29.10.07
Tropa de Elite – sem eufemismo
Hélio Consolaro
Confesso, caro leitor, que relutei em escrever algo sobre o filme Tropa de Elite, estava meio confuso. Todos os meus alunos assistiram a ele, com raríssimas exceções, mas viram o filme como se estivessem assistindo ao Máquina Mortífera, como lazer, sem preocupação de usar a obra de arte para interpretar a realidade.
A pirataria a que foi submetido o filme talvez tenha sido uma estratégia de marketing de seus produtores, ou de garantir a sua exibição, cuja produção foi cercada de muito mistério, já que denunciava falcatruas dentro da corporação.
A esquerda inicialmente negou o filme. Vários críticos o classificaram apenas como violento, bestializando as platéias. Concluíram que, mesmo bem intencionada, a construção do filme aplaudia a truculência policial e os atentados aos direitos humanos. Uma rejeição infantil, como se bastasse ser da esquerda para estar certo. Reserva de mercado ideológico.
A crítica às ONGs que atuam nas favelas, a história das passeatas em favor da paz, como se o policial quisesse a guerra, irritou a classe média, que anda meio perdida ultimamente. Devíamos mesmo era abraçar de vez a luta pela legalização do tráfico. O valor do filme está em seu conteúdo, não é um renovador de linguagem. Ele foi um soco na boca do estômago, nauseante. Quem esperava uma versão cult da violência, tradução artística, teve que suportá-la, sem qualquer eufemismo. O realismo de muitas cenas leva ao enjôo e à irritação.
Tropa de Elite deu a sua versão. Por que não ouvi-lo? A polícia talvez não esteja certa, mas não está completamente errada. A verdade não está de um lado só. Negar o filme é uma forma estúpida de não enfrentar o problema.
José Padilha, infelizmente, sofre o patrulhamento ideológico da esquerda e a perseguição da cúpula da polícia que, com o filme, ficou com as calças nas mãos. Isso demonstra que o diretor fez uma obra polifônica, abrigando várias vozes.
O Tropa de Elite deu uma aula de realidade. Infelizmente, nós, de classe média, somos muito moralistas, gostamos de apontar erros nos outros, mas somos incapazes de fazer a autocrítica.
Meus alunos, educados a ver cinema hollywoodiano, aderiram ao Capitão Nascimento e a seus métodos. Platéias que vibram com assassinatos e torturas nos deixam horrorizados, mas também a cegueira de intelectuais de barzinhos não constrói nada.Tropa de Elite demonstra que a ética depende da situação, ninguém é bom ou ruim em qualquer contexto. O filme não caiu no maniqueísmo barato de bandido e mocinho, por isso é muito bom.
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