AGENDA CULTURAL

5.2.14

A corrosão do poder dos caciques partidários

"O fato de haver maior intervenção do Judiciário em decisões de alto teor político não é nenhuma garantia de uma supervisão sensata".

Dificuldades do Executivo em governar, enfraquecimento dos partidos tradicionais, ativismo do Judiciário, não são fenômenos brasileiros. Inserem-se em um quadro muito mais amplo de crise global das instituições.
É uma sucessão de fenômenos simultâneos que colocam em xeque o modelo histórico das democracias ocidentais, exigindo seu aprimoramento.
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No seu "O fim do poder" Moyses Nain traça um quadro competente desse fenômeno global. 
A crise dos partidos tradicionais explodiu nos Estados Unidos, com o Tea Party quase assumindo o Partido Republicano; na França, com a reação da socialista Segolene Royal contra os mandachuvas do Partido Socialista.
No Reino Unido historicamente convivem dois partidos - o Trabalhista e o Conservador -, mediados por um partido de centro, o democrata liberal, que funciona como o pêndulo de poder. Nos últimos anos, essa paz partidária foi invadida por uma multidão de novos pequenos partidos, como o Partido Nacional Britânico, o Partido da Independência do Reino Unido, o Partido Nacional Escocês, o Sean Fein e outros.
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Essa rebelião das bases levou a um crescimento exponencial das primárias para escolher os candidatos dos partidos. Pesquisas de 2009 junto a 50 partidos políticos de 18 democracias parlamentares mostraram que em 24 deles houve grande influência da base na escolha dos candidatos.
Na Califórnia - termômetro das mudanças políticas nos EUA - referendo popular de 2011 obriga a incluir todos os nomes de candidatos às primárias em uma cédula única.
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Essa corrosão dos caciques não se manifesta apenas no aparecimento de pequenos partidos.
Nos Estados Unidos, em 2010 a Suprema Corte permitiu o surgimento dos SPAC (Supercomitê de Ação Política), fundos de apoio político criados por corporações, sem limites de gastos. Exige-se apenas que não façam acertos individuais com os candidatos que apoiam, obviamente uma falácia. Em 2012, os candidatos se valiam dos SPACs para promover aliados ou destruir adversários. E nem se pode dizer que a liberação do poder econômico sem limites fosse bom para a democracia.  Mas é um sinal da fragmentação do poder dos partidos.
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Paralelamente, as democracias ocidentais se viram frente a um ativismo inédito do Judiciário e não apenas convalidando golpes de Estado em repúblicas menores. Naim separa bem o Judiciário atuante daquele que intervem em disputas políticas.
Segundo Naim, foram os tribunais da Florida e a Suprema Corte quem deram a vitória a George Bush Jr sobre Al Gore em 2000. E há uma boa relação de interferências do Judiciário, independentemente do mérito, como o caso da Operação Mãos Limpas, da Itália.
Diz Naim: "O fato de haver maior intervencão do Judiicário em decisões de alto teor político não é nenhuma garantia de uma supervisão sensata".
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A novidade da história é o fato dessa necessidade de maior participação das bases passar ao largo dos maiores partidos políticos brasileiros, especialmente o maior partido de oposição, o PSDB.
É inacreditável como a maior figura do partido, ex-cientista social de renome, como Fernando Henrique Cardoso, em seus artigos semanais não ter a menor sensibilidade para esses movimentos tectônicos da opinião pública.

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