AGENDA CULTURAL

10.11.16

Queimando o tempo


Hélio Consolaro*

Numa tarde de quinta-feira, queimei documentos. Nada de pensamentos escabrosos, não faço parte da comissão de transição de 2016 entre governos na Prefeitura de Araçatuba.

Hoje, a moda é moer documentos em vez de queimá-los, e certamente muitos serão moídos em todas as prefeituras brasileiras até 31 de dezembro de 2016. Jogar no lixo documentos assinados, inválidos, mas assinados e carimbados, não é recomendável. 

Na organização de meu cesto arquivo da minha casa, aquilo que fica amontoado, às vezes, em pastas com elásticos nas prateleiras da despensa, o jeito de antigamente arquivar as coisas, achei muitos holerites de meu tempo de professor, declarações de Imposto de Renda. Pensei em jogar na lixeira, inteiros, mas como não tenho moedeira de papéis, resolvi queimá-los. Já pensou todos virem a miséria que o Consa já ganhou na vida?

Vi o holerite de cada mês trabalhado sendo  devorado pelas labaredas, acontecendo o mesmo com extratos bancários. Antes foi o sonho de ser professor, depois a realização, agora tudo se transformou em cinzas.

Mas ainda não me desapeguei de minhas ferramentas de trabalho: os gabaritos de provas mimeografadas, estudos de livros com anotações, desde o tempo em que lecionava no ensino fundamental, EE Prof. Genésio de Assis. A maioria do ensino médio está em meu arquivo digital, mas assim mesmo foi preservada.

Comportamento semelhante ao de de meu pai carpinteiro. Aposentado, mas ninguém podia triscar em seu enxó, martelo, serrote, formão, morsa, bigorna, etc. 

Até as bolsas de lonas em que eu levava o material para as escolas estavam guardadas e nelas protegi as ferramentas: Objetivo, Unicolégio, Salesiano, Integrado, Toledo, Coeb, Associação de Ensino Guararapes, Integrado, escola de Valparaíso, etc 

Estou aposentado, consegui envelhecer, tive saúde e vontade de viver. Paralelamente, a atividade jornalística ou política. Sempre trabalhando nos três períodos. 

Agora, estou numa vagabundagem que dá medo. Até me disseram que eu não ia suportar tanto ócio, mas estou levando, apesar do curto período. Já não ouço a campainha escolar. Nem há despertador. A menos que alguém venha ao socorro deste workaholic. Não sei não. Ninguém gosta de velho exigente. Tomara que não.

*Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras.



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