AGENDA CULTURAL

7.4.22

Precisamos reaprender a falar - Alberto Consolaro

A falta do diálogo é antessala da frustração e infelicidade que geram conflitos, guerras e cenas patéticas!

Ensinar e aprender a falar com palavras certas e frases bem-feitas faz parte do dia a dia de muitas crianças e faz uma grande diferença. E adultos dirão: nossa como essa criança é articulada, só porque se expressa com palavras bem faladas em seus fonemas e com uma concordância verbal própria da sensível e poética língua portuguesa.

ENTRELINHAS E IRONIAS

Parece-me importante não ensinar as crianças a falar nas entrelinhas e nem se comunicarem com manhas e trejeitos. Entrelinhas são ideias e intenções não explícitas ou diretamente expressas em uma conversa ou texto. A possibilidade de não se conseguir o que quer é muito grande, pois nem todos entendem esta forma esquiva de expressar. Não se consegue ser feliz falando entrelinhas ou com manhas e trejeitos.

A mesma coisa acontece com as ironias e sarcasmos. Se em alguma conversa a ironia não for utilizada com maestria, ela não será compreendida e pessoas serão ofendidas e a comunicação humana que foi o primeiro objetivo não se completou, então não valeu a pena! Antes de usar ironias e sarcasmos sempre pergunto rapidamente: para que vou fazê-la? E em geral, não tem sentido pelo risco de não ser compreendido e aí uso uma linguagem direta! Não acreditem que ironias e sarcasmos são coisas de inteligentes! Eles não usam ironias e sarcasmos, esta ideia é uma mentira!

Em política é comum as entrelinhas e os trejeitos e, por isto tantos se sentem traídos ou são chamados de traidores. Porque não sermos diretos e sinceros, sem ser sinsericidas? Expressar diretamente o que queremos e sentimos permite que os outros saibam de nossas expectativas. Se formos importantes para aquela situação ou pessoas, assim teremos o que queremos!

TAPA NO OSCAR

O tapa de Will Smith no comediante do Oscar por uma piada inoportuna sobre sua esposa, mostra o que uma falha de linguagem pode provocar. Se no lugar do tapa, tivesse pegado naturalmente o microfone, o que não lhe seria negado no contexto, poderia ter tomado uma atitude maravilhosa dizendo: “- Pessoal, prestem atenção por gentileza, fazer piadas sobre as deficiências, aparências físicas e doenças de outras pessoas são simplesmente cruéis! A próxima vítima pode ser você ou quem  ama!” Ao voltar para o lado da amada, teria sido ovacionado de pé.

Piadas, zombarias e “bullyings” com raríssimas exceções, estão carregadas de preconceitos, maldades e vinganças compensatórias. Podem ser engraçadas, mas alguém ficou magoado, triste e envergonhado. Se tem alguma pendência com alguém, fale diretamente, é muito mais produtivo e humano. Ensinem isto às crianças.

Muitos homens e mulheres não aprenderam quando criancinhas que devem dialogar. Os pais quase sempre eram impositivos e autoritários, onipresentes e onipotentes, e crianças aprendem tudo! Quando crescidos tornam se pessoas que odeiam discutir relações o que exige reconhecer limitações, expressar desejos e medos, ou seja, se mostrar frágil. E se alguém tenta insistir no diálogo, quase sempre passam a ser mudos, grosseiros ou violentos, pois não aprenderam a falar! E tome violência e intolerância.

REFLEXÃO FINAL

Líderes, quase sempre, são mal-amados e não sabem dialogar, são autoritários, grosseiros e violentos! Usam e abusam das ironias, sarcasmos e zombarias! Precisamos ensinar as crianças a falar, mas é muito mais urgente, ensinar “de novo” os adultos a conversar, escutar e ser sinceros! Muitos dirão ser muito chato ficar falando de problemas! Claro que sim, mas a falta do diálogo sincero sobre eles, é a antessala da frustração e infelicidade, gerando conflitos, guerras e cenas patéticas como a do Oscar! Reflitamos.  

Alberto Consolaro - professor titular pela USP - consolaro@uol.com.br

 

 

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