AGENDA CULTURAL

12.1.19

Fazenda Guarita: um recorte da história de Araçatuba-SP

Capa do livro
Solicitar exemplar gratuito: lorival.fg@terra.com.br

*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP 

Registro  a existência do livro "Fazenda Guarita - 100 anos", lançado recentemente junto com a comemoração dos 110 anos de Araçatuba por dois motivos: ser um livro e um recorte importante da história regional.

O presidente da Academia Araçatubense de Letras, em reunião ordinária de dezembro de 2018, entregou a cada acadêmico um exemplar cuja presença ostenta luxo e grandeza.

Chegando em casa, retirei o protetor plástico do livro e fiquei a vê-lo em mais de horas, um passeio minucioso pelas belas fotos, inclusive as de Ângelo Cardoso.

Pelo texto da jornalista e escritora Teté Martinho, descobri a seriedade do trabalho, a objetividade da linguagem, não era laudatório, como costuma ser livros desse gênero. E assim me adentrei a leitura que me levou a uma visita à fazenda em companhia do acadêmico Hosanah Spíndola. Um araçatubense de segunda geração como eu precisava visitá-la, mesmo que seja ao completar 100 anos.

Fiz uma busca na memória digital de meu computador e descobri uma crônica sobre Dario Ferreira Guarita (clique aqui e leia), de autoria do saudoso acadêmico Jonair Nogueira Martins, meu confrade na Academia Araçatubense de Letras.

Outra curiosidade que me chamou a atenção foi a formação universitária dos proprietários, desde os primeiros, por isso têm perfis diferentes dos tradicionais fazendeiros de Araçatuba. A fazenda resistiu aos ciclos econômicos, não se descaracterizou, seguiu sua trajetória. Parece pronta para o turismo rural. Atualmente é dirigida por um conselho administrativo. 

Com a emancipação de Santo Antônio de Aracanguá, ela passou a fazer parte  do território do novo município, mas a família Guarita continua dizendo que a fazenda fica em Araçatuba.

O escritório da fazenda continua nela, nunca esteve num edifício luxuoso do centro de Araçatuba, sempre ao lado da colônia de casas dos empregados e da sede, por onde Ulisses Guimarães passava suas férias.

A Fazenda Guarita faz parte da tradição de Araçatuba, é um recorte de sua história, por isso seus 100 anos de existência são valorizados. 


Entrevista com Teté Martinho, autora do livro  "Fazenda Guarita - 100 anos" publicado em 2018.
  

Entrevista cedida a Hélio Consolaro
(janeiro de 2019)


Idade: 55 anos
Formação: história e jornalismo

Você nasceu e se criou na cidade ou na zona rural? Urbanóide ou rurícola? Faço tal pergunta por se tratar de um livro sobre fazenda.
R. Nada, nasci no Rio de Janeiro e vivi em São Paulo desde os quatro anos de idade. Mas sempre adorei o campo, o interior; sempre que podia e posso, fugia e fujo da cidade.

Então, você pesquisou muito para escrever o livro?

O amor pela natureza, que compartilho com os Guarita, certamente ajudou, no sentido de que foi um enorme prazer conhecer a fazenda e a região, pela qual eu só havia passado ­– na infância, a caminho do Mato Grosso do Sul, com meus avós, que tinham fazenda por lá, e na adolescência, no rumo de Goiás, onde ia atrás de aventuras e cachoeiras. Mais do que isso, porém, o que me ajudou nesse projeto foi ter estudado História, e tido, desde sempre, muita curiosidade de entender como chegamos aonde estamos. O interior de São Paulo sempre me impressionou por ser uma região estruturada, autocentrada, independente, com suas ferrovias e cidades enormes.

R. Onde já exerceu sua profissão?
R. Comecei no Jornal da Tarde, fui editora, correspondente e repórter especial da Folha de S. Paulo e redatora-chefe de revistas como Web!, Elle e Bravo!. Nos anos 2000, comecei a receber convites para desenvolver projetos de livros-reportagem, institucionais e comemorativos. Escrevi 5 Saraus, cada qual com sua poesia, cada qual com sua fúria (Imprensa Oficial, 2015), Guia Triângulo Histórico SP (Estação, 2013) e 80 anos da Companhia Editora Nacional/IBEP (TV1 Editorial, 2005). Também sou coautora do projeto da revista bilíngue Pororoca, sobre a Amazônia (2008-2009), e assinei a coluna Crítica de Loja na Folha de S. Paulo de 2007 a 2014.

Em tempo trabalhado, quanto gastou para pesquisar e para redigir? E em tempo de calendário?

R. Ao todo, o projeto tomou uns dois anos. Meu trabalho principal, de pesquisa e redação, consumiu cerca de dez meses. Herdei a pesquisa pronta, encomendada a um historiador, e complementei com uma visita à fazenda e a Araçatuba, entrevistas adicionais e leituras de periódicos e obras de referência sobre a região.



No final do trabalho, precisou enxugá-lo ou esticá-lo, no jogo de fotos e texto? Com certeza, muitas fotos ficaram de fora...

R. Não foi preciso esticar nem enxugar. Concordamos que o texto deveria contemplar a trajetória da família e a constituição da fazenda Guarita, mas sempre relacionadas ao contexto composto pelas histórias importantíssimas que se somam no desenvolvimento da Noroeste Paulista – a ascensão e queda do café, a construção da malha ferroviária, a imigração japonesa, o programa pró álcool, o boi gordo, a hidrovia do Tietê. Então não havia limite, só um tema a dar conta, duas grandes histórias para contar – de uma família e do desbravamento de uma região. Sobre fotos, algumas ficaram fora, mas entraram muitas! Não editei o livro, só estruturei o projeto e escrevi o texto.

Com quem da família você trabalhou mais diretamente?
Dora Levy, que fez o design do livro, Dario Guarita e Sônia Guarita.

Durante a montagem do texto, houve alguma interferência da coordenação editorial em nome da família?

R. Nesse tipo de projeto, é absolutamente natural, corriqueiro e esperado que os retratados se coloquem e que esse feedback seja levado em consideração. No caso da Guarita, a conversa foi sempre extremamente positiva e estimulante. Eles me ajudaram a mapear a história da família, apontaram temas, passagens e valores que gostariam de ver contemplados no livro, e deixaram a meu critério estabelecer e explorar relações entre a história familiar e a história do estado e do país, que nos interessava iluminar e ressaltar com o livro. Então não houve interferência, apenas trocas.

Apesar de ser um texto encomendado, que conta a saga de uma família com sua fazenda, que poderia beirar ao discurso laudatório, você manteve um certo distanciamento, objetividade para que o livro não perdesse a credibilidade. A formação acadêmica de por boa parte da família ajudou nisso?

Certamente é um privilégio trabalhar com pessoas do grau de esclarecimento dos Guarita! Eles sempre tiveram absoluta clareza de que queriam contar a história da família, mas que essa história deveria necessariamente ser relacionada à história da região e ao significado que ela adquiriu no contexto nacional, em momentos diversos do século20. Até porque essas histórias não se separam. Os Guarita sempre entenderam que havia uma oportunidade de, para além de honrar patriarcas e matriarcas, contar uma história maior. Sobre distanciamento, busquei um tom neutro, equilibrado, jornalístico.

Você enfrentaria uma nova encomenda? Esse gênero é promissor profissionalmente?

R. Valeu demais! Aprendi coisas incríveis sobre a Noroeste de São Paulo e Araçatuba, sobre ferrovias, imigrantes, índios, aventureiros. Também conheci uma região exuberante, de características muito próprias, reaprendi a cavalgar, provei da culinária de fazenda, nadei em lagos gigantes, vi tucanos, corujas e até um tamanduá-bandeira correndo por um campo de milho. Foi uma aula de história e um banho de natureza!

Enfrentaria com prazer uma nova encomenda do gênero, desde que sentisse que há algo de relevante para pesquisar e recontar, e interlocutores bacanas.

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