AGENDA CULTURAL

28.9.19

"Não fazemos merda, fazemos música", Anélis Assumpção




Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP


O Milton Nascimento, com seus 77 anos, diferente de Chico Buarque, Caetano Veloso e de Gilberto Gil, não mora à beira-mar. Está alongado num condomínio de luxo em Juiz de Fora-MG, num estado que não é banhado por mar. Afinal, é mineiro.

Milton Nascimento está curtindo a sua velhice fora do agito das grandes capitais, desconectado deste seu tempo, curtindo o passado. Há muitos velhos assim, é uma opção de vida.  

Mas há muitos velhos que transformam o saudosismo numa reação conservadora e elegem o passado como o tempo ideal. Naquela época, tudo era bom; hoje, está tudo ruim. Na verdade, a velhice traz problemas para as pessoas e elas projetam essa postura negativa a seu redor. Suas vidas se resumem numa frase: "O mundo está perdido".

Anélis Assumpção
 Como jornalista é uma raça curiosa, a Mônica Bérgamo (FSP) incomodou o nosso velhinho lá em Juiz de Fora com um repórter para uma entrevista. E deu merda!

De uma forma genérica, Milton Nascimento durante a entrevista disse que a música brasileira estava uma merda, conforme matéria da Folha de São Paulo, edição de 23/09/2019. Chutou um penico cheio.

Os conservadores disseram que Milton Nascimento não perdeu a lucidez, outros chamaram-no de "velho gagá". A melhor resposta foi a da filha do saudoso Itamar Assumpção, Anélis Assumpção no Instagram e e reproduzida pela FSP, cujo trecho está abaixo: “Não fazemos merda, fazemos música”.

"Há, neste Brasil, infinitos artistas enriquecendo a cultura com novas linguagens, escritas e tecnologia. Há uma música preta, ocupando um espaço inédito que vai de Rincon a Josyara. Você já ouviu a Josyara tocar e cantar? E Liniker? Luedji? Percebes que tem muitas compositoras abrindo uma nova reflexão linguística a partir de seus escritos? É pena uma grande imensa parte da música brasileira estar à margem, como meu velho pai".

Gagá ou lúcido, continuo gostando das músicas de Milton Nascimento, mas não precisava jogar todos os músicos na latrina. Não houve outro jeito, a Anélis teve que dizer dizer que os músicos não fazem merda, fazem música".

Na verdade, música é boa para uma plateia
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é ruim para outra. Não existe dogmaticamente música boa para todos os brasileiros. Essa é a teoria da diversidade e do pluralismo. A unanimidade é burra, escreveu Nélson Rodrigues. Como é duro às pessoas entenderem isso, inclusive ao Milton Nascimento.

Um comentário:

Hélio Consolaro disse...

Comentário de meu amigo o englenheiro Luiz Carlos Ribeiro, com consentimento dele:

Acho que estou "Gagá"
Eu entendo tanto de música quanto de turbina de avião, mas também não entendo de música dogmaticamente.
A bem da verdade, logicamente há uma produção de música "boa" no Brasil, nem poderia ser diferente, é da história, coisas "boas" e coisas "ruins". É assim em todas as atividades da humanidade. Bons e ruins "músicos", como bons e "ruins" arquitetos, médicos, comerciantes, e assim por diante. É lógico também que não haja unanimidade, nem poderia ser diferente, é da diversidade humana.
Porém, como dizia Plinio Marcos, "há sempre um porém".
Não da pra descontextualizar a "observação" de Milton Nascimento.
Em épocas, não tão distantes, o mercado fonográfico não era tão "antropofágico" como nos dias de hoje, vai daí que, por este viés, o mercado da música se tornou um "vale tudo".
Em termos quantitativos a profusão de músicas "mal elaboradas" encheu as emissoras de rádio e tv na insana disputa por audiência e representa, indiscutivelmente uma grande maioria. É difícil não concordar com isso.
Há aqui um pressuposto a se levar em consideração, na música, como em qualquer ramo das artes, este não é terreno baldio, é um terreno minimamente exigente. Um terreno que exige "vocação" pra coisa, e o que anda por aí, em maioria, passa longe disso.
Essa discussão me remete a uma das geniais afirmações de Darci Ribeiro quando da proposição da Universidade de Brasília UNB. "A UNB não vai formar Oscares, numa referência a Niemeyer, mas vai permitir que eles apareçam". Pelo mesmo viés do quantitativo o qualitativo.
Hoje o qualitativo, na música, está acachapado pelo quantitativo sem eira nem beira.