Hélio
Consolaro*
Duas
meninas moça andavam pela calçada, insinuavam uma olhada maliciosa, um assovio
atrevido. Trajavam bermudas jeans. Pareciam que acabavam de abandonar o ninho
da meninice, da infância, e adentravam o mundo da mulher. Havia nelas um
frescor de juventude recente. Como se a passagem de uma faixa etária para outra
fosse tão rápida, como a borboleta sai de seu casulo. De repente, não mais que
de repente, brotassem no passeio de uma rua duas novas beldades.
Não,
caro leitor, meu olhar não foi de malícia. Pus-me a cutucar o cérebro como filósofo
do cotidiano. Elas ainda estavam descobrindo o mundo. Com certeza, já deram o
primeiro beijo de língua, ensaiado com um coleguinha de turma, mas parecia que
não houvera ocorrido a primeira transa. Enganam-se aqueles que consideram o
jovem atual muito atrevido, promíscuo e inconseqüente. Eles estão aprendendo a
viver com liberdade e se preservam bem mais do que nós, os bem-maduros.
As
duas passeavam pelas ruas da cidade, estavam próximas de um supermercado.
Talvez fossem buscar alguma coisa para casa a pedido da família. O olhar de lado
transmitia certa curiosidade. Ver se alguém as observava, porque eram duas
codorninhas saídas do ninho que ganhavam o mundo e podiam ser alvejadas pelo
primeiro caçador.
Esse
cronista avô passou, chamado, às vezes de “tiozão”, lembrou-se de sua
juventude. Que nas priscas eras (Nossa! Que arcaísmo!) teria dito aos colegas:
-
Gente, carne nova no pedaço!
O
abatedor não perdoa! Está à procura de sua presa.
Na
verdade, teria tido com elas aquele papo besta:
-
Vocês são novas por aqui?
-
Vão sair hoje à noite?
Na
verdade, fora demasiadamente tímido, mas para os colegas contaria um papo enorme
de feitos e vantagens inexistentes.
Aquela
rua para elas era uma avenida larga, estavam iniciando a corrida. Apesar de
estar no carro, a avenida para mim era um beco sem saída, próximo ao ponto de
chegada. Cabelos brancos, o corpo se debilitando.
Também
descobri na hora que não podemos ser felizes comparando faixas etárias em nós
mesmos. Cada fase tem a sua beleza e precisamos explorá-la adequadamente. Tenho
saudade da juventude, mas não posso desistir da vida por causa da velhice.
Seria
imaturo eu querer ter as características da juventude, me esconder porque minha
aparência não seja tão bonita. Daí talvez alguns velhotes construírem uma aparência
mais jovem adquirida no salão de beleza e na loja de roupas.
Como
canta Juca Chaves: "Fica mais velho quem tem medo de ser velho/ Roubando sonhos
de alguma adolescente/Dizer
que ele ‘dá duas’, que é potente / Mentir para si próprio e para o espelho”.
Se
você, caro leitor, é assim: um sujeito que luta contra a velhice, que seja! Não
estou aqui a dar sermões. Afinal, não existe nada mais feliz do que a alegria
de ser o que é. As duas meninas moça pareciam felizes com a juventude. Não estou proibido de curtir a minha velhice.
*Hélio
Consolaro é professor, jornalista, escritor. Atualmente é secretário municipal
de Cultura de Araçatuba-SP
Um comentário:
Não precisa ficar jovem, nem precisa nascer dentes,´só conservar a energia, e manter lúcida a mente.
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