Os pais têm de usar múltiplas funções para educar os seus filhos, como professor, policial ou juiz.Um estudo os ajuda a entendê-las
10 DE ABRIL DE 2014 ÀS 11:30
Por Eduardo Araia
Cuidar de filhos pequenos é um desafio incessante. Num determinado momento, a calma e a harmonia reinam no ambiente; em outro, um problema inesperado de saúde já põe a casa em polvorosa, e numa terceira ocasião uma vontade não atendida da criança a deixa irritada, o que se reflete negativamente em todo o lar. Os pais precisam contar com um permanente jogo de cintura e estar sempre preparados para assumir o papel adequado – professor, supervisor, treinador, fiscal, enfermeiro, amigo, colega de brinquedo – quando o instante assim o exige.
Esse conceito foi reforçado por um estudo conduzido por duas psicólogas do desenvolvimento, a canadense Joan Grusec, da Universidade de Toronto, e a israelense Maayan Davidov, da Universidade Hebraica de Jerusalém. Depois de revisarem minuciosamente diversas pesquisas envolvendo a relação dos pais com os filhos, Joan e Maayan identificaram cinco formas de interação entre eles que influenciam em diversos detalhes o amadurecimento dos pequenos. Num artigo publicado na revista Child Development em 2011, elas afirmam que não há um “estilo” de criação, mas papéis diferentes que se alternam conforme a situação se desenrola. Entender esses papéis e aprender a detectar os momentos em que eles são exigidos ajuda os pais a alcançar mais facilmente o equilíbrio necessário para cuidar melhor das crianças. Conheça a seguir as cinco formas de interação definidas pelas psicólogas.
1) Proteção e assistência. Os seres humanos, assim como outras espécies animais, desenvolveram comportamentos que capacitam cada membro de sua prole a chamar a atenção de um adulto para conseguir ajuda ou meios de sobrevivência.
Se uma criança chora em busca de proteção, uma reação dos pais que demonstra sensibilidade ao problema resulta em diversos benefícios a curto e longo prazo para ela, explicam Joan e Maayan. O sistema neurobiológico da criança passa a ser “treinado” para, eventualmente, lidar com o estresse por conta própria; ela é mais empática ao sofrimento de outras pessoas e tende a querer cooperar com seus pais e estar perto deles. Para as psicólogas, confortar um filho agitado equivale a investir na cooperação futura dele com os pais, no desenvolvimento emocional positivo e no bem-estar geral da criança.
2) Controle. Por vezes um pai tem de exercer seu poder sobre os filhos para impor disciplina. À primeira vista, isso remeteria a algum tipo de crítica e castigo, como retirar privilégios ou definir que a criança vai ter de esperar mais tempo por algo que deseja. Mas pode abranger ações positivas, como reforçar o comportamento esperado ou estimular o raciocínio da criança para que ela mesma chegue ao resultado desejado.
Escolher a ação disciplinar mais indicada para o momento envolve buscar um cuidadoso equilíbrio em relação ao ato que a deflagrou, observam as psicólogas. A criança começa a desenvolver seu senso de autonomia e, se a reação dos pais for disciplinarmente fraca, o comportamento que originou o problema não vai mudar; excesso de disciplina, por outro lado, pode prejudicar a capacidade da criança de querer definir limites para si mesma.
Outro detalhe a ser considerado é a maneira como a criança responde a um ato disciplinar. Para algumas delas, basta um olhar severo; outras precisam de reprimendas mais fortes. Fatores como idade, sexo, temperamento, autoimagem, humor e natureza do problema exercem bastante influência sobre essas respostas.
É indispensável, portanto, que os pais conheçam seu filho ou sua filha o suficiente para que a estratégia escolhida e o grau em que ela for aplicada auxiliem a criança a corrigir sua falha. Joan e Maayan afirmam que o bom uso da disciplina permite à criança crescer sabendo fazer as coisas certas por conta própria, inclusive rejeitando os impulsos para fazer de outra forma.
3) Reciprocidade. O controle é um papel exigido habitualmente, mas as psicólogas ressaltam que também é importante para os pais atender ocasionalmente os pedidos que as crianças lhes fazem e acatar suas tentativas de influenciá-los. De acordo com Joan e Maayan, quando os pais atendem aos desejos razoáveis dos filhos, estes ficam mais propensos a aceitar com bom ânimo quando algo lhes é solicitado depois. As crianças que recebem esse tratamento tendem a ser mais felizes e a ter mais habilidades sociais positivas, menos problemas e menos conflitos. Estudos mostram, por exemplo, que as mães que brincam com seus filhos de maneira bastante interativa têm menos conflitos com eles. As psicólogas fazem, porém, uma ressalva importante no que se refere a recompensar a criança por gestos de cooperação. Segundo elas, esse procedimento pode minar o desejo genuíno dos pequenos de trabalhar juntos.
4) Aprendizagem dirigida. O papel de professor é constante para os pais e exigido nas mais diversas situações: é com eles, em geral, que a criança aprende a usar o vaso sanitário, manejar os talheres, amarrar o cadarço do sapato, comportar-se em situações sociais mais complexas ou lidar com sentimentos.
Segundo as psicólogas, os pais competentes ensinam por etapas, sempre de forma próxima e gentil. Depois de avaliarem o que o filho já sabe, eles o instruem sobre o passo seguinte e lhe oferecem apoio até que o filho demonstre ter assimilado o conteúdo transmitido. Com isso, a criança não apenas absorve novos ensinamentos, mas passa também a compreender o desenho mais abrangente do problema apresentado pelos pais, o que estimula nela um processo de meta-aprendizagem. Joan e Maayan relatam que mães que conversam com os filhos sobre questões emocionais específicas de uma forma coerente e significativa, incluindo detalhes, interpretações e comentários, ajudam a fazer avançar a compreensão geral dessas crianças sobre a vida emocional.
5) Participação em grupo. Crianças aprendem muito, de maneira fácil e natural, sobre o que é esperado delas participando de grupos, incluindo sua família, o círculo de amigos, vizinhos, igrejas e atividades extracurriculares.
Conforme os pais as orientam através dos rituais, rotinas e práticas dos diferentes tipos de organizações, as crianças aprendem implicitamente todos os tipos de normas – papéis de gênero sexual, expectativas culturais, ideias sobre a classe social, comportamento adequado em público – que vão ajudá-las a criar um sólido senso de identidade social.
Na realidade, existem provavelmente muitos mais domínios, e é provável que mais de um opere em determinado momento. Os papéis não são exclusivos dos pais – qualquer adulto responsável por crianças, ou até mesmo um irmão ou criança mais velha, pode ter o mesmo impacto. A ênfase em determinados domínios irá mudar com o desenvolvimento, e seus pais vão ser melhores em alguns do que em outros.
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