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| Milton Hatoun |
"Aprendi a ler e a escrever numa escola pública de Manaus. Naquela época - década de 1950 - a qualidade do ensino na rede pública era, no mínimo, razoável. Quando estudava no Colégio Estadual do Amazonas, aprendi a ler vários romances, que foram fundamentais para a minha experiência de leitor e, vários anos depois, de escritor. Sublinhei o verbo 'aprender' porque essa leitura seminal foi orientada por professores competentes, apaixonados por literatura. Eu pensava que o meu mundo limitava-se a Manaus, mas a leitura de Vidas secas e Infância (dois romances extraordinários de Graciliano Ramos) me conduziu a outra paisagem social, cultural, geográfica. Conheci uma outra linguagem e também uma região do Brasil totalmente diferente do Amazonas. A leitura de livros de outros autores me permitiu imaginar mundos diversos, tão diferentes do lugar onde nasci.
A literatura é uma forma de conhecimento de nós mesmos e dos outros. Há grandes leitores que aprendem a ler sem a orientação de bons professores. Mas no período da minha formação, a orientação dos professores foi importante. Eles eram meus interlocutores, com eles eu podia conversar e trocar ideias sobre um livro, um evento histórico, uma pintura italiana no salão nobre do teatro Amazonas, a etimologia de uma palavra que me soava estranha.
Tudo isso fez parte da minha formação educacional. O conhecimento adquirido nessa formação certamente contribuiu para que eu elaborasse uma visão crítica da sociedade, e não apenas brasileira. Talvez por isso essas primeiras leituras tenham sido tão relevantes para minha vida."
Milton Hatoum é escritor. É autor de "Relato de um certo Oriente", "Dois Irmãos" e "Cinzas do Norte", entre outros.
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