AGENDA CULTURAL

4.1.12

A quietude da velhice


Hélio Consolaro*



"Tá tudo aceso em mim/ Tá tudo assim tão claro/ Tá tudo brilhando em mim/ [...]Tudo ligado.../ [...]Tudo plugado" Adriana Calcanhato

Não seja cruel com os velhos, caro leitor. Você pode estar em fase de crescimento, mas na hora em que ficar adulto (30 anos, por exemplo), já começa a administrar perdas.

O jovem bonito (ou a jovem) tem a velhice como carrasco, porque perde muito. Já encontrei minhas musas da juventude exageradamente envelhecidas. Outras, feiosas, estão mais bonitas como velhas.

Ser um velho alegre é saber administrar as perdas. Perde cabelo, a visão fica fraca e se ganham óculos, já não se ouve bem, fica-se lerdo. Os dentes vão sumindo, aparecem muitas próteses. Boca de velho é a riqueza do dentista. Come-se pouco, mas a conta da farmácia cresce assustadoramente.

No final da trajetória, o acidente começa a ter perda total. Só funerária dá jeito. Aí começam as queixas, as lamentações: no meu tempo, hoje em dia. Aquela falta de adaptação aos novos tempos. Ninguém merece ter em casa um velho de alma muito mais envelhecida, que só fala do passado.  Como escreveu Michel de Montaigne (a cada dia admiro mais esse filósofo cronista), não podemos deixar a velhice nos fazer rugas no espírito.


Como não há escape, pois todos querem viver muito, mas ninguém pretende envelhecer, que passemos pela velhice com dignidade. O idoso é um carro velho com motor novo. A alma quer fazer tudo, mas a carroceria já não corresponde.

Seu avós, caro leitor, possuem uma quietude natural da velhice, pois a energia corporal vai sumindo, mas eles são fogos disfarçados, brasas sob cinzas. Não estou falando sobre sexo, mas isso também. Dê-lhes atenção, às vezes, o jeito de viver do entorno é que os deixa assim, meio abatidos.  

Ao ouvir “Âmbar”, de Adriana Calcanhoto, interpretada por Maria Bethânia, fiquei a pensar em mim. Não que eu esteja apaixonado, porque, como diz o amigo Heitor Gomes, velho apaixonado é uma anarquia. Dá um trabalho infernal.

Aliás, quem detesta velho apaixonado é o INSS. O sujeito está na lista negra, menos um na folha de pagamento, aí se apaixona por uma moça, faz um filho com muita dificuldade (com a ajuda do Viagra). Pronto! O benefício precisa ser pago por mais 18 anos ao rebento. Prejuízo para a previdência, mais um avô sendo chamado de pai.

Cuidado, amigo. Há gente de olho em sua magra aposentadoria... Há Maria-chuteira, Maria-gasolina... Agora surgiu uma nova categoria de oportunistas, Maria-fraldão!  Sabemos que não dá mais para usar camisinha, pois o Bráulio pensa que é toca e dorme, mas a pílula anticoncepcinal... Sabe de uma coisa, que se dane o governo, e viva Epicuro!

Fazer humor com a própria desgraça é sinal de inteligência, mas paremos por aqui, porque a coisa é séria.

Concordo com o Sêneca, filósofo do Império Romano: “Quando a velhice chegar, aceita-a, ama-a. Ela é abundante em prazeres se souberes amá-la. Os anos que vão gradualmente declinando estão entre os mais doces da vida de um homem, mesmo quando tenhas alcançado o limite extremo dos anos, estes ainda reservam prazeres.”   

Então, caro leitor, trate bem seus velhinhos, mesmo que sejam pobres. Velho rico é um encanto! Não sei por que, estou filosofando muito. Será a idade?

*Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Atualmente é secretário municipal de Cultura de Araçatuba. 

Um comentário:

Unknown disse...

kkkkkkkkkkkkkkk Adorável! Dei boas risadas aqui na calada da minha manhã! Impagável!"Maria Fraldão"kkkkkkkkk
Não, caro Secretário, não é a idade não. Pior: é o amor mesmo. Ele não escolhe idade, nem marca kilometragem. kkkkkkkkkkkkkkkkkk