Leia também nesta página depoimento do ministro do STF, Marco Aurélio, sobre a maioridade penal
“Trancar adolescentes em celas apinhadas de criminosos profissionais pode atender aos desejos de vingança da população assaltada por eles nas esquinas, mas é uma temeridade”, diz o médico sobre a redução da maioridade penal
Por Redação
Em coluna publicada neste sábado (4) no jornal Folha de S. Paulo, o médico Drauzio Varella se colocou contrário à redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, objeto da PEC 171/93, aprovada na última semana pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados.
“Acho errado internar menores em penitenciárias de adultos”, inicia Varella, autor de Estação Carandiru, obra que posteriormente se tornou filme. Ele utiliza o exemplo norte-americano para sustentar sua tese, citando que, em alguns estados do país, como o Mississipi, adolescentes de 13 anos que cometem crimes graves são enquadrados na mesma lei dos adultos. “No período de 1990 a 2010, o número de menores em penitenciárias aumentou 230%, segundo o insuspeito Center for Diseases Control And Prevention (centros de controle e prevenção de doenças, em português)”, escreve.
“Do ponto de vista pessoal, não tenho a menor simpatia por criminosos de qualquer idade, mas frequento cadeias como médico há 26 anos”, afirma. “Trancar adolescentes em celas apinhadas de criminosos profissionais pode atender aos desejos de vingança da população assaltada por eles nas esquinas, mas é uma temeridade.”
Leia abaixo a íntegra do artigo.
“Maioridade penal
Acho errado internar menores em penitenciárias de adultos.
É evidente que um adolescente de 16 ou 17 anos capaz de assaltar à mão armada e atirar naqueles que se negarem a obedecê-lo tem consciência plena de que comete um ato abominável. Considerá-lo criança imatura para compreender a enormidade do crime praticado é paternalismo ridículo.
Também acho frouxa a legislação atual que recolhe um assassino dessa idade à Fundação Casa, para ser submetido à privação da liberdade e a medidas socioeducativas, por um período máximo de três anos.
Por coincidência, nesta semana a revista ‘The Economist’ publicou uma matéria em que analisa a experiência americana com a prisão de menores nas penitenciárias do país.
A Constituição americana garante a cada Estado a liberdade para julgar menores da forma que considerar mais justa.
Em Nova York maiores de 16 anos são enquadrados nas leis que regem os adultos, independentemente da natureza do crime. No Mississipi, a partir dos 13 anos, os autores de crimes graves recebem condenações iguais às dos adultos; em Wisconsin, a partir dos 10 anos em casos de assassinato.
Apenas em 2005, a Suprema Corte dos Estados Unidos proibiu que menores de 18 anos fossem condenados à morte. Em 2010, foi vetada a prisão perpétua para menores que não tivessem cometido assassinatos.
De acordo com a Anistia Internacional, hoje há no país 2.500 prisioneiros condenados à prisão perpétua por crimes cometidos antes da maioridade.
Quais as consequências de leis tão severas?
Paradoxalmente, no período de 1990 a 2010, o número de menores em penitenciárias aumentou 230%, segundo o insuspeito Centers for Diseases Control and Prevention (centros de controle e prevenção de doenças, em português).
A probabilidade de um adolescente condenado a cumprir pena com os adultos voltar a delinquir é cerca de 35% maior do que aqueles que são julgados pelas leis específicas para infratores jovens.
Do ponto de vista pessoal, não tenho a menor simpatia por criminosos de qualquer idade, mas frequento cadeias como médico há 26 anos.
Não é preciso ser grande criminalista para saber que é mais fácil recuperar para o convívio social infratores mais jovens. Marginais de longas carreiras têm a vida tão estruturada no mundo do crime que eles dificilmente se adaptam ao convívio com a sociedade que os rejeita.
Para agravar-lhes a desesperança, passaram tantos anos enjaulados em condições desumanas nos presídios brasileiros que o aprisionamento só serviu para castigá-los e torná-los ainda mais revoltados e antissociais.
Trancar adolescentes em celas apinhadas de criminosos profissionais pode atender aos desejos de vingança da população assaltada por eles nas esquinas, mas é uma temeridade.
Se houvesse prisão perpétua ou pena de morte no Brasil, como defendem os radicais, poderíamos ficar livres deles para sempre.
Não sendo esse o caso, dia mais, dia menos, eles voltarão às ruas. Estarão recuperados, dispostos a respeitar seus concidadãos, ou mais agressivos?
Um rapaz de 16 anos chega numa penitenciária de homens mais velhos com medo de ser estuprado, abusado e de perder a vida nas mãos dos desafetos. Será presa fácil das facções que dominam os presídios. Contará com a proteção do grupo e com as vantagens da cesta básica para a mãe e o transporte gratuito para a família visitá-lo nas cadeias espalhadas pelo interior.
Quando for libertado, entretanto, será forçado a pagar uma mensalidade de cerca de R$ 700, cobrada a pretexto de retribuir aos irmãos presos a ajuda que recebeu enquanto esteve na mesma situação. Para saldar essa dívida eterna, não poderá mais abandonar a vida no crime, a menos que arrisque perdê-la.
Se a sociedade julga suave a condenação máxima de três anos na Fundação Casa, no caso de menores de idade autores de crimes hediondos, nada impede a criação de leis que lhes imponham penas mais longas.
Mas que sejam cumpridas em presídios especiais, distantes da convivência com marginais perigosos.
Violência urbana é doença contagiosa que precisa ser tratada com racionalidade técnica, baseada em evidências. Adotar medidas drásticas ao sabor das emoções quase sempre provoca efeitos opostos aos desejados.”
(Foto: Reprodução/Youtube)
Ministro do STF Marco Aurélio sobre a maioridade: cadeia não conserta ninguém

Ministro do STF disse que a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos não deve ser vista como uma esperança de dias melhores; “Cadeia não conserta ninguém e não resolve os problemas do país, que são outros”, afirmou
Carolina Gonçalves, Repórter da Agência Brasil -
Ministro do
Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello disse hoje (1) que a
redução da maioridade penal de 18 para 16 anos não deve ser vista como uma
esperança de dias melhores. “Cadeia não conserta ninguém e não resolve os
problemas do país, que são outros”, afirmou.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171-A/93, que
altera a faixa etária de responsabilidade penal, foi aprovada ontem (31) pela
Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ), após mais de 20 anos em
tramitação.
O texto seguirá para uma comissão especial, que será
insalada no próximo dia 8 pelo presidente da Câmara a Câmara, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ). Marco Aurélio Mello lembrouu a articulação para que a mudança se
torne cláusula pétrea, dispositivo constitucional que não pode ser alterado nem
mesmo por uma PEC.
O ministro antecipou que não concorda com a classificação
legal para redução da maioridade. “De início, não penso assim, mas estou aberto
à reflexão”, ponderou, afirmando que o projeto “baterá no Supremo”.
Mello reconheceu que o ritmo de aprovação de novas regras
demonstra que o Legislativo está buscando se fortalecer. Entretanto, alertou
sobre o receio de normatizações “em época de crise, porque vingam as paixões
exarcebadas”. Segundo ele, o país já tem leis suficientes para correções e
deveria se concentrar em outros problemas.
Sobre o arquivamento das investigações contra o senador
Jader Barbalho (PMDB-PA), acusado de desvio de dinheiro da Superintendência de
Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), o ministro explicou que a morosidade da
Justiça brasileira prejudica inquéritos antes que eles sejam concluídos. O processo
tramitava no STF desde 2003. “A sociedade fica decepcionada quando tem
arquivamento de um inquérito.”
Ao participar da solenidade de comemoração dos 207 anos da
Justiça Militar da União, em Brasília, Marco Aurélio Mello alertou para o
problema da corrupção. “Chegando ao estágio que chegamos, verificamos que a
corrupção foi banalizada, mas não posso dizer que foi barateada, porque os
valores são muito altos”, ironizou.
Com relação a pedidos de abertura de inquérito contra a
presidenta Dilma Rousseff, Mello disse que a Constituição Federal não veda a
investigação, mas a responsabilização. Segundo ele, a cláusula existe
unicamente para proteção do cargo. “Já está tão difícil governar o país.
Imagina se tivermos um inquérito aberto contra a presidenta da República. Não
há impunidade, porque, por atos estranhos ao exercício do mandato, ela
responderá ao término do mandato. Aí, haverá julgamento na primeira instância”,
adiantou.
Também presente à cerimônia, o procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, foi homenageado com a Medalha Grã-Cruz, o mais alto
grau da Ordem do Mérito Judiciário Militar. Janot deixou o local sem falar com
a imprensa.
Ministro do Superior Tribunal Militar e chanceler da Ordem,
William de Oliveira Barros lembrou a história da justiça mais antiga do país,
criada em 1808, meses antes da chegada da família real ao Brasil. Oliveira
Barros destacou juristas famosos que participaram da história, entre eles
Sobral Pinto. e lembrou contribuições como a formulação da Lei de Segurança
Nacional
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