AGENDA CULTURAL

1.10.13

Conversa no restaurante



Hélio Consolaro*

Num jantar em Veneza, um grupo de turistas brasileiros da terceira idade se reuniu para jantar, com cerveja a quatro euros, vinho da casa a doze euros por litro. Faziam parte de uma caravana sul-americana, que uma agência aglutinou, num mesmo ônibus, viajantes de vários países em Milão. Cada casal chegou vindo de um aeroporto. 

Falava-se com os italianos anfitriões como se podia, em português ou em castelhano. O guia era espanhol, no segundo dia este croniqueiro já entendia quase todas as orientações e recados. Um banho de cultura latina.

Em conversas entrecortadas, os turistas da América espanhola falavam bem do governo brasileiro, enquanto alguns brasileiros torciam o nariz, falando mal com muita raiva, espumando a boca.
- Como! – exclamou um argentino – se vocês gastam três reais s para comprar um euro e nós, sete pesos? Meu filho vai se mudar de Buenos Aires a São Paulo para ser gerente de uma multinacional... O Brasil está na frente!

Silêncio.

Mais tarde, num restaurante (jantar) em Veneza, a maioria dos brasileiros sentou-se numa mesma mesa. E pau no Lula, pau no PT, falavam coisas descabidas, eram leitores da revista Veja e receptores de spans caluniosos.

Fui mais longe que Pedro, neguei a Cristo por várias vezes. Não me identifiquei partidariamente. Até que uma delas, metida a intelectual, repetia jargões da antiga esquerda brasileira que parte dela milita hoje na direita: país pobre, subdesenvolvido e coisa e tal, , me fez a pergunta provocativa:

- Hélio, você é brasileiro?

-Sim. E como? - ela se conformou com o minha indiferença.

Este croniqueiro conversava sobre tudo, menos de política. Não sei se informaram sobre mim pela internet, mas me despedi deles sem dizer quem eu era. Não quis estragar a nossa convivência casual e momentânea com discussões políticas.
Afinal, aquele era o meu grupo de convivência: Rio de Janeiro, Curitiba, Belém, Florianópolis, Rio Sul, Santos, Araçatuba. Em terras estrangeiras, é melhor viver num grupo de compatriotas fdp do que só. 

A argumentação, além de repleta de chavões,  era contraditória. O Lula não prestava, o PT era uma cambada, mas afirmaram que ultimamente a Europa estava cheia de brasileiros, os europeus estavam estranhando. Para eles, tudo isso não foi construído por uma política econômica para aumentar o poder aquisitivo do brasileiro, não só dos descamisados, mas também da classe média.

Outro disse que Lula,  Dilma e o PT não sabem administrar, mas disseram que as estradas brasileiras melhoraram significativamente nos últimos dez anos. Como se as obras fossem feitas por extraterrestres, não eram frutos de bons encaminhamentos da administração pública.

Um terceiro declarou voto para Aécio Neves (PSDB), mas criticou sobremaneira o estado de conservação das estradas de Minas Gerais. Como se tudo não passasse de mera coincidência. 

Essas argumentações pouco inteligentes assolam os ambientes de gente fina deste Brasil. Este croniqueiro não está pedindo que mudem o voto, mas que, pelo menos, argumentem bem, não cometam incoerências como em péssimas dissertações de vestibulandos. Afinal, todos tinham nível universitário.

*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Secretário de Cultura de Araçatuba-SP

  

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