AGENDA CULTURAL

26.5.19

Esquentar o inverno com o calor da emoção


Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP

O frio chegou. É o tempo bom de quem tem pele oleosa, quando me sinto mais próximo dos meus ancestrais, os homens primitivos, e valorizo a minha caverna. 

Durante o inverno, ter uma casa para morar, bem vedada, impedindo a entrada do vento frio, uma cama e cobertor, agasalhos protetores, é um presente dos céus. 

Nessa estação do ano fico mais materialista, valorizo meus pertences mais próximos, mas também fico mais caridoso, doando um agasalho para quem passa frio. A vida é cheia de contradições.

Gosto do frio, não aprecio o calor, apesar de ter nascido na região quente do Oeste Paulista onde há verão de uma blusa só, por onde o diabo não conseguiu ficar, dizendo que o inferno é mais fresco.  

Se no verão engordo por causa da cerveja, no inverno, o vinho e a caipirinha trazem consigo comidas com mais sustância, como caldos, queijos, feijoada. No inverno, como muito e me visto bem.

Eu leio mais livros no inverno, saio menos para passear, frequento lugares mais fechados e entro em piscinas aquecidas. Ler no verão, só com ar condicionado ou debaixo de meu oitizeiro no meu fundo de quintal.

Parece um paradoxo. Entro no mesmo quarto, onde dormia com ar condicionado ligado nalguns dias atrás, mas agora uso edredons, cubro a cabeça. Sinto-me um ser determinado pelo meio, obedeço às circunstâncias, não sou tão protagonista como sempre me achei.

Por causa do clima temperado, imigrantes europeus e asiáticos habitaram mais as regiões brasileiras Sudeste e Sul, deixando para os afro-descendentes o Nordeste Brasileiro, que tem apenas uma estação: o verão. Para quem não gosta do frio, a melhor viagem durante o inverno sulino é visitar os nordestinos. 

É bom se lembrar de que nos primórdios da humanidade, quando pensávamos que a terra fosse plana, as regiões quentes, tórridas não conheciam as frias, gélidas.

Não posso deixar o inverno tomar conta de meu coração, se eu deixar gelar demais o sangue, a morte é certa. Aliás, o frio mata mais do que o calor. Muitas vezes, o fogo não vem apenas da lareira, ele nos queima pelo calor da emoção.  

Como gosto do frio climático, que ele venha neste inverno ao encontro da minha colheita senil.  

Um comentário:

Unknown disse...

O inverno é um abraço apertado o tempo todo.Lindo texto.Hora de contemplar o que recheia sua casa.