AGENDA CULTURAL

12.10.15

Morei em Betânia


O melhor amigo é aquele que nos faz sentir melhor do que somos. Rui Barbosa

Hélio Consolaro

Converse com o autor do livro: luiscarlosluciano@hotmail.com

  Amigos, arrumar é fácil, basta tr um coração aberto e um sorriso nos lábios. 

Assim classifico a amizade com o engenheiro Luiz Carlos Ribeiro (araçatubense que mora em Dourados) e Luís Carlos Luciano, jornalista de Dourados, membro da Academia Douradense de Letras, que é também o meu amigo por tabela. A literatura e a cultura são os pontos que nos unem.  

Quando o Luiz Carlos, o Ribeiro, vai me visitar na Casa de Cultura Adelino Brandão de Araçatuba, conversamos tanto que até me esqueço de meus compromissos. Noutro dia, ele me trouxe um presente com dedicatória, o Betânia, último livro escrito por Luís Carlos Luciano. 
Luís Carlos Luciano

Folheei aquele opúsculo com certa desconfiança (10cm por 15cm - 184 páginas), um catatau, mas ficou de pé; por causa disso, já ganhou alguns centímetros de minha confiança. Só faltava código de barras.  

Li o prefácio da professora Rosana Cristina Zanelatto Santos. Animei um pouco mais. Depois disso, morei nas páginas de Betânia (em hebraico, significa lar para pobres). Saí dele só depois de vários cafezinhos, fui recompensado com a leitura.

O livro é um texto que retrata a rua onde ele mora com a esposa Lourdes Cecília, professora na Escola Bernardina, em Dourados. O livro tem um caráter autobiográfico.

Outra vantagem da leitura: conhecer a vida cotidiana de moradores de conjunto habitacional, o Quarto Plano, de Dourados. 

Resolvi reproduzir as palavras da prefaciadora, bem fieis ao que se conta nas páginas. Assim, caro leitor, ficará livre das palavras chochas deste blogueiro. 


PREFÁCIO DO LIVRO


Rosana Zanelatto
Um fusca e a Água Boa

Um fusca chega a um bairro em construção. Um casal desembarca. Década de 1980. Um enredo aparente fácil de ser seguido, conseguido e perseguido: um lugar, personagens e um tempo histórico. Não se enganem, não é fácil. A escrita exige do poeta, ao mesmo tempo, a inserção e a distância da realidade empírica: a inserção para a (re)apropriação dos elementos constitutivos da estrutura narrativa e a distância para tornar o de sempre aquilo que não é o mesmo, porém que funciona como representação.

Em Betânia, Luís Carlos Luciano seleciona um tempo de transição do ponto de vista histórico na vida deste Brasil: os anos 1980, com seus restos de ditadura e nesgas de luz rumo a um Estado democrático. Assim, uma visão política - entenda-se aqui como política uma categoria que une os cidadãos em torno de objetivos comuns, excluindo-se disso a classe política, o que é outra conversa - perpassa toda a narrativa começar do começo (a redundância é proposital). Lúcio e Laura, dois jovens "latino-americanos sem dinheiro no banco" e afeitos a uma cultura de dissimulação do protesto, como a letra de Belchior, chagam em seu fusca - para os mais novos, é o new beatle de hoje - herança da eficácia técnica do totalitarismo nazi-alemão, a um bairro com casas financiadas pelo extinto BNH (Banco Nacional da Habitação), um projeto do governo militar para fazer brilhar os olhos de milhões de brasileiros o oásis da casa própria (bem, não se pode negar que, em pare, o oásis deixou de ser miragem).

Nessa toada, o leitor acompanha o casal em meio ao cotidiano de uma cidade-vermelha (aqui vale lembrar a terra vermelha das terras da região de Dourados), próxima à fronteira com o Paraguai, carregando alguns dos preconceitos oriundos da Guerra dos idos de 1870, tão presente na memória do povo e na narrativa de Luís Carlos. Os crimes se sucedem; os habitantes locais são desconfiados; os nós são (des)feitos lentamente e nesse transcurso tudo pode acontecer. E o amor enre Lúcio e Laura segue, (a)madurecendo, colhido a cada dia, a cada hora, sem apodrecer, apesar das ameaças.

A Água Boa alimenta a narrativa e o amor. A Água Boa corre, pelas páginas, mantendo presa a atenção do leitor que só quer a fruição, mas também daquele que busca mais do que um texto escorreito, com uma história a ser entendida. Há uma pegada literária a que não ofusca leitores, suprindo e aumentando sua sede de conhecer o mais difícil dos saberes: o saber ser humano.


ROSANA CRISTINA ZANELATTO SANTOS
Docente de Literaturas de Línguas Portuguesa da UFMS/ CNPq (em tempo: já morou em Dourados) 


Um comentário:

PEC do Diploma - Aprove Já! disse...

Obrigado pela leitura e as palavras de carinho e incentivo. Já deixei uma xícara de café para sua nova visita. Mesmo que ele esfrie, o que vale é a alegria do retorno. Abraços!