Tacilim Oréfice*
Acabei de ver o filme Gaslight (À Meia Luz) de 1994, estrelado por Ingrid Bergman e Charles Boyer, dirigido por George Cukor. O filme é baseado em uma peça de teatro Gas Light de Patrick Hamilton's de 1938.
O interessante, além do filme todo que é uma obra de arte, é que o nome do filme popularizou-se pela trama e acabou virando um termo: "Gaslighting ou gas-lighting que é uma forma de abuso psicológico no qual informações são distorcidas, seletivamente omitidas para favorecer o abusador ou simplesmente inventadas com a intenção de fazer a vítima duvidar de sua própria memória, percepção e sanidade. Casos de gaslighting podem variar da simples negação por parte do agressor de que incidentes abusivos anteriores já ocorreram, até a realização de eventos bizarros pelo abusador com a intenção de desorientar a vítima. O termo deve a sua origem à peça teatral Gas Light e às suas adaptações para o cinema, quando então a palavra popularizou-se. O termo também tem sido utilizado na literatura clínica. " (Wikipédia)
Perceba que uma forma indireta de Gaslighting está acontecendo com todos nós, neste exato momento, por todo o país e por toda a imprensa nacional. Em cada conversa, em cada imagem, em cada meme, em cada opinião, vídeo ou discussão. [...].
Alguns aceitam cegamente notícias, opiniões ou mensagens e compartilham sem pensar as chamadas fake news. Então, alguém com mais tempo ou mais disposição, desmente aquela notícia. Então, sem podermos saber se é verdade ou não qualquer tipo de notícia, tomamos mais cuidado e agora passamos a verificar as fontes das notícias... mas o que isso adianta?
Imediatamente após uma notícia, supostamente verdadeira, pois teve sua sua fonte verificada, mas não o seu conteúdo, já que não estávamos lá para saber e precisamos confiar em quem escreveu - normalmente um jornalista capacitado, ou fonte de notícias respeitável -, aparece um monte de pessoas dispostas a distorcer ou descreditar aquela notícia. Não por valores morais, mas por valores pessoais, políticos, religiosos ou sem motivo nenhum, apenas para ir contra, pois é "divertido". O que, para aqueles que olham de longe e não tem uma opinião pessoal, acaba confundindo, irritando, pervertendo e frustrando.
Imagine agora tudo isso para as pessoas que estão chegando agora. Imagina a pressão na cabeça de uma pessoa que, sensatamente, gosta de ouvir os dois lados e acha que os dois lados estão errados - ou certos em seus pontos de vistas -, mas, invariavelmente, alguém pergunta: "O que acha?" não querendo ouvir a opinião da pessoa, ela quer ouvir a confirmação do que ela acabou de falar.
Se é contra, ela é tachada de nomes ou "o inimigo" e se é a favor e concorda, ela está "Certa". Céus! Que diabos está acontecendo? É, sim, uma forma de abuso psicológico contra as pessoas e o mesmo vale para os dois lados da história.
Descreditar completamente as ideias de uma pessoa apenas para provar o seu lado sem argumentos válidos ou embasados, dizendo "porque sim" ou "porque não" ou "é mentira" ou é "certo". "errado", apenas para provar um ponto de vista que acredita ser certo, é um abuso psicológico.
Certamente não podemos nos culpar nem culpar as pessoas, pois o abuso não começou nessas discussões. O abuso começou em quem produziu essa discórdia entre as pessoas. O agressor tem um interesse pessoal, enquanto, supostamente, nós, que discutimos e defendemos nossas ideias, queremos o bem de todos, da nossa comunidade e família.
Talvez, num mundo tão globalizado, nunca venhamos a saber quem foi esse agressor, afinal, uma notícia da UOL, muitas vezes, é uma tradução da CNN internacional que, por sua vez, foi feita por um correspondente da França e que recebeu uma dica de um cara na Austrália. Todos agentes passivos desses interesses.
Então, por favor, venho fazer o convite para assistirem a esse filme maravilhoso, pensarem sobre esse conceito de pressão psicológica por distorção da realidade que, às vezes, não é infligida propositalmente, mas repetida sem pensar, e para sermos mais ponderados, mais cautelosos. Pensarmos mais e, ao mesmo tempo, equilibrar com o nosso coração e o que nossa intuição diz sobre o trato com o próximo. Afinal, como diz Hannah Arendt, a "banalidade do mal" começa se instalando nas mentes de pessoas que se abnegam de pensarem, de raciocinar. De pessoas que deixaram de se verem como humanos, "maquinaram-se", se pode se dizer.
Pessoas que se tornaram ferramentas do contexto histórico, político e geográfico. Pois o mal não é inerente nas pessoas. Ele é gerado através da desconfiança, das desilusões, das mentiras e do medo. Ele é praticado por pessoas boas que acreditavam cegamente que estavam fazendo o bem.
Talvez isso também sirvo para mim, ao escrever este "textão" . Faço-o com a melhor das intenções, acreditando que, quem tiver tido paciência de ler tudo, compreenda que é um convite para ver uma obra de arte e ponderar. Já que a única "cura" ou modo de defesa contra o gaslighting é "sua capacidade de confiar em seus próprios julgamentos."
*Tacilim Oréfice, professor, publicitário, diagramador de livros, Araçatuba-SP
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