AGENDA CULTURAL

2.10.13

Coliseu e basílica

Coliseu Romano
Hélio Consolaro*

As pessoas, às vezes, dependem de orientação sobre como agir no seu cotidiano ou julgar a ação de alguém como boa ou ruim. Muitas delas apelam para a religião e quando não entendem bem nem a religião que seguem, resolvem bater um papo com o seu orientador espiritual (padre ou pastor).
 
Basílica de São Pedro - Roma
Essa orientação necessária é fácil, não precisa conhecer muito filosofia, teologia e outras palavras com a terminação “–gia”, basta ter princípios éticos. Basta ter como ética a reverência pela vida. Essa sabedoria visceja em corações analfabetos.

Visitando o Coliseu Romano, a guia Cláudia, exímia conhecedora da história de sua cidade, explicava o que ocorreu com aquele monstruoso prédio em ruínas, que está sendo restaurado. Aliás, os guias turísticos bem preparados são verdadeiros professores, como aprendemos com sua explicação.

Cláudia dizia com ênfase, em nenhum momento citou terremoto como causa da depauperação do prédio, que o Coliseu Romano foi motivo de pilhagem. E por quem? Pela Igreja que usava os mármores que cobriram o famoso prédio romano para fazer seus gigantes templos, já que houve duas Romas, a dos imperadores e a dos papas. Isso não ocorreu apenas com o Coliseu.
Guia Cláudia, romana, muito competente
Nós, grupo de turistas, seguidores de Cláudia, ficamos tão chateados com aquela pilhagem, que condenávamos a ação dos fiéis, de religiosos. Na perspectiva do tempo, a igreja destruiu um patrimônio histórico com capacidade de abrigar uma plateia de 50 mil pessoas, mas naquele lugar muitos cristãos foram sacrificados, sendo jogados aos leões. Muitos gladiadores (escravos) morreram para que o povo aclamasse o imperador de plantão.

Mas a Igreja Romana, como demonstração de força, para se dizer tão poderosa quanto ao Império Romano, construía (e ainda constrói) templos faraônicos, utilizando inclusive a mão de obra escrava. A igreja que nascera numa manjedoura, portadora de uma mensagem de simplicidade, se transformou com a adesão de imperadores ao cristianismo na religião dos poderosos, igualou-se ao Império Romano, ostentando grandeza material e luxúria.

Você, caro leitor, vai me dizer que os objetivos eram diferentes. A Igreja enaltecia Deus e os santos, enquanto o Império Romano apenas o poder. Na verdade, os fins não justificam os meios e a nossa pecadora Igreja também foi poder (ainda é) por muito tempo. Ela derrotou o inimigo e assumiu o lugar dele, não construiu um mundo novo como propunha.  
 
Consa no Coliseu 
Como pregou Albert Schweitzer (citado por Rubem Alves na crônica “Em defesa da Vida ”) um homem nunca pode ser sacrificado por um fim. Na lógica das organizações, cada funcionário é apenas um meio para o fim da organização, não importa quão grandioso ele seja. A vida, não apenas dos seres humanos, é maior que as organizações.

Então, caro leitor, importa a reza, importa o discurso, mas acima de tudo o importante é a reverência à vida em nosso planeta, no universo. Nem o Coliseu Romano, nem a Basílica de São Pedro defenderam a vida.


*Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Secretário Municipal de Cultura de Araçatuba-SP

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