AGENDA CULTURAL

6.4.13

A gargalhada do papa



Hélio Consolaro*

As atitudes que quebram paradigmas me são simpáticas. O ministro Joaquim Barbosa de camiseta polo, por exemplo, tomando uma cerveja num bar é muito interessante, para quem está acostumado a vê-lo de toga, vestido de morcego.
De toga, o ministro negro ganha solenidade, como dizia minha avó, fica parecendo gente. Brancos paramentados causam a mesma impressão, mas observe, caro leitor, a foto como o ministro à paisana fica com a cara de habituê de boteco, parecendo corintiano.

Com essa foto, o fotógrafo quis mostrar quão vulgar ou normal são as autoridades, astros, artistas ou ídolos fora dos pedestais. Não desejo destronar ninguém, mas ver estereótipos caindo aos pedaços é tudo que enlouquece um poeta, um publicitário, uma pessoa com o saco cheio das formalidades.

Outra foto que encantou por sua singularidade e singeleza foi a do papa Francisco. Foto de papa circunspecto, rezando, cara de quem está suportando as dores do mundo é comum. Que as santidades gargalham em momentos mais reservados de sua convivência é fato, mas se deixando fotografar assim, disseminando a imagem para o mundo é a grande novidade.
Para quem não sabe, sorrir era coisa do diabo durante a Idade Média, época em que a Igreja Católica metia bedelho em tudo. Convido o leitor a procurar alguma imagem de Jesus Cristo gargalhando ou mostrando os dentes. Nem as imagens de santos chegam a tanto. Todos são desenhados, imaginados na maior seriedade. Nos vitrais da época, só o diabo aparece gargalhando.


Interior das igrejas são verdadeiros ambientes fúnebres. Deus é apresentado como aquele que não quer ver seus filhos felizes, um distribuidor de desgraças: “Seja o que Deus quiser”. Daí as situações mais alegres serem chamadas de “do jeito que o diabo gosta”.

Papa Francisco está fazendo o mundo se esquecer do carrancudo Bento 16, com a cara de velhinho que considera o mundo perdido.  É a igreja mostrando uma cara leve, mais suave. Pode ser marketing? Pode. E é, mas longe do Francisco a artificialidade. Desde João Paulo 1. º não elogio um papa. Sinto-me mais confortável com o novo pontífice.

*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP.
      

2 comentários:

WALTER MIRANDA disse...

Salvo melhor esclarecimento, a expressão de que um negro togado fica parecendo gente, dita pela sua mãe, demonstra o quanto ainda ontem o preconceito e o racismo estava introjetado nos imaginários de uma sociedade que discriminava, e continua discriminando, os negros.Espero que o filho da mãe que via o negro de maneira diferenciada não pense igual.
O ser humano Joaquim Barbosa, fora do seu ambiente de trabalho, é um cidadão comum e, com certeza, não mistura uma coisa com a outra. Foi firme no julgamento dos mensaleiros e não se curva diante de qualquer autoridade corrupta.Depois disso pode tomar a sua cerveja com amigos da sua confiança e intimidade pessoal. O Lula, por exemplo, fora do seu Gabinete em Brasília aprontava as dele e o povão, principalmente os petistas, adoravam esse comportamento.

Hélio Consolaro disse...

Lourival Amilton
11:16 (7 horas atrás)

para mim
O professor é você mas sou eu que lhe dou 10 pela crônica sôbre a risada do papa. Uma vez, adolescente, fiz uma piada com a minha mãe, que me reprendia por eu não ter ido à Escola Dominical da minha igreja para ir jogar bola. Disse-lhe que no domingo Deus descansava, não queria ser incomodado. Ela me disse: Mas não vai jogar bola. Eu lhe respondi que é porque não tinha com quem, e se tivesse, não teria graça, ganharia sempre. Ela me disse que eu estava blasfemando, e eu nem sabia ainda direito o que era isso. Mas deduzi que não era coisa boa. E lhe respondi que achava que ele estava rindo da minha piadinha.
- Menino, que blasfêmia!
- Por quê, mãe, Deus não ri?
Ela ficou em dúvida. E acho que ainda estava em dúvida quando ele a levou. Mas tenho certeza que a recebeu com um belo sorriso.

Um abraço do amigo Lorico