AGENDA CULTURAL

17.1.15

Um livro interessante

"O Poeta e a mídia - Carlos Drummond de
Andrade e João Cabral de Melo Neto, Editora Senac-SP, é um livro pequeno no formado, grandioso no conteúdo, 143 páginas, medindo, 13cm por 21cm, volume 16 da coleção  "Livre pensar". R$ 27,10 (R$ 8,00 no sebo). 

Fábio Lucas, valeu-se de material jornalístico referente a Drummond e João Cabral ao longo de trinta anos, para este trabalho que une seguro domínio do tema a um discurso crítico. São aqui abordados a inter-relação de jornal e literatura, a construção pela mídia da imagem de Drummond e o exemplo de obstinação estética que foi João Cabral.

Apresenta a amizade entre os dois, a briga dos dois com a mídia, comentários sobre as principais entrevistas. O livro foi escritor por um acadêmico, mas não se limita aos textos da obra, porque Fábio Lucas apresenta a relação do poeta, por exemplo, vividos pelos dois grandes poetas brasileiros com a mídia brasileira.

A grande polêmica que João Cabral mantinha com mídia era a sua poesia, a falta de lirismo em seus poemas. E Drummond se negava a dar entrevistas, mudando o comportamento depois dos 80 anos.

Drummond
Alguns trechos que me chamaram atenção:

1. Drummond confessa que nunca sentou à mesa para escrever um livro, apenas reunia poemas,crônicas e contos publicados em jornais e revistas.

2 A história da literatura, por sua vez, deveria ser incumbência de especialistas, agrupados em equipe, e não produto de uma aventura individual - pensamento de Afrânio Coutinho.

3. Drummond confessa que não era dado a entrevistas porque o cargo público que ocupava exigia discrição.

4. As pessoas, especialmente os escritores, costumam ser oscilantes em seus pronunciamentos. O fervor da hora ou a pressão do momento muitas vezes precipitam conceitos que serão corrigidos ou amenizados mais adiante - sobre as posições de Drummond de apoiar o golpe militar de 1964 no início e ser contra João Goulart.

5. Mas a poesia, como a literatura, não foi feita para dar resposta às questões do vivente. Antes colabora para aumentar o número de perguntas ao seu perplexo inquiridor. Assim, após a leitura de um poema, o leitor, que procurou encontrar resposta para suas questões vitais, regressa
portador de perguntas mais densas e profundas.

6. Surpreendemos, em Camões, uma concepção anacrônica, um atraso em relação às conquistas da ciência, pois desenvolve um sistema geocêntrico, quando já refulgia a tese heliocêntrica do universo, que, por sua vez, recebia já definitiva contestação, via Kepler.

7. "Fui na contramão da sentimentalidade, do subjetivismo, da poesia brasileira" - João Cabral de Melo Neto.

8. "Eu pertenço a uma outra família de escritores, que só sabem criar vencendo dificuldades" - João Cabral de Melo Neto.
João Cabral de Melo Neto

9. Fiquei meio chateado com o João Cabral de Melo Neto, não gostava de italianos, pois os considerava todos ladrões.

10. "Poema é composição/ mesmo da coisa vivida/ um poema é o que se arruma/ dentro da desarrumada vida" - trecho de poema de João Cabral.

11. João Cabral pediu à família que ao morrer, queimasse todos os textos inacabados: "Podem, não, peço o favor de queimarem, porque as coisas inacabadas, é como se eu aparecesse nu no meio da rua".

12. João Cabral detestava Miguel Arraes.

13. Andaluzia e Nordeste eram realidades paralelas para João Cabral que viveu por tempos na Espanha, como diplomata.

14. Assim, os dois grandes gêneros da idade clássica são a epopeia e o drama, ou seja, a narração e a representação. No século 19, os dois gêneros se adaptaram à prosa, e, ironia da história, o que se denominará poesia será justamente a poesia lírica (pensamento de João Cabral). 

Biografia de Fábio Lucas

Natural de Esmeraldas (MG), da safra de 1931. Autor de importante e vasta obra de Crítica literária. Professor na Universidade Federal de Minas Gerais, em Belo Horizonte, sofreu perseguições durante os piores anos da ditadura militar (1964-1975), vindo a perder a Cadeira em que lecionava. Em 1997, quando da comemoração de seu aniversário, em homenagem prestada pela grande imprensa de Minas Gerais, o escritor e jornalista Roberto Drummond resumiu um conceito geral, quando se referiu a Fábio Lucas como o que há de melhor na Crítica no Brasil, ao lado de Antônio Cândido e de Wilson Martins. Lecionou Literatura Brasileira em várias Universidades no exterior. Ex- Diretor do Instituto Nacional do Livro. Ex- Presidente da União Brasileira de Escritores/ Seção de São Paulo, por vários mandatos eletivos. Integra a Academia Mineira de Letras bem como a Paulista.
Tem sido convidado para integrar Comissões Julgadoras de prêmios literários de projeção internacional, como, entre outros, o Prêmio Camões (Portugal-Brasil) e o Prêmio Casa de las Américas (Cuba).
Sua obra compreende, entre outros títulos: O Caráter Social da Literatura Brasileira (Prêmio Jaboti 1970); Razão e Emoção Literária (Prêmio “Os Melhores de 1982”, da Associação Paulista de Críticos de Arte); Crítica Sem Dogma (1983); Vanguarda, História e Ideologia da Literatura (1985); Mineiranças  (1991) (in Jornal de Poesia)

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