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Sede da Academia Araçatubense de Letras |
Tharso Ferreira*
Estou
embevecido, em grande honra, aos cinquenta e sete anos me tornei imortal, me
encaixei entre os homens que gozam da mesma honraria, estou na Academia de
letras.
Esta honraria se faz muito mais importante por eu estar entre poetas
como Tito Damásio, escritores políticos como Hélio Consolaro, o gandavo
Lourival Amilton. Doutores em simpatia como Geraldo da Costa e Silva, o
Pratinha, escritor com nome de general. Mulheres da envergadura de Cidinha
Baracat e Marilurdes Campezi e muitos outros e outras.
No fim da vida a sorte
me brindou com esta surpresa agradável.
É um espelho de homens e mulheres em que eu possa refletir para
continuar fiel à dignidade da poesia e em defesa de nossa combalida língua
portuguesa.
Somos letrados e
indômitos defensores de nossa fala escrita na nossa casa dura, feita de barro e
tijolos, que sobrevive a duras penas frente ao relógio desativado da antiga
estação ferroviária, tão antiga quanto seus ocupantes imortais. A Academia foi
fundada por visionários que viviam muito além do seu tempo. É uma casa velha de
janelas azuis, pintadas a pincel, que faz parte da história da cidade.
É lá que
se reúne um punhado de homens e mulheres de energias incansáveis em defesa da
essência dos códigos da língua. Fica no coração da cidade a casa entupida de
livros onde já a visitou o poeta amazonense Thiago de Mello, amigo de Pablo
Neruda, Loyola Brandão que passou por lá e me fez as honras de me entregar meu
primeiro prêmio de literatura e me disse que é um pecado não ouvir os poetas.
Agradeço a todos
os imortais que me receberam no meio deles como que eu merecesse tal honraria
fraterna e me deram a autoridade tanto pedida de defender a poesia, o conto,
porque a minha vocação para as letras é insana e doentia. Acho que estou
cumprindo o sonho de todo e qualquer escritor que se preze, pois todos eles
gostariam de se unir em torno da defesa de suas línguas de origem. Qualquer
escritor americano, europeu, asiático, africano, australiano gostaria de estar
no meu lugar. E a vida, com suas surpresas, me dispôs no meio deles, que me
reúna uma vez por mês, com as cabeças mais inteligentes, os poetas mais
deslumbrantes de minha cidade. Morram de inveja, escrevinhadores do mundo todo!
Estamos numa
época trágica de muito sangue e violência por todo canto, de radicais
religiosos, de políticos viciados em defeitos seculares, de guerras
incompreensíveis pelo mundo, de homens bombas que matam crianças com sua fé, de
narcotraficantes que envenenam o mundo com seus rastilhos de cocaína e
desgraça, de pastores infiéis que roubam tudo de seus fiéis, até o dinheiro. É
uma montanha de desonestos intocáveis pelo mundo.
Os escritores devem encabeçar o mundo, ferir estes intocáveis com nossas espadas de faz de conta. Doutrinar o mundo todo com
nossos contos, nossas crônicas de alerta, nossas resenhas para incitar no povo
o raciocínio crítico e estancar as dores. Sabotar os violentos, feri-los com
nossas palavras escritas suas personalidades megalomaníacas. Superando-os em
raciocínio, coragem, abnegação e valentia. Superando-os na grandeza das ideias.
O mundo nunca precisou tanto de seus poetas, suas profecias e seus bordões de
inteligência.
É uma luta
universal e cabe aos escritores tomarem a iniciativa, darem o primeiro passo
para acenderem a luz da razão, pois a vida do homem na terra depende em quem
pensa por eles, quem os defenda dos maus, que lhes deite amor no coração, e
quem melhor para fazer isso do que um poeta? Para que se mude o mundo há de se
ouvir os poetas. É uma lição que o mundo deverá aprender.
Eu não sou apenas imortal eu tenho que me fazer imortal,
não posso viver apagado neste mundo, pois minha honraria é para poucos, quase
ninguém. Não posso viver no silêncio dos inocentes, daqueles que não pensam por
si, que não podem discernir a ingratidão com eles mesmos. Porque, nós, os
escritores, os poetas, temos que transbordar como os rios, se levantar como as
árvores, pois conhecemos pelas palavras o mundo como um marujo conhece o mar,
os plantadores de cebolas, a cebola, o amante, o amor, o vendedor de garapa,
sua moenda. Temos que localizar a ingratidão que fere os homens de bem e
alertá-los através das palavras.
Temos que construir isso passo a passo, da
casa velha, auréola aguerrida, de íntima estrutura, de janelas azuis que todo
mundo vê, sob o relógio parado da central, rodeada de museus, gente e ônibus
circulares, encurvada pelo tempo, tombada como patrimônio nas ruas desordenadas
e entrecruzadas do centro velho da cidade somente para abrigar os imortais mais
energizados do mundo sedentos para praticar a justiça e as verdades do nosso
tempo.
*Tharso José Ferreira é escritor e ocupa uma cadeira na
Academia Araçatubense de Letras
2 comentários:
Ótimo, você fez por merecer. Cumprimento-o meu caro.
Agora, é sair da vala comum, praticar ações que dinamizem a casa de Machado de Assis. Por opotuno, conversei com a professora Cidinha Baracat e ela esta precisando de ajuda para esse mister.
Parece um sonho. Sim, parece mesmo um sonho tudo isto que acabo de ler a respeito da evolução cultural de Araçatuba. Lembro-me muito bem dos primeiros passos dados nessa direção pela Cidinha (permita-me assim chamá-la. Morávamos na mesma rua - Primeiro de Maio. Residi por ali de junho l966 a fevereiro de l981,quando tomei o rumo de Campinas. Anos mais tarde, ao convidar o meu saudoso e inesquecível amigo Dr. Maurício de Aguiar Ribeiro para a solenidade da entrega de um prêmio literário a mim outorgado, tive a grata surpresa de saber que ele era um dos membros da Academia Araçatubense de Letras, assim como a Cidinha, O Dr. Geraldo Costa e Silva, o Consa e muitos e muitos outros e outras. Fico daqui chupando o dedo, a tomar conhecimento de toda essa movimentação, em especial por parte do Consa, incansável e persistente e idealista homem das LETRAS.
GAbriel, "Bié,o Prosador."
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