AGENDA CULTURAL

8.11.11

Poesia tecnológica


Hélio Consolaro*

Não, baby, na poesia não cabe apenas a rima “amor e flor”. Na poesia cabe o mundo inteiro, que não é feito apenas de natureza e de moças belas. A urbanidade é feia, aliás, os poetas árcades diziam que as cidades eram horríveis. As chaminés industriais são enormes, mas couberam nos poemas futuristas do início do século 20.
Tela futurista
Nicolaj Diulgheroff, L'uomo razionale (1928)

Primeira estrofe do poema “Ode triunfal”, de Álvaro de Campos, heterônimo futurista de Fernando Pessoa, elogia e poetiza  a fábrica: “À dolorosa luz das grandes lâmpadas elétricas da fábrica/ Tenho febre e escrevo./ Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,/ Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos”.  

Para os árcades, século 18, como Tomás Antônio Gonzaga, bonito mesmo era a natureza amena, como uma árvore florida, um gramado e um casal apaixonado namorando nessa paisagem. E os poetas árcades moravam numa cidadinha, mineira, chamada Ouro Preto. Pequena até hoje. Imagine se conhecessem São Paulo do século 21...

Trecho de poema de Tomás Antônio Gonzaga, o Dirceu de Marília, mostra aquilo que cabia antigamente na poesia: “Num sítio ameno/ Cheio de rosas,/ De brancos lírios,/ Murtas viçosas;// Dos seus amores/ Na companhia/
Dirceu passava/ Alegre o dia”.

Poemas são escritos apenas em versos, mas poesia é um sentimento, um encantamento, aquilo que me deixa pleno, com alegria de ter nascido. Ouvir uma música, contemplar uma paisagem, viajar com motos possantes por rodovias intermináveis, com espírito de aventura, como no filme “Sem destino”. Abandonar o cotidiano desgastante, recarregar a bateria, saborear o lado doce da vida. O hobby de cada um é a sua poesia, baby. Não tem preço, não há horas extras que paguem aquele momento único e intransferível. Isso é poesia!

Escrevo isso, caro leitor, porque participei no fim de semana passado do 1.º Resort Bike Weekend no Tietê Resort, meio curioso. Era gente que vinha de longe em suas motos possantes, com suas amadas na garupa. E no convite constava: “Somente serão aceitos casais para o evento”.  Houve gente de Mato Grosso e Paraná.

Para a direção do Tietê Resort era oportunidade de ocupar tão lindo local, momento de faturar. Para Araçatuba, o turismo era uma realidade naquele fim de semana. Afinal, queremos ser uma cidade turística. Para os visitantes, oportunidade de descansar, amar, ouvir música, comer bem, relaxar. Viver o êxtase.

Poesia, baby, é o guerreiro voltar da caçada, fazer um churrasco do animal morto e dançar aos deuses em agradecimentos. Dirceu trouxe sua amada na garupa de seu cavalo de aço, em vez de rincho, deu uma acelerada mais forte e disse a mesma frase de há muitos séculos ao ouvido da amazona: “eu te amo”.
Tietê Resort

Tudo era tecnológico: motos moderníssimas, iphones, portas elétricas, mas o ambiente era bucólico, como nos tempos de Tiradentes: piscinas, rio Tietê bem limpinho, barracão coberto com folha de palmeira, Sombra e água fresca, aquela que passarinho não bebe.  O bicho homem continua a uivar para a Lua.    

*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Atualmente é secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP




Lançado em 1969, conta história de Billy (Dennis Hopper) e Wyatt (Peter Fonda)que viajam pelos Estados Unidos de moto. A música tema do filme é de Steppenwolf "Born to be Wild"
    

Nenhum comentário: