AGENDA CULTURAL

29.3.13

A carcereira da presidenta Dilma


A carta que não chegou

Revista Brasileiros

 

Dos mais diversos pontos do País, brasileiros já escreveram quase 126 mil mensagens pessoais à presidenta. Carcereira no presídio em que Dilma cumpriu pena por resistir à ditadura, Edméa Marinello também escreveu. Só que, por um acidente de percurso, a correspondência não chegou ao destino. 


Luiza Villaméa




Edméa Rafaela Davini Marinello, carcereira da presidenta Dilma nos porões da ditadura militar
A cena exibida na tevê fez faiscar os olhos de Edméa Rafaela Davini Marinello. No Palácio do Planalto, em Brasília, a presidenta Dilma Rousseff recebia atletas brasileiros. “Ela deu um abraço caloroso na moça que ganhou uma medalha de ouro”, lembra Edméa. “Chorei de emoção.” Aos 84 anos, Edméa pegou uma folha pautada e, com letra miúda, escreveu uma carta para a presidenta. Deu os parabéns pelo “dinâmico poder”, contou que reza por ela, falou da própria dificuldade de locomoção, devido à fragilidade óssea. Edméa não pediu nada. Apenas relembrou episódios ocorridos há quatro décadas, quando, “como carcereira”, ela conviveu com dezenas de prisioneiras políticas “do Amazonas ao Rio Grande do Sul”. Durante quase três anos, uma das presas sob sua guarda era Dilma Vana Rousseff.
Na carta, Edméa cita mulheres com as quais convivia de forma mais próxima na Torre das Donzelas, como era chamada a parte do Presídio Tiradentes que abrigava presas políticas na capital paulista. Entre elas estavam a atriz Maria Barreto Leite e a advogada Therezinha Zerbini, mulher do general Euryale, que resistiu ao golpe de 1964. A antiga carcereira fala também do neto Adriano, que hoje é advogado. Quando ele estava para nascer, Edméa ganhou “touquinhas, babadouros e paletós de crochê” tecidos por presas políticas. Entusiasmada com as recordações do passado, Edméa se lembra até de uma frase improvável de Dilma: “Hoje estamos aqui, mas um dia serei livre para governar esta pátria”.
Assim que terminou a missiva, Edméa pediu ao neto que a digitasse e mandasse por e-mail. “A mensagem foi bloqueada”, lamenta. Se ela tivesse postado a carta em um envelope só com o nome da presidenta, teria dado certo. Os Correios entregam no Palácio do Planalto todas as correspondências dirigidas a Dilma Rousseff, estejam elas com endereço ou não. Outra possibilidade seria enviar uma carta eletrônica por meio do canal de comunicação “Fale com a Presidenta”, do site da Presidência da República. Nesse caso, depois de preencher o formulário, o remetente recebe em sua caixa postal um pedido para confirmar a autenticidade dos dados e da mensagem.
Todas as cartas que chegam para Dilma, seja por via postal ou eletrônica, são lidas e catalogadas. Desde a posse, a presidenta já recebeu 125.853 mensagens. Do total, 98% foram respondidas. À frente da Diretoria de Documentação Histórica do Gabinete Pessoal da Presidenta da República, o historiador Claudio Soares Rocha coordena com rigor científico o trabalho de uma equipe de 41 profissionais que se espalha por 350 m2 no subsolo do Palácio do Planalto.
Não se vê pilhas de papel em nenhuma mesa da diretoria. Enquanto parte da equipe lê e cataloga as cartas, outra prepara respostas, que são conferidas por um terceiro grupo antes da postagem. Uma consulta ao Sistema de Informação do Acervo Presidencial revela as cinco primeiras intenções do brasileiro ao escrever para a presidenta: criticar, sugerir, pedir, apoiar e cumprimentar. Quando se discrimina o gênero do autor da carta há diferença, como destaca Rocha: “A mulher é mais crítica. E pede mais. Só depois sugere. O homem sugere antes de criticar. Depois, pede”.

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