Valdiram - jogador do Vasco |
Valdiram - morador de rus |
Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP
Atacante do Vasco em 2006, Valdiram morreu neste sábado (20 de abril). Segundo informações divulgadas pela emissora Bandeirantes, o ex-jogador foi encontrado morto com sinais de espancamento em São Paulo. Ele vivia como morador de rua e sofria de alcoolismo e compulsão por drogas e sexo (Fox Sports)
Há uma certa perversidade entre nós que é impossível de contê-la. Nós podemos melhorar bem a nossa coexistência, mas transformar a nossa vida num mar de rosas é quase impossível. Haja vista que nunca estamos plenamente contentes com o presente.
A teologia da libertação afirma que a construção do céu (a utopia) começa aqui, mas este vale de lágrimas é ingrato, enquanto muitos choram outro tanto ri de alegria. E aquela afirmação de que aquilo que é feito aqui, aqui se paga (ou se goza) parece ser também uma verdade insuperável.
O leitor terá razão em pensar que este cronista é meio doido, pois inicia a sua crônica com a transcrição de uma notícia sobre a morte de um jogador e se envereda por um papo metafísico. Cabe ao leitor o direito da dúvida, mas tem tudo a ver.
A riqueza material e mesmo a espiritual é uma gangorra, ora em cima, ora embaixo. As nossas fraquezas não nos permitem uma retidão de caráter, nem mesmo os santos. E quando essa retidão acontece, descobrimos que se trata de hipocrisia.
Na verdade, escrevo tudo isso para justificar a minha malvadeza, minha falta de compreensão com a vida do outro. Fiquei consternado com a morte do jogador Valdiram (ex-Vasco), com o mesmo sentimento de quando assisto a filmes da Paixão de Jesus Cristo no calvário, ou seja, o sofrimento faz parte de nossa trajetória.
Abraçar a lógica do "ter sempre mais" é correr um risco de voltar a não ter mais nada ou muito pouco. Então, ter juízo e ser guardião de si e da sua riqueza faz parte do jogo. Não perceber isso, pode ser a derrocada.
A Valdiram foi dada a oportunidade de ter uma vida mais rica, mas caiu tanto que não voltou a ser pobre como era, foi mais longe, atingiu o fundo do poço. Pelo que parece, não foi por opção, foi mesmo vítima do engodo. Não imitou Francisco de Assis.
Jogadores de futebol e artistas, geralmente afrodescendentes, ganham fortunas com sua arte, quase sempre com pouca idade, sem experiência, sem cultura alguma do mundo financeiro. Se não sabem administrar suas próprias riquezas, outras vezes possuem famílias mal intencionadas. Mané Garricha é um exemplo emblemático. E parece que Adriano, O Imperador, está no mesmo caminho.
Revistas e sites sempre trazem reportagens de gente ainda viva, mas depois do ápice financeiro, está pobre. Não é um ou outro caso, são muitos.
A minha malvadeza, caro leitor, é não ter dó de tais figuras, porque ser pobre não é defeito, mas desejaria a elas que fossem resilientes, reconstruindo não o patrimônio, mas um ser humano consistente, com outros valores.
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