AGENDA CULTURAL

23.2.20

Parasita: os moradores do porão

Cena do fime Parasita

Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP

Eu estava com saudades de cinema, sala, plateia assistindo ao mesmo filme e escolhi "Parasita", após ganhar o maior número de prêmios do Oscar 2020.

O meu hábito é alugar filmes pelas plataformas, já que meu televisor é conectado à internet, smart. Na primeira semana, depois do Oscar, as sessões de Parasita eram cedo, voltei para casa, fiquei só na vontade. Eu me lembrei das sessões dos antigos cines de Araçatuba, quando lotar o primeiro horário era um fato normal.       

Estranhei o comportamento da crítica. Ninguém falava nem bem e nem mal, ignoraram o filme. Não houve aquela  badalação cheia de entusiasmo. Dizer que o filme foi premiado apenas para globalizar ainda mais o Oscar era desculpa esfarrapada. 

Quando Trump, o presidente dos Estados Unidos, condenou o filme, fiquei com mais vontade de vê-lo.  Leia o que ele disse: Aliás, o quão ruim foi a cerimonia da Academia?” começou o político. “‘E o Oscar vai para... Um filme da Coréia do Sul’. Que história é essa? Nós já temos problemas o bastante com a Coréia do Sul no comércio e agora nós os premiamos como melhor filme do ano? É bom? Eu não vi” seguiu Trump, que foi aplaudido por seus seguidores. A Neon, distribuidora, foi curta e ácida: "Compreensível, ele não sabe ler.” O filme não é falado em inglês, por isso é legendado.

Então, lá foi o Consa ao Cineflix do Shopping Praça Nova, sessão das 22h.  Eu sou persistente. O Shopping à meia-noite parece uma igreja vazia, pois o filme durou 132 minutos.

Só para comparar, o Cine Pedutti da General Glicério, onde hoje é um centro cultural de uma escola, cabiam 700 pessoas (e as sessões lotavam); uma sala do Cineflix comporta 137 pessoas. Naquela época, a TV era incipiente, havia cinco cinemas na cidade.  

O país do filme Parasita é a Coreia do Sul, lembre-se da marca Samsung, o lado capitalista das duas Coreias. O país que copiou o modelo econômico norte-americano com competência, privilegiando a educação. Se o filme fosse da Coreia do Norte, o diretor Bong Joon Ho iria receber um míssil na cabeça, como aconteceu com o general iraniano.

O filme prova que o capitalismo não consegue eliminar a pobreza, fazendo com que todos se tornem consumidores, porque apesar de todo o desenvolvimento sul coreano, a marginalização, a mendicância, a pobreza está instalada. Os pobres que moram nos porões não são negros e nem indianos, são coreanos com cara de japonês. Ricos e pobres têm a mesma cara. 


Cena do fime Parasita
A primeira parte do filme chega ao grotesco, a segunda é uma tragédia, mas em meio a tanta violência, ainda sobra um espaço para o riso. Por mais que o chefe da família Ki-Taek desse um jeitinho para sair da pobreza, a vida acaba em violência para a sua família. 

Enquanto que nas cidades brasileiras as enchentes prejudicam os moradores dos vales, das vázeas, na Coréia do Sul a gente do andar de baixo é que se enchem de água. Escolas se transformam em abrigos coletivos, etc, etc, etc. Os mesmíssimos problemas. Como dizem os economistas indianos Raghuram Rajam e Luigi Zingales, precisamos salvar o capitalismo dos capitalistas.

Apesar de todos os problemas da Coreia do Sul, eu não moraria na Coreia do Norte, porque não dá para trocar a liberdade pelo bem-estar social. Com democracia, é possível encontrar saídas para nossos problemas.

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