AGENDA CULTURAL

5.2.23

Ser... tão brasileiro - Carlos Brefore

 


Carlos Brefore, presidente da Academia Araçatubense de Letras convida escrivinhadores, escritores, leitores, estudantes, amantes da cultura e da literatura brasileira para o ciclo de palestra nas reuniões do Grupo Experimental, começando nesta terça-feria, 7/2/2023 - 19h, na sede da AAL, rua Joaquim Nabuco, 210 com o livro O SERTANEJO . A única taxa cobrada é o interesse, de José de Alencar. Taxa única: interesse pelo assunto.

ARTIGO DE CARLOS BREFORE

“Esta imensa campina, que se dilata por horizontes infindos, é o sertão de minha terra natal”, afirma o José – aquele que escreveu o romance “O Sertanejo”. Já o João (o que veio de Minas), em “Grande Sertão: Veredas”, afirma que “sertão é do tamanho do mundo” e que “sertão é onde manda quem é forte, com as astúcias. Deus mesmo, quando vier, que venha armado!” Seja como for, o termo é antigo, e, lá atrás, no século XIX, dizia-se que sertão era “uma região agreste, distante das povoações ou das terras cultivadas”, era “o interior, o coração das terras, opondo-se à costa e ao mar”. Para um certo Antônio (conta-se que ele dava muitos conselhos!), um dia “o sertão vai virar mar, e o mar vai virar sertão”. O mote pegou... e virou música: “Quando o céu virasse a terra / Como um rio sem nascente / Quando a espada entrar na pedra / Quando o mar virar afluente”... canta o meu xará Edu. 

Mas, enquanto o sertão não vira mar, a lua continua sendo mais bonita por lá, pois Catulo nos contou que “Este luar, cá da cidade / tão escuro, / não tem aquela saudade / do luar / lá do sertão”. Já o Arnaldo contou para Bethânia que queria a lua vermelha do sertão: “Lua vermelha / Pedra que flutua / Que ilumina o poste / Que ilumina a rua / Lua vermelha / Meia de Luís / Toda sertaneja / Eu sempre te quis”. Aliás, foi Bethânia que nos cantou sobre a força do sertanejo, ao representá-lo em uma ave – o carcará, que “pega, mata e come”, “não vai morrer de fome” e tem “mais coragem do que homem”. Mas o Euclides, bem antes, já nos havia noticiado que “o sertanejo é antes de tudo um forte”. 



O Luís (o da sanfona) nos apresentou um outro pássaro – a “asa branca”, que todo mundo que estuda flauta, com certeza, conhece. Foi ele quem nos contou também a história do coitado do Assum Preto, que alguém (que selvageria!) furou os olhos: “Tarvez por ignorança / Ou mardade das pió / Furaro os óio do Assum Preto / Pra ele assim, ai, cantá mió”. Quando se pensa no sertão do Nordeste brasileiro, a primeira imagem que nos vem é a da seca (a Raquel me contou que a de 1915 foi muito grave) – dá até pra ver Fabiano, Sinhá Vitória e a cachorra Baleia fugindo daquele sol, que deixa suas “vidas secas”. 

Mas, se o sertão tem seca, também tem rio – aquele com nome de santo é bem famoso: “Francisco, Francisco / Tantas águas corridas / O vento e a vela / Me levam distante / Adeus velho Chico / Diz o povo nas margens”. Foi de lá do sertão que veio um sujeito chamado Severino (amigo do Cabral), que nos disse que a morte e a vida podem ser bem severas. O Chico (que não é o santo) é quem nos contou que esse Severino anda sempre atrás da “parte que lhe cabe deste latifúndio”. Foi de lá que veio também uma moça que é uma das melhores cozinheiras da região: “Vim do norte vim de longe / De um lugar que já nem há / Vim dormindo pela estrada / Vim parar neste lugar / Meu cheiro é de cravo / Minha cor de canela / A minha bandeira / É verde e amarela / Pimenta de cheiro / Cebola em rodela / Um beijo na boca / Feijão na panela”... o Jorge me disse que ela se chama Gabriela. 

Dizem que foi lá no sertão que o Ariano viu “uma mulher vestida de sol”, pois há muitos mistérios por lá. O João (o do vale) nos ensinou alguns dos segredos do sertanejo: “Catingueira fulora: vai chover / Andorinha voou: vai ter verão / Gavião se cantar: é estiada / Vai haver boa safra no sertão / Se o galo cantar fora de hora: / É mulher dando fora, pode crer / Acauã se cantar perto de casa: / É agouro, é alguém que vai morrer”. Mistérios, presságios e crendices... se você pedir para alguém de mais idade, de lá, lhe contar uma dessas histórias, vai ouvir o relato de casos fabulosos tidos como se fossem reais. E nem adianta falar que é bobagem, que é mentira, pois ela vai lhe falar: “Juro que vi!”. E, se você for mais ousado e perguntar: “Mas como isso é possível?”, com certeza vai ouvir como resposta: “Não sei! Só sei que foi assim!” 

*Prof. Dr. Carlos Eduardo Brefore Pinheiro - presidente da AAL 

2 comentários:

H disse...

Que belo inteligente texto. Assisti no Globo Rural um bom pedaço da vida e obra de João Cabral m.neto e , em sectratando de sertão, ele é o maior.

H disse...

Que belo inteligente texto. Assisti no Globo Rural um bom pedaço da vida e obra de João Cabral m.neto e , em sectratando de sertão, ele é o maior.