AGENDA CULTURAL

7.11.18

Engasgar-se com obstáculos

*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP

Há muita gente que não pode ver uma pedra no meio do caminho que dá meia-volta e desiste. Se há um comportamento que meus pais ensinaram para seus filhos é não amarelar. Essa persistência, às vezes, nos faz até mal.

Certa vez, numa assembleia cultural, meu amigo Tito Damazo, que me conhece há muito, tentando elogiar minha atuação como secretário municipal de Cultura de Araçatuba, ele declarou em seu discurso:

- Este secretário é um teimoso, não desiste nunca!

A frase do amigo foi uma medalha de ouro. Se aquilo ainda é meu objetivo, vou mudando as argumentações, fazendo maquinações diferentes, até chegar no ponto desejado. Se desacredito, vejo que não é possível, largo logo. Preciso sentir o que dá para ser mudado, sem bancar um Dom Quixote. 
  
Voltando ao verbo. Engasgar é um procedimento chato, desconfortável. E a velhice nos traz o engasgo com mais facilidade. Músculos flácidos, membranas distendidas. A gente se engasga com a própria saliva. A idade avançada nos tira a força.

Não estou falando literalmente do engasgo, obstrução da garganta. Estou me referindo do engasgar ao falar, ou mesmo gaguejar. Aquela timidez diante de situações novas. 

A minha posição de vida era enfrentar as dificuldades em vez de fugir delas. Eu tremia ao falar em público, ao se expressar num grupo. Alguns colegas tomavam uma cachacinha para expor um trabalho em sala de aula, dar avisos aos colegas em nome do diretório acadêmico. 

Não falo bem até hoje, mas solto minhas besteiras com tranquilidade. Sem nunca usar a muleta da bebida como facilitadora. Ninguém é menos e nem mais do que eu, enfrento os meus desafetos em pé de igualdade, sem apelar para a violência. A indiferença é a melhor arma. 

Ou então ter o outro atravessado na garganta como se fosse uma espinha de peixe. Alguns têm o outro como inimigo em qualquer situação, como se fosse um princípio de vida. Atualmente, depois de sete décadas de vida, o outro não é mais um estranho para mim.

Quando estamos engasgando numa situação, o melhor negócio é mudar a estratégia de enfrentar o problema para ultrapassar os obstáculos, sem eliminar o inimigo. Nesse quesito, sou menos Maquiavel e mais Confúcio.  

O cronista é um egocêntrico, só fala de si. É isso mesmo. Ele se expõe como exemplo de vida: positivo ou negativo. Como somos todos bem parecidos, da mesma espécie, o que serve para um aplica-se para todos. É a mimese de Aristóteles. 

Aprender com exemplos alheios encurta caminhos. A gente deixa de se engasgar com obstáculos tão pequenos. Assim, não ficaremos falando a vida inteira que tem uma pedra no meio do caminho.  

Um comentário:

Emilia Goulart disse...

Na hora,vou chutar a pedra, sei que vai doer.