AGENDA CULTURAL

6.10.13

Vale-cultura já movimenta o mercado no país

Desde o dia 23 de setembro, empresas que quiserem aderir ao programa podem se cadastrar no site do Minc

Ministra Marta Suplicy

Jair Stangler - Jornal do Comércio de Porto Alegre

Previsto para circular a partir de outubro, o vale-cultura pode injetar, segundo projeções do governo, até R$ 300 milhões na economia ainda em 2013. O benefício terá o valor de R$ 50,00 mensais e servirá para pagar uma série de bens e serviços culturais, sendo destinado, preferencialmente, a trabalhadores com renda de até cinco salários-mínimos. Desde o dia 23 de setembro, as empresas que queiram oferecer o benefício a seus funcionários podem se cadastrar no site do Ministério da Cultura (Minc). Cinco empresas já estão credenciadas: Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Ticket, Brasil Convênios e Banrisul. 

Prevendo forte adesão ao Programa de Cultura do Trabalhador, as empresas operadoras de cartões pré-pagos se preparam para operar o vale-cultura. “Tem muitas empresas perguntando quais serão as práticas do negócio, pedindo visitas e estudos para repassar aos funcionários. Há receptividade do mercado”, diz Jorge Elias Oliveira, diretor comercial da Green Card, empresa que opera cartões pré-pagos.

O vale-cultura também desperta o interesse dos setores que terão seus produtos e serviços remunerados pelo vale-cultura. É o caso do Grupo Saraiva (que detém editora e livraria), por exemplo. “O lançamento do vale-cultura, para nós, é uma ação que incentiva o consumo da cultura e, assim, consequentemente, desenvolve o País, e é uma excelente oportunidade para novos negócios”, comemorou Jorge Saraiva Neto, presidente do grupo.

A Câmara Brasileira do Livro (CBL) espera aumento de 5% na venda de publicações com o vale-cultura no primeiro ano. O cálculo é feito considerando-se uma adesão de 1 milhão de trabalhadores adquirindo um livro por mês, sobre uma base de 268,5 milhões de livros vendidos em 2012, segundo pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe/USP). Se o vale-cultura chegar a 17 milhões de trabalhadores, a CBL acredita em um aumento de 76% nas vendas em relação a 2012. “Queremos ser otimistas. O importante é que o trabalhador consuma cultura: teatro, cinema, inclusive cursos de circo, dança, fotografia, música, artesanato. O livro é muito importante, e é claro que cada um vai querer brigar pelo seu mercado”, diz Mansur Bassit, diretor executivo da entidade.

O Ministério da Cultura entende que o benefício poderá injetar até R$ 25 bilhões na economia nos próximos anos, mas não delimita um prazo preciso. Se o benefício chegar aos 42 milhões de trabalhadores com carteira assinada, público potencial estimado pelo governo, esse valor seria anual. Uma projeção mais modesta, realizada pela Fundação Getulio Vargas (FGV) a pedido do Grupo Setorial de Pré-Pagos, que reúne as empresas não financeiras que atuam nesse segmento, estima que o vale-cultura vá injetar R$ 700 milhões por ano no setor.

A aposta das operadoras é forte. Oliveira acredita que em dois anos o vale-cultura será responsável por 5% do faturamento da Green Card.  A Alelo, empresa operadora de cartões pré-pagos com faturamento de R$ 16 bilhões em 2012, também prevê um incremento nas vendas. “Nossa força de vendas está comprometida para comercializar o novo benefício em todo o Brasil”, diz Ellen Muneratti, diretora comercial, de marketing e de produtos da empresa.

Participação é optativa às empresas e vale para contratos com CLT 

O Programa de Cultura do Trabalhador, instituído no final de agosto após publicação de decreto presidencial no Diário Oficial da União, estabelece que poderão receber o benefício de R$ 50,00 todos os trabalhadores com contratos regidos pela CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) e cujas empresas aderirem ao programa.

O benefício poderá ser usado para pagar teatro, cinema, museus, espetáculos, shows, circo ou mesmo comprar ou alugar CDs, DVDs, livros, revistas e jornais; cursos de artes, audiovisual, dança, circo, fotografia, música, literatura ou teatro; ou então para adquirir instrumentos musicais. O crédito é acumulativo e não tem validade.

O objetivo do programa é beneficiar quem ganha menos. Assim, o trabalhador que ganha até 1 salário-mínimo pagará 2% do valor do benefício para recebê-lo, ou seja, R$ 1,00. A tabela é escalonada conforme o salário do trabalhador. Quem recebe entre 4 e 5 salários-mínimos, por exemplo, pagará 10% do valor do benefício, ou R$ 5,00. Acima de 12 salários-mínimos, o desconto será de 90%, ou R$ 45,00. A participação no programa é decisão do empregado.

O vale-cultura também não é obrigatório para as empresas. Até 2017, as empresas de lucro real (com receita bruta total superior a R$ 48 milhões no ano anterior) que aderirem poderão abater a despesa no Imposto de Renda (IR) em até 1% do imposto devido. As baseadas no lucro presumido ou Simples também podem participar, mas sem o benefício fiscal. O governo abriu mão dos impostos trabalhistas e não vai cobrar encargos sociais, uma vez que não se caracteriza salário.

A produção e a distribuição dos cartões serão feitas pelas empresas operadoras. São elas também que habilitarão os estabelecimentos que quiserem receber o vale-cultura. A taxa de administração cobrada pela operadora dos comerciantes varia de 0 a 6%. O credenciamento das operadoras já pode ser solicitado ao Ministério da Cultura.

Jorge Elias Oliveira, diretor comercial da Green Card, acredita que empresas e funcionários também serão seduzidos por aspectos legais e financeiros do benefício. Para as empresas, além da possibilidade de abater o benefício do IR, ajuda o fato de não haver encargo sobre o benefício. “Elas estão melhorando salário, retendo mão de obra, sem aumento no caixa”, diz Oliveira. Por outro lado, avalia ele, o funcionário também ganha porque não terá de pagar mais IR sobre o vale-cultura. Ele concorda com a ministra da Cultura, Marta Suplicy, que prevê crescimento exponencial do benefício. “Vão acabar ocorrendo convenções trabalhistas que vão impor a obrigatoriedade, como aconteceu com o Programa de Alimentação do Trabalhador”, diz.

A empresa que quiser oferecer o benefício aos seus funcionários já pode se habilitar no site do Ministério da Cultura e indicar a operadora com que quer trabalhar. A fiscalização será feita pelos ministérios da Cultura, do Trabalho e da Fazenda.

Criação do programa gerou polêmica

A proposta para criação do vale-cultura surgiu em 2009, ainda no governo de Luiz Inácio Lula da Silva. No início da gestão da presidente Dilma Rousseff, com a nomeação da ministra Ana de Hollanda para a pasta da cultura, o projeto foi deixado de lado, tendo sido retomado com a nomeação de Marta Suplicy, em setembro de 2012.

A definição dos itens que poderiam ser adquiridos foi o principal alvo de críticas e polêmicas. No começo do ano, a ministra chegou a afirmar que o vale-cultura poderia ser usado, inclusive, para comprar “revista porcaria”, e que a escolha seria do trabalhador.

Questionado sobre a prática de renúncia fiscal para executar o programa e se esta é a melhor maneira de fazer política cultural, o Ministério da Cultura destacou que o vale-cultura também contará com recursos privados. “O governo está incentivando o investimento dos empregadores em seus empregados, isentando os impostos sobre esses valores distribuídos, o que estimulará a produção cultural brasileira, em todos os lugares do Brasil. Caberá ao trabalhador escolher o que comprar, e caberá ao produtor cultural oferecer produtos de boa qualidade que atraiam esses novos consumidores”, informou o ministério por meio de sua assessoria de imprensa.

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