber os visitantes de quinta a domingo.

Conservatória lembra conservatório, no sentido de escola onde se ensina música. Por se tratar de uma cidade que é chamada de Capital da Seresta, evoluindo para ser a Capital da Música, a associação entre as duas palavras é natural, mas, na verdade, nada têm de comum entre si quanto ao significado.

A palavra conservatória faz parte, ainda hoje, do vocabulário corrente de Portugal. Equivale ao cartório de registros. A cidade surgiu com a organização de um aldeamento indígena naquela região fluminense no século 19.

Cada casa da cidade tem o nome de música, assim os seresteiros param em cada casa e cantam aquela que está na placa. Há música para todos os prédios. Pra lá e pra cá, grupos de seresta cantam: nas ruas, nos barzinhos, nas calçadas.
As noites em Conservatória

Não há inscrição, nem burocracia para um músico tocar em Conservatória. Ele vai chegando, pede licença com seu instrumento, senta-se e entra no ritmo. Até nos restaurantes chiques o palco é aberto. A cigarra faz sua cantoria com total liberdade.

Os lugares são simples, não há luxo. Conservatória adotou para si o título de uma música de Waldir Azevedo: Pedacinhos do céu. Conservatória, pedacinho do céu.

Visitamos a Fazenda da Taquara, na Barra do Piraí, cuja atração era o cicerone. O jovem Marcelo é tetraneto do primeiro dono da casa, cada peça tinha um sentido para ele. Guarda-roupa com vestidos, estantes com livros. E o rapaz apresentava uma visão crítica do passado, sem ser ácido.

Fomos à Casa do Poeta, um estabelecimento comercial. Moacir Sacramento, o Moa, vende poesia, vive disso. Sua esposa, Marinete, pinta quatros e escreve os textos do marido em telas. Tudo é vendido. À noite, eles dão um sarau, com ingresso cobrado. Um casal de dentista que criou os filhos, tem netos e abandonou Niterói, se refugiou em Conservatória para viver seus dias finais. Moa usa o farolete de Cristo para vasculhar a alma humana em seus poemas.
Moacir Sacramento, o Moa, declama


 Como em Conservatória não tem um grande auditório, os shows de sábado ocorrem na praça, debaixo de um circo pemanentemente instalado. Lá conheci Ronaldinnho do Cavaquinnho, herdeiro de Waldir Azevedo. Saí debaixo da lona, como os demais 500 espectadores, encantado. O cara é um homem show com seu cavaco.

Circo de Conservatória
Fui para Conservatória numa excursão do grupo Amigos da Seresta de Araçatuba para descansar, pois gosto do turismo cultural. Não sou apaixonado por tomar caipirinha em beira de praia. Enquanto descansei na Pousa Chácara Imperial, aprendi muito. Conheci o meu Brasil.

*Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras. Atualmente é secretário da Cultura de Araçatuba. E-mail: conselio@gmail.com

Um comentário:

LEONARDO LUCIO SANTESSO disse...

Muito interessante o que o Hélio escreveu sobre "Conservatória", agora fiquei apaixonado, pela sua descrição e suas palavras, acredito que me levou em pensamento espiritual até lá...e fiquei convencido que eu deveria ter ido nesta excurssão à convite de um amigo, baiano de Caculé, também muito conhecido por estas bandas, chamado Beltrão.. caboco bom de samba, carismático, poéta da musa.. enfim um cara incrivel, que deixa muita amizade e saudades por anda passa.
Um forte abraço Hélio Parabéns
Léo