Hélio
Consolaro*
Antigamente,
quando éramos mais tribais, bárbaros, os monarcas ficavam séculos no poder por
meio de sua dinastia e para um novo grupo assumir o comando havia guerras,
revoluções. No Estado moderno, trocamos as armas por votos e criamos a
alternância de poder.
Assim,
no dia 7 de outubro deste ano, todos os soldados alistados (eleitores) vão para
o campo da batalha. Neste dia, o poder é devolvido ao povo para que ele escolha
seus futuros dirigentes. Seu voto é uma arma.
Esse
aspecto belicoso da disputa eleitoral às vezes é intencionalmente lembrado por
candidatos, como forma de jogar adrenalina no sangue de seus cabos eleitorais.
Nem sempre funciona, porque as pessoas não gostam de ser bucha de canhão.
Tudo
está aí para ser lido e interpretado, só não vê quem é cego. Aliás, o pior cego
é aquele que não quer ver nada, gosta de ser guiado. Numa democracia plena, a
campanha eleitoral intensifica a interação entre as pessoas. As pessoas
aproveitam a oportunidade para fazer a mudança de trincheira. Às vezes muda por
um detalhe.
Os
candidatos, como generais, se esfarfalham, enquanto os soldados se divertem nos
comitês eleitorais. Eleição é festa para muitos, como carnaval, Copa do Mundo.
Encontro, novas amizades, novos amores. Os olhos brilham. Ninguém fica sem
festa.
Numa
esquina, havia cabos eleitorais de dois candidatos rivais, com bandeira e tudo.
Muito equipados. Imaginavam-se caras feias, insultos, mas, pelo contrário, estavam
numa conversa animada. Homem e mulher:
-
Como está a criança, comadre? – perguntou ele.
-
Quase andando, compadre! Eta padrinho desnaturado, nem vai visitar a
afilhada...
E
a conversa foi embora, se alongou, enquanto as bandeiras tremulavam. Dessa
situação, desse retalho de conversa, tiram-se muitas conclusões. A mais simples
é que cada um estava lá para ganhar a vida, os patrões eram adversários, mas
eles não: obedeciam a ordens. Eram profissionais, numa linguagem mais crítica,
vendiam seu tempo para o primeiro candidato que os procurou. Além de receber o
seguro-desemprego ou os proventos da aposentadoria, completavam a renda como
cabos eleitorais.
A
leitura mais sociológica e pessimista é que o povo não está nem aí com eleição,
que em luta de tubarão, bagre faz o volume, a espuma das águas. Brigar para
quê? O crime não compensa.
Há
o equilíbrio, meio termo. O voto foi a forma mais pacífica que encontramos para
evitar a violência nas disputas entre nós, embora nem sempre isso ocorra, pois
o resquício tribal vem à tona com toda força em nós. Adrenalina sob controle.
*Hélio
Consolaro é professor, jornalista e escritor. Atualmente é secretário municipal
de Cultura de Araçatuba-SP
Nenhum comentário:
Postar um comentário