AGENDA CULTURAL

16.11.14

Somos o povo da floresta


Foto de Nélson Vieira Gomes
Araçatuba, temporal de 07/11/2014, árvore caiu sobre carro zero, ainda sem placa
Hélio Consolaro*

Lá no Acre e Amazônia, há a designação do “povo da floresta”, gente que vive e sobrevive da mata, como o seringueiro, por exemplo. Como se nós paulistas, moradores dessa terra devastada, não sejamos também de uma floresta, derrubada, destruída, esbagaçada, mas floresta.

Se não fosse isso, porque cada cidade precisa ter um percentual de árvores plantadas para garantir nossa sobrevivência? Que é esse tal de meio ambiente senão o estabelecimento de regras para que não pratiquemos nossa própria destruição! A nossa vida seria ideal caso morássemos entre árvores.

A Bíblia, por exemplo, propõe a destruição do planeta, por isso o cristianismo não se preocupa com o meio ambiente, porque essa preocupação tem caráter científico. A maioria dos cristãos ainda acredita no criacionismo (Adão e Eva, éden) de forma literal, nada de sentido figurado. O fim do mundo é relatada como castigo de Deus, desligado totalmente da natureza. Para o religioso fanático, não existe natureza, existe apenas Deus.

E esse Deus Criador determinou ao casal Adão e Eva que dominasse o mundo, criando o ser o humano como destruidor do planeta. Não era para ele inserir no mundo, porque a natureza era o diabo, a serpente, a maçã, o pecado. Com essa matriz de pensamento, liquidamos o planeta.

Estou escrevendo tudo isso porque no dia 07 de novembro de 2014, a partir das 22h30, Araçatuba foi abalada por um temporal. Árvores foram quebradas, derrubadas, caíram sobre carros, muitas tiveram suas raízes jogadas para o ar. É o ciclo da floresta, quando as árvores velhas são derrubadas pelo vento para que as novas tenham espaço para crescer.

As nuvens, os ventos, os temporais, quando acontecem, desconhecem que a realidade aqui embaixo mudou, que em vez de florestas, há cidades, florestas de cimento armado.  Assim, gente perdeu o carro zero, como se a chuva fosse Saci Pererê, fazendo suas artes em nosso meio.

A Prefeitura, bombeiros, Defesa Civil e outros órgãos do poder público trabalharam a semana toda para pôr a cidade novamente em sua rotina.

A cidade de São Paulo paga o preço da falta de chuva e de planejamento das autoridades estaduais, como se tal coisa nunca aconteceria. A Sabesp dormiu de touca. Los Angeles e outras cidades dos Estados Unidos estão ao lado de desertos, mas planejam suas ações contando com a falta de água.

Não foi a árvore que amassou o carro, caindo sobre ele, mas é o carro que estacionou em lugar errado. Aliás, a árvore era uma remanescente, filha única dentre a floresta de cimento armado. Povo da floresta, acordemos, porque as árvores foram derrubadas impiedosamente, agora estamos pagando nosso atrevimento.  

*Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP

   


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