AGENDA CULTURAL

23.12.12

Cras Fashion - o novo São José

Quadra poliesportiva do Caic, bairro São José, onde ocorreu o Cras Fashion
Hélio Consolaro*

No sábado, 22/12/2012, quis ver o "Cras Fashion", desfile de modas do Centro de Referência de Assistência Social do bairro São José. Araçatuba possui cinco Cras. Falaram-me tanto do evento de 2011 que não resisti em ver a edição 2012.

O "Cras Fashion" foi realizado na quadra coberta do antigo Caic, elefante branco construído pelo Governo Collor (atualmente é senador) e que foi retomado pela administração do prefeito Cido Sério (PT). Mulheres atendidas pelo Cras desfilaram com roupas confeccionadas por elas próprias, no “Projeto Qualificar”, que oferece oficina gratuita de corte e costura. 

Os moradores, sentados às mesas, com refrigerantes e salgadinhos. Uma grande festa de confraternização às vésperas do Natal com a presença do prefeito e secretários. Era o novo São José.

Bem na frente de onde eu estava, havia um sujeito maduro, um tiozão, inquieto à espera de alguém que fosse desfilar. Um corintiano acostumado a grandes emoções. 

O sujeito, sentado sozinho a uma mesa, rabiscava coisas numa caderneta, sem máquina fotográfica. Não podia ser um repórter. Escrevia, escrevia. Depois de algum tempo, abriu-a numa página, veio até onde estava o prefeito e mostrou-lhe o texto: "Valeu, Cidão!". E o texto continuava: "São José é só um rosto, enfim, uma comunidade". 

Quando me chamou de "Consa", descobri que era um antigo leitor de meus textos. Contou-me que sua "ex" ia desfilar. Havia sido convidado por ela. Estava todo orgulhoso e ansioso. E voltou para o seu lugar, sempre olhando quem seria a próxima a desfilar.  
E o desfile continuava. Passa uma, passam duas, gordas e magras, moças e senhoras, até garotas. Exibição de roupas femininas. 

- Olha a vó desfilando como mocinha! - dizia o neto entusiasmado.


De repente, surge no alto-falante a marcha nupcial, vários modelos. Lá veio uma morena de corpo escultural vestida de noiva na cor vermelha. O tiozão se entusiasmou. Parou e lascou um beijo na face da manequim.

Aquele convite para vê-la vestida de noiva no desfile era um recado cifrado: "case comigo, cachorrão! Me leve para o altar". E o sujeito na cachaça!

Sem ter muito conhecimento com a figura, mas me sentindo um velho amigo dele, do meu lugar, fiz-lhe um sinal obsceno com mão: lascou-se!  Aquele bagaço havia perdido um mulherão... E eu achando que a mulher dele fosse uma coroa.

Fui até o tiozão, ser-lhe conselheiro. Como foi, como não foi, por que se separaram... Ficara viúvo, era o segundo relacionamento. O motivo da separação  era a maldita cachaça. Estavam assim há um ano, mas havia uma saudade entre eles... Era só largar a outra, a cachaça. 
 
Como cronista social da periferia, observo que os dramas humanos são iguais em todas as classes sociais. Naquela quadra poliesportiva, nada era diferente do que ocorria no Morumbi Fashion Week. Bastou apenas uma administração municipal dar visibilidade a toda essa gente que enterrava seu potencial em ruas sem asfalto, na falta de oportunidades, nas beiradas abandonadas da urbe. 

Morumbi Fashion Week
*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Atualmente exerce a função de secretário municipal de Cultura de Araçatuba

Um comentário:

Luciane Amorin Pereira Patim disse...

Olá Consa,tudo bem?
Sou a professora da oficina de corte e costura... Luciane,fiquei muito feliz com seus comentários.... quando ensaiava as minhas meninas ficava preocupada se tudo ia dar certo...mas graças a Deus ficou tudo maravilhoso... ...li o seus comentarios com o mesmo entusiasmo que li a muitos anos atras o que vc escreveu sobre minha filha que hoje esta com 21anos, ela declamou um poema caipira vestida com vestidinho de chitinha vermelha...em 2004,quando vc escreveu:Cerveja e um porção de bobagens...até autografou pra ela. Fico muito feliz que vc gostou do nosso desfile..abraços Lu.