AGENDA CULTURAL

10.5.17

A virada não virou


  Em 2007, ainda como Diretor de Cultura de Araçatuba, contribui para que a Virada Cultural Paulista fosse inserida no calendário cultural de nosso município. Com muito esforço – já que o orçamento da Secretaria da Cultura naquela época não chegava à casa do milhão, conseguimos inserir o projeto na cidade e alavancar atividades culturais pelos vários cantos da urbe de forma gratuita e com qualidade. Depois de nós, as outras duas administrações deram continuidade ao projeto, como já havia acontecido com o Guri, o Tá no bairro! (que virou Culturaça), entre outros.

Este ano tivemos a triste notícia de que a Virada Cultural Paulista não acontecerá em Araçatuba. Triste. Triste porque era um dos poucos projetos de qualidade em que atrações tanto da cidade quanto do cenário nacional eram oferecidas ao público de forma gratuita e para as diversas camadas sociais. Era muito gratificante ver crianças, jovens, adultos e idosos reunidos para prestigiarem as muitas apresentações de música, teatro, dança, arte de rua, literatura, cinema etc. Uma movimentação cultural que não se restringia ao público cultural araçatubense, mas de toda região, e que fazia circular a economia sob vários aspectos. Triste o seu fim.

Triste por diversas razões, entre as quais porque o valor de contrapartida da prefeitura, comparado ao da Secretaria de Estado da Cultura, não é nada vultoso. Triste porque a penalizada é a população mais carente, já que o público-alvo do projeto é ela; quem tem dinheiro vai a quantos shows quiser, onde quiser e quando quiser; não precisa do Estado para mediar ou favorecer o acesso aos bens culturais. Triste porque a Virada é só mais um dos projetos tirados da cidade, lembremo-nos do Carnaval Popular, das Oficinas Culturais e de outros que estão sendo retalhados, como a extinção da publicação física dos contos vencedores no Concurso Nacional de Contos “Cidade de Araçatuba”.

Não sou de ficar me intrometendo em “gestões alheias” (como se a gestão pública não interessasse e dissesse respeito a qualquer cidadão), mas há coisas que a gente não pode ficar somente vendo e “deixando pra lá”. O que me surpreende também é que muitos dos que criticavam ações muito menores que esta (cancelar ou extinguir projetos culturais importantes e sedimentados no município), hoje batem palmas pra ela, defendem sua extinção ou ficam calados, mudos, como se nada tivesse acontecendo.

Não sou de Araçatuba, mas vivo nela há mais de trinta anos; já até sou, por força de lei, cidadão araçatubense. Vejo essas coisas acontecerem e fico profundamente triste. Milito e atuo na área cultural tanto voluntária quanto profissionalmente (sou professor de arte, escritor e arquiteto) e, quando vejo esse tipo de coisa acontecendo, bate uma tristeza forte, sabe? Parece que a gente dá um passo para frente e dois para trás em relação às políticas públicas ligadas à cultura e às artes como um todo em nossa cidade.

Tristeza em ver que a Virada Cultural não virou este ano.


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*Antonio Luceni é mestre em Letras – Estudos Literários pela UFMS. Membro da Academia Araçatubense de Letras – AAL e da União Brasileira de Escritores – UBE. Artista visual, com graduação em Artes Visuais e pós-graduando em Artes Visuais, Intermeios e Educação pela Unicamp. Arquiteto-urbanista, com especialização em Arquitetura e Cidade, foi Diretor Municipal de Cultura de Araçatuba entre os anos 2005 e 2008. É professor de Artes, por meio de concurso público, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo – IFSP.

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