AGENDA CULTURAL

12.2.24

O carnaval - a subversão da ordem - Manuel Orlando Pina

 

Carnaval de rua volta com tudo e deixa gostinho de quero mais em Araçatuba, 2024 

1

O Carnaval é a festa mais popular do Brasil. De fato, não conheço nenhuma festa em qualquer parte do mundo que canalize tanta energia durante quatro ou cinco dias. Como dizem, tudo termina na quarta-feira e a partir daí a contrição, até à Páscoa, 47 dias de sacrifício em não comer carne, assim mandou por séculos a Igreja Católica Romana.

2

Dizem que quem trouxe essa festa de “Carnis Levale” para o Brasil foram os portugueses a partir do século XVI, que lhe chamavam “Entrudo”. Pois, se não fossem os portugueses, quem seria? Não consta que os índios conhecessem o Carnaval. Mas não foram os portugueses que inventaram o desfile das Escolas de Samba. Isso parece que foram os clubes de futebol do Rio de Janeiro, lá pelos anos 20 ou 30 do século passado.

3

Mas se o cristianismo, pela mão da Igreja Romana é o herdeiro dessa festa da subversão da ordem, isso quer dizer que havia festividades pagãs semelhantes. Não só havia, como se perdem no tempo em termos de antiguidade. Parece que a evidência mais antiga vem da Mesopotâmia, Babilônia, mas estendeu-se pelas outras civilizações, a grega e a romana.

4

Na Babilônia era a festa das Saceias. Nessa festa um prisioneiro assumia o lugar do rei, agia como rei, governava como rei, durante cinco dias. No final da festa era morto.

Algo parecido com as festas católicas do Espírito Santo, ainda hoje realizadas nos Açores e alguns locais do Brasil, em que um prisioneiro, ou um menino, assumia a condição de rei e presidia à mesa farta de comida para distribuir pelos mais pobres. Era costume assar um boi inteiro.

5

Na Grécia e em Roma eram as festas de Dioniso e Baco, em que se bebia vinho, se dançava e se usavam máscaras para representar outras entidades, que não aquelas que ali estavam. Na Grécia antiga, nas peças de teatro, conhecidas como “Tragédias e Comédias”, todos os atores representavam usando máscaras, para que a sua identidade fosse irreconhecível e a personagem fosse a que a máscara representava. Os atores eram só masculinos.

6

As máscaras têm sido usadas até aos dias de hoje durante esta época festiva. O Carnaval de Veneza é o exemplo mais eloquente sobre esse costume de usar máscaras para, supostamente, esconder a sua verdadeira identidade. Evidentemente que não escondia, mas dava ao usuário essa sensação.

Durante a Idade Média era frequente o uso de máscaras em bailes elegantes, um disfarce para as loucuras que elas protegiam.

 

7

O imenso sucesso da festa carnavalesca no Brasil, pode ter a ver com as constantes crises psicossociais que o país tem atravessado, com o profundo desequilíbrio da população e outros fatores de natureza cultural. Segundo a psicologia, quanto mais um país sofre mais necessidade tem dessa folia, desse esquecimento das agruras da vida.

*Manuel Orlando Pina, escritor português, residente em Araçatuba e membro do Grupo Experimental da Academia Araçatubense de Araçatuba

Nenhum comentário: