AGENDA CULTURAL

23.9.06

Sarau no Bate Forte

Hélio Consolaro

O boteco Bate Forte estava repleto de barrigudinhos na sexta-feira, Dia Nacional da Cerveja. Faca Amolada e Caneta Louca, esbaforidos, atendiam aos pedidos, que vinham aos gritos:

- Uma quadrada bem gelada!

- Uma porção de amendoim salgado!

E Seu Sugiro, churrasqueiro japonês, gritava lá da calçada:

- Espetinho de filé miau, bom, né!

Dona Assunta administrava a cozinha; Amelinha ficava na caixa, mais anotando que recebendo. O fiado andava preocupando o Faca Amolada.

Como o Marcos Ianner animava musicalmente o boteco nessa sexta, Bicho Grilo pediu o microfone para declamar um poema.

Todos desaprovaram. Poesia em boteco! Não vira...

- Parece o Consa, só vive fazendo sarau! – gritou Burguês.

Mas o título animou os barriguidinhos: Poesia da pinga. Subversivo, então, como gosta da cachaça, subiu na cadeira para ouvir melhor.

Faca Amolada arrumou um caixote, Bicho Grilo subiu e começou:
Para curar sua paixão, beba pinga com limão;
Para curar sua amargura, beba pinga sem mistura;
Contra dor de cotovelo, beba cachaça com gelo;
Contra falta de carinho: cachaça, cerveja e vinho;
Se brigar com a namorada, beba pinga misturada;
Se brigar com a mulher, beba pinga na colher;
Se brigar com o namorado, beba pinga sem chiado;
Quem dá amor e não recebe, mistura todas e bebe;
E se alguém te faz sofrer, beba para esquecer;


- Paro ou continuo – gritou Bicho Grilo.

Todos foram unânimes:

- Continue, continue, continue!

E continuou:

Para curar seu sofrimento, beba pinga com fermento;
Para esquecer um falso amor, beba pinga com licor;
Para acalmar seu coração, beba até cair no chão;
E se a vida não tem graça, encha a cara de cachaça;
Para você ganhar no bicho, beba uma no capricho;
Para ganhar na loteria, beba pinga na bacia;
Para viver sempre feliz, beba pinga com raiz;
E se você não tem sorte, beba pinga até a morte;
Se essa vida de cão só te faz sofrer, o remédio é beber!


Aplausos gerais. Dr. Duas Caras perguntou com a voz grogue:

- Quem é o autor dessa poesia!

Bicho Grilo enrolou, não queria dizer.

- Será o Subversivo? – perguntou Burguês.

- Não – respondeu Bicho Grilo. O autor é ignorado, pois morreu de cirrose.

Aquela resposta caiu como um banho frio, parecia sermão de religioso em visita ao Bate Forte. Silêncio. De repente, um tombo! Plaft! Quem foi, quem não foi?

Subversivo caíra da cadeira. Como Deus protege criança e bêbado, só teve alguns esfolados.

Para quebrar aquele clima de Associação de Alcoólicos Anônimos, Faca Amolada gritou:

- Rodada por conta da casa!

E todos voltaram a beber. Riam do poema, mas não gostaram do desfecho.

Um comentário:

Anônimo disse...

Esse poema foi hilário,rsrs
Por um momento pensei que o senhor Subversivo tinha acabo de morrer de cirrose...
Estou adorando ler as crônicas:)