AGENDA CULTURAL

23.6.11

Mestre dos palcos - José Renato Pécora

José Renato (1926-2011), idealizador do Teatro de Arena, é uma das figuras mais importantes da história teatral brasileira
José Renato Pécora
REVISTA E - SESCSP
Desde que José Renato Pécora, junto com parceiros e idealizadores, fundou o Teatro de Arena, em 1954, a história cultural do país tomou novos rumos. Um teatro de caráter revolucionário, já que seus integrantes, especialmente Oduvaldo Vianna Filho (Vianinha) e Gianfrancesco Guarnieri, faziam parte da Juventude Comunista.

A primeira montagem de Eles Não Usam Black-Tie, texto de Guarnieri e direção de José Renato, em 1957, foi sucesso imediato no pequeno espaço da Rua Teodoro Baima, 94 – além de ser a primeira peça a levar a temática operária para os palcos brasileiros, o formato arena permitia maior aproximação dos atores com o público, inaugurando uma nova forma de encenação no Brasil.

“De repente o homem comum, a favela, a luta sindical, as convicções políticas de simples operários e suas paixões, anseios e dificuldades, tudo isso passava a ocupar o palco da cena brasileira. O espectador passou a se identificar com os temas e o jeito de representar que Zé Renato inventava”, relembra o ator e autor Juca de Oliveira, que ingressou no Arena em 1961 com a remontagem de Eles Não Usam Black-Tie.

Na década de 1950, o Teatro Brasileiro de Comédia (TBC) representava o que de mais moderno havia no país, com encenação de grandes dramaturgos, a exemplo de Tennessee Williams. Mas ainda estava vinculado a encenadores estrangeiros e a um teatro mais global. O surgimento do Arena foi, de fato, um marco. “O Arena ofereceu uma alternativa de espaço, um modo de trabalhar em oposição ao TBC.

Em muitos aspectos foi pioneiro. Na forma de organização, no tratamento político da dramaturgia, trazendo para o teatro brasileiro um tom épico. Para mim, mais importante foi ter trazido a cozinha da casa do pobre brasileiro para a cena. Porque até então tudo acontecia na sala de visitas da burguesia paulista”, afirma Amir Haddad, que foi integrante do Teatro Oficina, também representante de um novo movimento da cena paulistana.

As primeiras apresentações do grupo Oficina, comandadas por Zé Celso Martinez Corrêa, ocorreram no Teatro de Arena, apesar da diferença ideológica que marcava os dois grupos. “Nós do Oficina éramos muito mais ligados ao TBC, embora tivesse sido inevitável nos apresentarmos no Teatro de Arena. A postura política do Zé Celso nunca foi uma postura de militância partidária como era no Arena, com os jovens do Teatro Paulista do Estudante (TPE)”, diz Haddad. Militância que, com a Revolução de 1964, foi obrigada a arrefecer-se, principalmente com a prisão e exílio de Augusto Boal em 1971, já integrante do Arena e que dividia com Zé Renato a concepção e direção das peças.

Muitos dizem que o país tem memória curta, mas recentemente o nome de Zé Renato, tão importante para a história cultural brasileira, voltou a ser lembrado. Aos 85 anos, sua participação na peça 12 Homens e uma sentença, como personagem número 9, permitira a ele enorme sucesso – era visto como um dos mais carismáticos no palco. Com direção de Eduardo Tolentino Araújo, do TAPA, o convite para retornar à cena foi recebido com alegria e surpresa.

“Liguei e falei: ‘Zé quero te fazer uma proposta indecente: você topa fazer o papel do número 9 em 12 homens e uma sentença?’ Ele disse: ‘puxa, eu adoraria, porque sempre que piso no palco é pra substituir um ator de um espetáculo meu, não atuo há 50 e poucos anos’. E foi assim que nasceu nossa parceria”, conta Tolentino. Zé Renato cumpriu seu papel até a sessão de domingo, quando, ao sentir o coração, foi levado ao hospital. Faleceu no dia seguinte, 2 de maio de 2011.

Para Tolentino, que o acompanhou nos últimos dias de sua vida, estava realizado. “Ele morreu feliz. Foi de repente, pra gente é um susto, mas ele não sofreu. Estava saindo de um momento muito bom em que as pessoas voltaram a falar do Zé. Porque o Brasil é um país de memória muito curta. Sem dúvida a importância dele e do Teatro de Arena é fundamental pro teatro brasileiro. Mas as pessoas esquecem”, finaliza.

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