Hélio
Consolaro*
Num jantar
em Veneza, um grupo de turistas brasileiros da terceira idade se reuniu para
jantar, com cerveja a quatro euros, vinho da casa a doze euros por litro.
Faziam parte de uma caravana sul-americana, que uma agência aglutinou, num
mesmo ônibus, viajantes de vários países em Milão. Cada casal chegou vindo de
um aeroporto.
Falava-se
com os italianos anfitriões como se podia, em português ou em castelhano. O
guia era espanhol, no segundo dia este croniqueiro já entendia quase todas as orientações
e recados. Um banho de cultura latina.
Em conversas
entrecortadas, os turistas da América espanhola falavam bem do governo brasileiro,
enquanto alguns brasileiros torciam o nariz, falando mal com muita raiva,
espumando a boca.
- Como! –
exclamou um argentino – se vocês gastam três reais s para comprar um euro e
nós, sete pesos? Meu filho vai se mudar de Buenos Aires a São Paulo para ser
gerente de uma multinacional... O Brasil está na frente!
Silêncio.
Mais tarde, num
restaurante (jantar) em Veneza, a maioria dos brasileiros sentou-se numa mesma
mesa. E pau no Lula, pau no PT, falavam coisas descabidas, eram leitores da
revista Veja e receptores de spans caluniosos.
Fui mais
longe que Pedro, neguei a Cristo por várias vezes. Não me identifiquei partidariamente.
Até que uma delas, metida a intelectual, repetia jargões da antiga esquerda
brasileira que parte dela milita hoje na direita: país pobre, subdesenvolvido e
coisa e tal, , me fez a pergunta provocativa:
- Hélio,
você é brasileiro?
-Sim. E como?
- ela se conformou com o minha indiferença.
Este
croniqueiro conversava sobre tudo, menos de política. Não sei se informaram
sobre mim pela internet, mas me despedi deles sem dizer quem eu era. Não quis
estragar a nossa convivência casual e momentânea com discussões políticas.
Afinal, aquele
era o meu grupo de convivência: Rio de Janeiro, Curitiba, Belém, Florianópolis,
Rio Sul, Santos, Araçatuba. Em terras estrangeiras, é melhor viver num grupo de
compatriotas fdp do que só.
A
argumentação, além de repleta de chavões,
era contraditória. O Lula não prestava, o PT era uma cambada, mas
afirmaram que ultimamente a Europa estava cheia de brasileiros, os europeus
estavam estranhando. Para eles, tudo isso não foi construído por uma política
econômica para aumentar o poder aquisitivo do brasileiro, não só dos
descamisados, mas também da classe média.
Outro disse
que Lula, Dilma e o PT não sabem
administrar, mas disseram que as estradas brasileiras melhoraram
significativamente nos últimos dez anos. Como se as obras fossem feitas por
extraterrestres, não eram frutos de bons encaminhamentos da administração
pública.
Um terceiro
declarou voto para Aécio Neves (PSDB), mas criticou sobremaneira o estado de
conservação das estradas de Minas Gerais. Como se tudo não passasse de mera
coincidência.
Essas
argumentações pouco inteligentes assolam os ambientes de gente fina deste
Brasil. Este croniqueiro não está pedindo que mudem o voto, mas que, pelo
menos, argumentem bem, não cometam incoerências como em péssimas dissertações
de vestibulandos. Afinal, todos tinham nível universitário.
*Hélio
Consolaro é professor, jornalista e escritor. Secretário de Cultura de
Araçatuba-SP
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