AGENDA CULTURAL

24.12.15

A vida não era uma festa


Fim de ano é tempo de releituras, de repensar, de refletir 

Hélio Consolaro*

Já passei por 67 natais e anos-novos, mas nenhum foi igual ao outro, passei por alguns sem dar conta deles, por vários esperando o presente e por outros distribuindo-os. Parece uma obviedade escrever sobre isso, porque com você certamente não foi diferente, mas refletir e tirar lições nunca será inútil.

Na minha infância, não havia esse consumismo do presente, nem as condições financeiras da minha família permitia isso. Apenas me lembro que Natal e Ano-Novo eram momentos de tomar guaraná e dos homens ficarem bêbados, mas antes ia-se à igreja.

A vida não era uma festa como é hoje, que a qualquer momento se toma um refrigerante e bebe-se uma cerveja. O Papai Noel ainda não havia substituído o Menino Jesus, nem a Árvore de Natal desbancara o presépio.  Para se tirar uma fotografia, precisava ir  ao estúdio do fotógrafo. 

Não estou julgando, caro leitor, se agora é melhor ou pior. Naquela época éramos muito pobres, não mais pobres ainda porque éramos brancos. A minha cor facilitou a vencer a pobreza familiar.

Somos italianos que saíram da Itália em busca de comida no Brasil, melhoraram um pouquinho, compraram um sítio, mas deixaram os descendentes voltar à estaca zero. Então, não tenho saudades da infância, porque ela foi dura demais, embora a meninice seja esperta, dribla as barreiras.

Durante a minha vida juvenil, as festas de fim de ano também não foram boas, porque todos festejavam, pois a Coca-Cola já havia chegado, isso significa que a sociedade brasileira estava se americanizando,  e nós sem esse costume e sem dinheiro. O namoro ia até quando a garota dizia que queria visitar a minha casa. Festa de aniversário, imagine!


Casei-me, criei os filhos. A Helena tinha em sua vida os novos costumes de classe média brasileira. Dois professores juntos, a renda era até boa. Assim, adentrei o portal da classe média, porque o objetivo da família era vencer na vida pelos estudos. Então, sem receber presentes na infância e na juventude, passei a presentear meus filhos. Para mim, não era a repetição de uma grande emoção, mas uma obrigação social. A repetição do ato se dá com os netos.

Não vou pedir-lhe, caro leitor, que pense no Menino Jesus, o aniversariante do Dia de Natal, não estou fazendo catequese com este texto, mas que pense em você mesmo, como estou fazendo agora. Faça uma lista, como pede Oswaldo Montenegro em sua música, veja quem você perdeu e quem você ganhou nos últimos dez anos. Você melhorou? É mais gente? Venturoso 2016.


*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP  

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