AGENDA CULTURAL

26.12.15

Por que você é rico?

Hélio Consolaro*

Lendo a entrevista do psicanalista e professor da Universidade de São Paulo (USP) Christian Dunker, no portal da revista Fórum, uma de suas respostas me levou a pensar nos ricos de Araçatuba. 

Antigamente, a pessoa ficava rica, ninguém questionava a origem de sua riqueza, se era lícita ou ilícita. De repente, ia passear na Europa, frequentava altas rodas. Quando muito saíam algumas conversinhas a respeito na roda de amigos. Se ostentava riqueza, bastava isso para legitimar o seu papel na sociedade. Não havia Imposto de Renda, cruzamento de fontes de renda pela informática,  Polícia Federal e nem Ministério Público metendo o bedelho para saber a origem de tal ostentação.
Como araçatubense de segunda geração, capiau de quatro costados, conheço cada história da carochinha justificando porque o sujeito ficou rico de repente... Não digo os nomes nem sob tortura, porque não tenho nenhuma relação pessoal com os fatos, nem vai resolver os problemas do Brasil, não sou historiador, faziam assim porque era desse jeito em todas as cidades, era a cultura da época. 

Diz o professor entrevistado: “O mais importante é o seguinte: existe uma mutação dos símbolos que marcam uma classe. E é uma mutação boa porque, até então, o discurso senhorial vinha com um tipo de apropriação dos signos culturais de classe que faziam com que não fosse necessário contar nenhuma história a respeito. Você vai para a Europa, tem alguém contando que o barão tal, a minha família mora aqui há cem, duzentos anos, ganhou na batalha tal título… São os ricos muito, muito velhos. Os nossos ricos se contentavam em mostrar os signos. Você tem um carro, não precisa saber se comprou à prestação, se roubou, se é fruto de um negócio ilícito, não importa. Os nossos ricos não fizeram nada para diminuir a iniquidade, a diferença social, pelo contrário. Desde o modo de se vestir até onde estuda, o bairro em que mora etc, tudo era sem história, bastava mostrar. Só vale o último capítulo. O que é um problema. Se você perder tudo, nada te garante no tempo. Está sempre dependendo da demonstração da última sexta-feira.”
Christian Dunker

A situação mudou a partir da Constituição de 1988, a partir do fortalecimento da política fiscal,  do Poder Judiciário, da sociedade organizada e do surgimento do próprio PT que levantou entre nós as contradições da corrupção.

Diz o psicanalista e professor da Universidade de São Paulo (USP) Christian Dunker que a “grande mutação positiva que está acontecendo é que a gente não aceita mais isso, se tornou um ridículo social. Não o cara que ostenta, mas o que ostenta sem poder dizer como chegou ali. Esse é o lado bom da controvérsia sobre a corrupção, tem uma parte desse discurso rançoso que está dizendo uma coisa positiva, não aceitamos mais ostentação de símbolos culturais de riqueza sem uma história.”

O cidadão pode ser rico, riquíssimo, mas precisa ter uma história lógica dentro do capitalismo para aquela riqueza, não pode ser um Pablo Escobar.

Leia toda a entrevista, clicando aqui. 

*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP

Nenhum comentário: