AGENDA CULTURAL

10.6.16

Aproveitando a água da chuva que cai no telhado

Reportagem publicada na revista Rotary Brasil, março de 2016, ano 91, no. 1125 





Projeto de utilização da água pluvial nas escolas de Gramado reduz consumo e incentiva sustentabilidade entre alunos
A água da chuva que escorria telhado abaixo tem um novo destino nas escolas da rede municipal de Gramado, no Rio Grande do Sul. Escoando por calhas para dentro de cisternas e canos, agora ela é utilizada para irrigação de jardins, hortas, higienização em descargas sanitárias e limpeza de salas de aula e corredores. O projeto foi lançado pelo Rotary Club de Gramado (distrito 4670) durante as comemorações dos seus 50 anos, em 2009, e já está em pleno funcionamento em seis escolas – metade da meta planejada pelo clube até a conclusão da iniciativa, marcada para 2019.
Além de aproveitar a água que seria desperdiçada pelo ralo, o projeto incentiva a sustentabilidade e o cuidado com esse líquido indispensável à vida. “Não é só a diminuição do consumo e do valor da conta de água”, enfatiza o rotariano Ary Werlang. “O principal benefício é a formação de uma nova consciência entre as crianças. É criar uma mentalidade para a preservação do meio ambiente.”
Lição de sustentabilidade
Sistema reduz consumo de água potável em 40% e amplia consciência ambiental dos alunos
No momento, os rotarianos de Gramado trabalham na implantação do projeto em mais três escolas. A lógica do sistema de captação é bastante simples: são instaladas calhas nos telhados que levam a água da chuva até uma cisterna de armazenamento, de onde ela é distribuída por uma rede específica de torneiras e canos, para não se misturar à água potável (confira a ilustração das páginas 38 e 39).
“O sistema reduz o consumo de água em 40%. Na Escola Municipal Henrique Bertoluci Sobrinho, primeira a ser contemplada, a conta de água baixou de 400 reais para 170 reais”, explica o rotariano José Almiro Barros.
Os custos de instalação são divididos entre o Rotary e a Prefeitura de Gramado. Além da mão de obra, a administração municipal arca com as calhas, material elétrico e hidráulico, e rede de distribuição. Já o Rotary Club é responsável pelo projeto arquitetônico, pelas taxas, cisterna, caixa d’água para distribuição, bombas e boias.

EM SALA DE AULA E ALÉM
O uso da água da chuva nas escolas de Gramado possibilita lições aos alunos em diferentes áreas de estudo. “Além da questão ambiental, é possível usar o projeto em disciplinas como a matemática. Os alunos podem, por exemplo, calcular a economia que o sistema possibilita. Não é só trocar água potável por não potável para fazer a limpeza da escola, o projeto é muito amplo”, destaca Ary Werlang. “Em média, cada escola tem 300 alunos matriculados. Eles levam tudo aquilo que aprendem com o projeto para casa”, diz José Almiro Barros.
Diretora da Escola Henrique Bertoluci Sobrinho, Ticiana Haas concorda: a contribuição do projeto ultrapassa os portões da escola. “Notamos que os alunos atuam como fiscais uns dos outros para o consumo consciente. É possível trabalhar a consciência ecológica desde a base. Entre os alunos menores, especialmente, as lições são ensinadas e compreendidas com mais facilidade”, ela afirma.
Além do consumo racional, o projeto contribui para outras ações ambientais desenvolvidas na escola. Em tempos de epidemia de dengue e outras doenças, a diretora frisa que a iniciativa também estimula os alunos a atuarem no combate ao mosquito Aedes aegypti. “Os cuidados com o uso da água em geral evoluíram. Todos estão mais conscientes e preocupados”, observa a diretora.
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Exemplo para toda a cidade
Projeto do Rotary serviu de modelo para criação de decreto
Parceria bem-sucedida: Ticiana Haas, diretora da Escola Henrique Bertoluci Sobrinho, recebe os rotarianos Ary Werlang, Melânia Fetzner e José Almiro Barros
A iniciativa do Rotary Club de Gramado desperta mais do que a consciência para a sustentabilidade entre os estudantes: ela foi o pontapé inicial para mudar o senso coletivo de toda uma cidade. Com base no projeto, a Prefeitura de Gramado criou um decreto tornando obrigatória a captação de água da chuva em todas as novas construções de grande porte da cidade. Estão contemplados hotéis e pousadas, além de projetos plurifamiliares, comerciais e industriais. O decreto foi incorporado ao Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Rural em dezembro de 2015.
O texto não obriga as obras existentes a instalar cisternas, mas a ideia de sustentabilidade tem conquistado adeptos. “Hoje, existem empresas especializadas na fabricação de equipamentos para coleta de água pluvial. Está cada vez mais fácil executar o sistema. O índice pluviométrico de Gramado é bastante elevado e contribui para a captação. Um número cada vez maior de pessoas está aderindo ao método”, conta José Almiro Barros.
A parceria do Rotary com a prefeitura só tem gerado bons frutos. Para a secretária de Educação, Julita Andreis, o caráter educativo para a preservação da natureza é o principal ganho do projeto. “Sabemos que a água é um recurso finito e que precisamos evitar seu consumo excessivo. O uso das cisternas nas escolas tem caráter pedagógico, desde a educação infantil até o ensino médio. Os alunos observam o funcionamento do sistema e aprendem como uma ideia simples pode ser fundamental para o futuro do planeta”, resume.
Ideia multiplicada
Julita diz que os alunos atuam como multiplicadores da ideia de sustentabilidade: “Em cada escola, temos uma comunidade envolvida. Além dos alunos, temos todas as famílias. São grandes grupos de pessoas com pensamentos diferentes que devem ser inseridos no contexto para compartilhar a ideia. Trazendo a comunidade para dentro da escola o projeto pode gerar resultados muito positivos.”
Ela acredita que a iniciativa pode servir de modelo de boas práticas pedagógicas e de gestão de recursos econômicos. “O compartilhamento de ideias tem surtido efeito positivo na sociedade. Bons projetos podem ser copiados e valorizados. Os exemplos são passados de município para município.”
Além de todos esses estímulos, os associados ao Rotary Club de Gramado têm um motivo especial para seguir com o projeto até sua conclusão, daqui a três anos: prestar um tributo à memória de Eleonore Böse Cunha. Presidente do clube no ano em que a ideia foi concebida, ela faleceu subitamente durante uma viagem turística pela Croácia em setembro do ano passado. “Eleonore criou o projeto. Queria uma iniciativa sustentável nas escolas”, relembra José Almiro Barros. “Tocaremos tudo isso até o final também como forma de homenageá-la.”

* Texto: Halder Ramos ** Fotos: Dinarci Borges *** Produção: Luiz Renato D. Coutinho e Nuno Virgílio Neto

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