AGENDA CULTURAL

2.7.14

Dificuldade de elogiar

,
Hélio Consolaro*

A experiência de cada um revela a dificuldade de elogiar das pessoas. Elogiar, para muitos constitui um momento extremamente desconfortável e que exige um grande esforço para vencer a barreira que separa o elogio da crítica destrutiva. Numa democracia, criticar é menos comprometedor, bem mais fácil.
Alguns psicólogos chegam a dizer que o elogio é uma forma agradável de servidão, porque estimula a pessoa a continuar fazendo as coisas do mesmo jeito. Se uma professora elogia seu aluno, ele vai continuar com o mesmo comportamento que foi objeto do elogio. Ele vai sempre fazer o melhor para receber o elogio.

O elogio facilmente feito, principalmente no campo político, chega às raias do puxa-saquismo. Prefeito, governador e presidente se contentam com o silêncio da oposição, nunca conta com os elogios dos contrários, porque quem se cala consente. Oposição silenciosa, governo bem-sucedido.

Embora haja uma tensão natural entre imprensa e poder público, o jornalismo brasileiro exagerou nisso, transformou-a em guerra, levando o ex-presidente Lula a dizer que ”imprensa não é partido político”. Basta ver o que aconteceu com a Copa do Mundo.  

Estou escrevendo isso por dois motivos. O primeiro foi o comentário da colunista Célia Villela que elogiou o estado de conservação da avenida Brasília de Araçatuba, mas em seguida acrescentou “mas é obrigação”. Quer elogiar a prefeitura, mas teve a vergonha de fazê-lo.

O editorialista da Folha Região também teve a vergonha de elogiar, quando Araçatuba recebeu o “Selo de Cidade Livre do Analfabetismo” do Ministério da Educação por ter atingido o índice de 96,4% de alfabetizados. Honraria entregue apenas a 45 cidades do Estado de São Paulo, totalizando 206 prefeituras do Brasil. O título do editorial era “Zerar o analfabetismo, uma obrigação”.

Já estive do outro lado, sendo um dos cronistas mais irônicos com o mundo político, mas nunca tive vergonha de elogiar. Sempre escrevi, por exemplo, que José Serra foi um ótimo ministro da Saúde ao criar o medicamento “genérico”, enfrentando a indústria farmacêutica, como também foi ótimo Alexandre Padilha na criação do programa ”Mais Médicos”. Duas atitudes corajosas.

Por mais que nosso olhar sobre alguém, sobre uma administração, seja negativo, sempre encontramos coisas boas que merecem elogios. E elogiar quando for necessário dá credibilidade às possíveis críticas.

Não podemos ser portadores mórbidos da crítica, nem do elogio fácil. Quando não se quer elogiar, ou não pode fazê-lo, é melhor se calar do que deixar expressa a vergonha de elogiar como ficou demonstrado nos dois exemplos. A presença da conjunção adversativa (mas, porém, contudo, todavia) ou sua elipse deixa transparecer que o jornalista está de rabo preso com a oposição.   


*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP. 

Nenhum comentário: