AGENDA CULTURAL

10.10.23

Não foram abortadas pela mãe, mas são renegadas pela sociedade

 Carolina Rampi - menina refugiada - 2022 - Estadão



Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP

Não curto o mito da infância feliz, como a melhor parte de nossa vida, porque não tenho boas coisas para recordar. Se eu não tivesse dado uma boa infância para meus filhos e netos, talvez teria saudades da minha, não teria elementos de comparação.

Não estou me queixando de ninguém, nem procurando um culpado. Se há um responsável é o tal do pecado social, aquele que cometemos em conjunto. A situação não era boa, meus pais fizeram o melhor e os filhos têm um lugar social de fala. Resumindo: exercemos a cidadania.

No 12 de outubro é Dia da Criança em meio a duas guerras. A cada ano, as crianças não são as mesmas, morreram de fome, foram assassinadas nas guerras ou pelas balas perdidas, mas há muitas que avançaram na sua trajetória, foram vencendo a vida, ou melhor, venceram na vida.  

Muitos adultos, geralmente os velhos, criticam, o mundo está perdido, mas se esquecem de fazer a autocrítica: quem construiu esse mundo cruel foram eles.

Netos criança recebem presentes de seus avós, todos as crianças receberão presentes, nem que seja um doce, um brinquedo de plástico. Melhor do que não receber nada. Mas muitas crianças não são reconhecidas como filhos por pais. às vezes, abandonadas pelas mães. O último reduto de amor é a avó.

Não quero estragar o aspecto festivo do Dia da Criança de ninguém, mas precisamos nos lembrar delas quando fechamos a folha de pagamento, ao sonegar impostos, ao traficar. 

Suas mães honraram a vida, não cuspiram fora o feto, mas a sociedade diz que bandido bom é bandido morto, quem é criminoso não merece viver, exigem pena de morte, fatalidade de uma bala perdida. A criança nasce, não se aborta, mas depois não a deixa viver.  

Não acolhe seu filho sem pai, fruto de um encontro clandestino, porque o machismo diz que segurem suas cabritas porque meus bodes estão soltos. Mulher pobre não tem o direito de escolher seu homem, precisa se submeter ao estupro.    

Estenda a mão e dê um mimo para uma criança de rua, mas o melhor presente é praticar a justiça social, propiciar trabalho para que cada um ganhe dignamente o seu sustento.

Matar a fome é eliminar o egoísmo, infância digna é o fim da mentalidade machista. Não pegue uma mulher na marra. Viva bem, caro leitor, mas deixe o outro a viver também. Viva a paz, basta de guerra.

8 comentários:

Jackie @belhuda disse...

Quiçá o mundo todo ouvissem tais palavras, para que um "feitiço" de amor impregnasse o coração do mundo. Somos tão desprovidos de generosidade, que o mendigo da rua, no sol escaldante que tem feito, não afeta a generosidade das pessoas que o vêem no sinaleiro, ou deitado na marquise de um comércio fechado.
O mundo não é mais o mesmo e creio que com essa "torre de babel" instalada o fim esteja próximo mesmo.
O amor, onde está instalado?
As pessoas fitam o seu umbigo simplesmente, o outro, que lute!

Sueli disse...

Sábias palavras professor.

Anônimo disse...

Excelente mestre! 👏👏👏

Anônimo disse...

O buraco é mais embaixo... E a gente percebe no texto que as palavras e argumentos vão mais além

Anônimo disse...

Muito triste, nesta roda da vida, nossa geração da 3° idade, cobramos o inverso do que ensinamos

Anônimo disse...

O sábio tudo vê e ouve, mas quando fala ou escreve sensibiza em seu entorno, compreendo suas sábias palavras e as vivo, parabéns.

Anônimo disse...

Sabias palavras, resposta a um texto perfeito.🤝🤝

Anônimo disse...

O mal é culpar a sociedade das escolhas individuais, todos temos chances, pois falamos, pedimos, damos em troca, hj todos acham q e obrigação dos outros as mas escolhas. Hj não existe mais gratidão, sequer queremos ajudar quem na frente vai apunhalar.