AGENDA CULTURAL

10.3.11

O que faz você feliz?



            Era a inscrição na camiseta de alguém que ia à sua frente durante um cooper.
            Ficou um pouco surpreso. Em ocasião desta veem-se muito camisetas portando inscrições de inumeráveis dizeres. Mensagens, propagandas, declarações, exaltações religiosas, cômicas, satíricas políticas com ou se estampas.
            Essa prática acontece majoritariamente em logradouros públicos. Muitos aproveitam o momento da execução do exercício físico para apregoar ideias, sentimentos, decepções, descontentamentos, usufruindo do democrático direito de liberdade de expressão pessoal ou que endossam e defendem.
            Viu e vê muitas assim até distraidamente já, tão comum e habitual isso se tornou. Todavia aquela quebrava o padrão. Fisgou-lhe a atenção mal os olhos a percebera. Obviamente o portador da pergunta não imaginara ser interpelado pelos outros com suas respostas. Sem cabimento. Seria grotesco. E até mesmo um molestamento aos demais, pois, em tais lugares e em tais momentos o objetivo é cada um malhar à sua maneira.
            A pergunta, portanto, tinha um caráter de provocação. Não propagava, nem manifestava ideias e sentimentos, e sim induzia o leitor a pegar ou largar. Se largasse, queria continuar com seu espairecimento ou pensamentos outros. Se pegasse, fatalmente se via conduzido a refletir sobre a questão.
            Ele pegou. E ficou surpreso. De repente a pergunta não o levara a vasculhar em busca do que o fazia feliz. Constatou que na verdade nunca conscientemente pensara nisso, tampouco, sequer, em entender o que era e não era felicidade.
            Veio-lhe de pronto o chavão: dinheiro não traz felicidade; mal não faz mal a ninguém. Porém, sem ele se pode ser feliz? São felizes os famintos, os desabrigados, os desempregados, os mendigos, os encarcerados? Se forem, por criarem, ou atingirem, sob essa condição, algumas situações que os levem a se considerarem felizes, então a felicidade não apenas será relativa, senão também discriminadamente distributiva, conforme a classe social. Não só a condição de ser, mas também tudo aquilo que faz esses felizes será aos ricos, abastado s, a absoluta infelicidade.
            Talvez seja um paradoxo, cogitou, mas a felicidade é uma das portas para a angústia. É certo que, aparentemente, aos destituídos elas não estão contíguas, não coexistem, pois, grosso modo, o angustiado é um infeliz. Todavia, se a primeira parte do provérbio for admitida como verdadeira, ser abastado, ter tudo que o dinheiro proporciona (e os adeptos da segunda parte do provérbio certamente diriam que, se não faz mal, e logo faz bem, felicidade e dinheiro é que estão contíguos, pois estar bem é ser feliz), por si mesmo, não sustenta a felicidade, então ser feliz também angustia.
            Ter tudo, poder tudo também acaba instaurando o sentimento de um pária social, que, somente por suas ideias, nenhuma transformação, nenhum projeto promotor do bem estar social realiza.  
            Nada. A promoção consiste em autorizar a abastança, o luxo, o excesso, a ostentação, com os quais, quase sempre estão contíguas a prepotência, a arrogância, a suserania. Quando muito, para manter acesa a nobreza (e talvez para também espantar o peso da consciência, que pode infelicitar), feito mecenas, distribuem-se “recursos” para as “casas de caridade” e congêneres, onde, em geral, reina a infelicidade. 
            Felicidade não é, pois, um ponto final. Quando muito, é um dos portos de chegada e de partida. O embrião da infelicidade se revivifica tão logo se atinge o porto – a suposta felicidade. Ele, como se uma força atávica, impinge o desejo inexpugnável de se chegar a um novo porto, presumida nova felicidade.
            Concluiu: ser feliz é fazer o que faço, sem que com isso torne infelizes outros. Eis o grande desafio de ser feliz. Afinal, se atavicamente desejo, logo invento a felicidade a cada felicidade.

*Tito Damazo é doutor em Letras, poeta, membro da Academia Araçatubense de Letras e da UBE.

Um comentário:

jhamiltonbrito.blogspot.com disse...

Viver a felicidade a cada felicidade, seria vivê-la em doses homeopáticas...ou não?
O que me faz feliz: ver o "Parmera" e o "curíntia" se danarem.