AGENDA CULTURAL

5.11.11

Da vovó para os netos


Hélio Consolaro*
Capa do livro

O  livro “Diário de Vó Lina” é digno de leitura para quem gosta de suspense e mistérios.  Se fosse transformado em filme ou novela, os espectadores roeriam as unhas defronte à tela.

Emília Goulart aplicou bem a teoria básica do romance, que é segurar o leitor, fazer com que não largue a leitura de forma alguma.

Confesso que ao meio do livro, desconfiei daquela família tão bem estruturada. “Esse José Antônio não me engana” – pensei várias vezes.

Apesar de eu ser um leitor um pouco mais experiente, essa adivinhação do final não ocorre em narrativa bem construída. Mas causar surpresa ao leitor no final é apenas uma das tantas teorias existentes.

Emília Goulart empobreceu o seu livro ao misturar arte com a política. Jorge Amado só passou a fazer sucesso depois de “Gabriela, Cravo e Canela”, quando deixou de fazer catequese comunista em seus livros.

Escrever artigos esbravejantes em blogs, xingar políticos nas redes sociais, escrever cartas às colunas de leitores do jornal é uma coisa, romance é para ser lido daqui a 100 anos. Além disso, o leitor pode gostar da história e detestar as posições políticas do autor de obra tão volumosa.

Se o autor quiser passar subliminarmente uma mensagem (e não tão declaradamente como faz Emília Goulart no livro), que defenda os valores universais da humanidade, válidas em qualquer época. Ou dê literariedade à crítica política, como fazia Machado de Assis, por exemplo.

Emília se mete a falar mal de políticos de uma forma chã, empírica. No livro “Diário de Vó Lina” há a Dora, empregada da casa há décadas. A narradora lamenta a pobreza da auxiliar doméstica, da doença do marido, culpa os políticos pela miséria daquela mulher. Se Dora está assim e trabalha naquela casa há tanto tempo, quem é o culpado de sua pobreza extrema? Quem lhe pagou salários miseráveis, ou seja, a própria família da narradora.

Ainda bem que há poucos escorregões desse tipo pelo livro. Não estou defendendo os políticos, desejo preservar a sua obra da efemeridade.

Carlos Drummond de Andrade carregava certa frustração por ter escrito apenas poemas, crônicas e contos. Nunca escreveu um romance. Este croniqueiro carrega também essa amargura. E a Emília Goulart partiu para um romance, persistiu, trabalhou, pesquisou. Deixou-me certa inveja.

“O Diário de Vó Lina” é para ser lido num fim de semana, adotado em escolas, depois convidar a autora para debater o livro com os alunos. Valorizar os escritores  de Araçatuba e região é incentivar a literatura caipira, aqui do interior. O livro tem 160 páginas, papel reciclável, pelo preço de R$ 25,00, editora Somos.


*Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras e da União Brasileira de Escritores         

Um comentário:

Emília Goulart disse...

Obrigada professor, recebi a crítica como uma aula e o elogio com discernimento.