AGENDA CULTURAL

2.12.17

Cortar as unhas, sinal de paz

*Hélio Consolaro

Nesta semana, eu estava inspirado para fazer o bem: cortei as unhas das mãos com meu velho e grande cortador Trim. Apesar de minha pança, eu faço o mesmo com as unhas dos pés. Um gemido aqui, outro ali, mas consigo.

Os médicos detestam crianças com unhas compridas porque debaixo delas podem se esconder doenças. Lavar as mãos e cortar unhas são hábitos de higiene cantados por Carequinha no meu tempo de menino. Recomendação não seguida pelo personagem Zé do Caixão.

Não sou nenhum metrossexual, por isso as minhas unhas são de tabaréu, sem nenhum trato, nada de cortar as unhas no cabeleireiro. Esse negócio de "fazer as unhas" não é comigo, ainda resisto. Aliás, mulher não gosta de homem de unha por fazer, porque na hora do pega, pode machucar lá.

Sou tão pobre que não tenho terra nem debaixo das unhas, um sem-terra genuíno. No meu tempo de garoto de sítio, minhas unhas viviam pretas, as debaixo e as de cima, de tanto brincar com terra. Aliás, para o homem do campo, a terra não é sujeira como na cidade. Terra é fartura!

Ao cortar as unhas nesta semana, beirando os 70 anos, fiquei imaginando se houvesse um "unhômetro", que contasse as vezes que cortei as unhas, ele já teria zerado e virado várias vezes. Corta, corta, cresce, cresce.

Fui ao dicionário e não encontrei nenhum sentido bonito para a palavra unha. Essa lâmina dura da ponta dos dedos só tem sido usada para o mal. Unhar os outros, por exemplo. É uma arma de defesa de muitos animais.

O compositor Frank Aguiar tem um verso que sintetiza o papel da unha: "Meu bem, daqui pra frente eu vou matar você na unha". Há também o "unha de fome" e o hábito de "roer a unha". Dizem que os santos só usam as unhas para as coisas boas, eles não metem a unha em ninguém.

Quando estamos desarmados e aparece uma fera em nossa frente, o corajoso enfrenta o perigo e mata a desgraçada na unha e, às vezes, pede ajuda aos dentes.

Se eu fosse continuar a escrever sobre a unha, eu ia encher páginas e páginas, porque existe também o masculino "unho", uma peça que se põe na torneira para encaixar a mangueira.

Muitos políticos brasileiros andam metendo a unha no dinheiro do povo, mas caíram na unha da Polícia Federal. Tudo isso aconteceu porque políticos corruptos e empresários corruptores são unha e carne.


*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras.

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