AGENDA CULTURAL

28.2.16

Cantora Babi Mendes em Araçatuba, próxima sexta (entrevista)


Babi Mendes, em companhia de um jazz trio (baixo, piano e bateria), apresenta um show com standards do repertório clássico de jazz e blues, além de composições de seu disco Short Stories, com o qual foi indicada ao Prêmio da Música Brasileira, no ano de 2012.

Dia 4/3, sexta, às 20h30 no Teatro Municipal Castro Alves em Araçatuba
Rua Duque de Caxias, 29 - centro 
*Ingressos disponíveis a partir das 19h30 na portaria do teatro. 14 anos. Grátis. Promoção do Sesc 


Entrevista com a cantora Babi Mendes

Entrevista publicada originalmente em julho de 2012, na 3ª edição da Revista Vila Nova

1 – Não é comum entre os músicos em evidência no cenário brasileiro um interesse profissional tão forte pelo Jazz e Blues, ainda mais desde tão cedo. Como começou tudo isto?
Acredito que por influência dos meus pais. Cresci ouvindo muita música. Meus avós tocavam piano em casa, sempre tocavam algum standard de jazz, além de música brasileira, e meus pais ouviam Tony Bennett, Frank Sinatra, Barbra Streisand, Chet Baker, Ella Fitzgerald, no carro, em casa… Acho que começou assim. Aos nove anos, pedi para me colocarem em um curso de inglês porque queria entender o que as pessoas estavam cantando.
02 – Quais foram as outras atividades profissionais desenvolvidas por você ao longo da vida e como foi conciliá-las com a música?
Sou formada em Letras e Jornalismo. Trabalhei como repórter em uma revista semanal e depois dei aulas de Português (Gramática, Literatura e Redação) e Inglês para Ensino Médio. Cantava apenas por hobby nessa época, pois trabalhava muito. Cheguei a ser sócia de uma escola de Inglês, em Santos. E, às vezes, me convidavam para algum trabalho profissional. Estudava o repertório de madrugada e adorava o que estava fazendo. Aos poucos, passei a cantar mais frequentemente, em bares e projetos de jazz e, com isso, gradativamente, passei a cantar mais do que dar aulas.
03 – Agora você se dedica inteiramente à música, não? Como foi preparar e executar essa transição? Como teve segurança para isso?
Foi algo natural. Decidi me mudar para São Paulo para estudar canto lírico e teatro musical. Já estava cantando mais nessa fase e dar aulas foi, aos poucos, deixando de ser minha fonte de renda. Além disso, tive total apoio dos meus pais para mudar de carreira e investir em música.
04 – Mas quais os motivos que te levaram a se entregar tanto ao estilo?
É o que está acontecendo no momento. Como escrevo o material que gravo, o Blues e o Jazz são gêneros muito próximos de mim… acho que foi o que mais ouvi, é o que me emociona e me faz querer fazer música. Mas, não quero me limitar. Acho que posso, no futuro, flertar com outros gêneros, mas sempre terei o Jazz como base de tudo.
05 – Quais os músicos mais influentes na sua carreira?
Ella Fitzgerald, Nina Simone, Billie Holiday, Frank Sinatra, Tony Bennett, Chet Baker, Miles Davies, Herbie Hancock, Sonny Rollins, Etta James, Anita O’Day, Shirley Horn… e a lista continua. Dos artistas atuais: Avishai Cohen, Norah Jones, Melody Gardot, Jane Monheit, John Pizzarelli, Diana Krall, DeeDee Bridgewater, dentre outros. Ouço muita música. Todos os dias. Desde sempre. Com isso, a lista é longa.
06 – Quanto ao Jazz e ao Blues no Brasil, quem são os artistas com maior talento atualmente? Quantos deles seguem carreira independente?
No Blues, a referência é o André Christovam. Tive a honra de conhecê-lo recentemente. O André conseguiu trilhar uma carreira linda no Brasil e no exterior. É muito talentoso e tem muito conhecimento. No Jazz, são muitas as referências, principalmente em música instrumental. Acho o trabalho do Chico Pinheiro espetacular. Outro trabalho que gosto muito é o do Delicatessen. São um grupo do Sul e fazem lindos arranjos de standards antigos além de composições originais.
07 – Como é trilhar uma carreira independente no Brasil? Como isso tem te ajudado a formar a identidade como músico?
É muito difícil trilhar uma carreira independente. Especialmente em países que não valorizam gêneros como o Jazz, o Blues. Hoje ouvi de um músico que dificilmente se fará música de alta qualidade caso um artista deseje a fama. A notoriedade é mais buscada do que o ofício do músico. E, infelizmente, a indústria se alimenta de modismos e músicas de péssima qualidade. Como uma artista independente, consigo trilhar meu caminho, fazendo escolhas que são interessantes para o meu trabalho, mas me limito a um certo público e a locais específicos para apresentações.

08 – O primeiro disco, ‘Short Stories’ foi gravado entre o fim de 2010 e o começo de 2011. Como foi criar e gravar o disco?
Foi uma grande surpresa, na verdade. Senti que era a hora de gravar e o Flávio Medeiros, produtor, me incentivou a gravar meu próprio material depois que ouviu uma das minhas músicas. Foi quando percebi que o trabalho de composição era tão importante para mim quanto o canto.
09 – A julgar pelo título, o disco se relaciona com a literatura…
Sim. É um disco autobiográfico. Gosto muito de escrever memórias. Mantenho diários há muito tempo e as letras remetem à cenas da minha vida. São como contos.
10 – Como tem sido a aceitação do disco e a repercussão disso tudo em sua carreira?
O disco tem sido muito bem recebido. Para um disco independente, sem patrocínio ou selo ou gravadora, tem sido fantástico. Recebi boas críticas e recentemente o disco foi indicado ao 23º Prêmio da Música Brasileira na categoria de Melhor Álbum em Língua Estrangeira. Ele acabou indo muito mais longe do que eu podia imaginar.
11 – Qual a formação normal de sua banda e quais outros tipos de formação lhe parecem interessantes?
Normalmente me apresento com quatro músicos: baixo, bateria, guitarra e sax. Mas o disco foi gravado com piano, trompete e trombone também. Posso me apresentar com um trio ou com uma big band. O bom do gênero é isso.
12 – Assistindo algumas de suas apresentações, pude observar uma maneira bem própria de estar no palco. Parece algo natural mas também fruto de ensaio, sem extravagância ou artificialidade, ao passo que se relaciona muito bem com a música interpretada. Como desenvolveu esta forma de se apresentar no palco?
Eu estudei teatro musical e por isso tenho em mente que não posso cantar uma canção sem compreendê-la ou interpretá-la. Com o meu material original é mais fácil, pois consigo visualizar imagens, ter as referências mais precisas… Mas, quando canto composições de outros autores, tento dar a minha interpretação à canção. Acho que é assim que você consegue atingir as pessoas, contando histórias.  
13 – Que outros tipos de artistas influenciaram seu modo de fazer arte, cantando, compondo ou se apresentando no palco?
Escritores, bailarinos, atores. Sou muito fã de teatro, cinema e literatura. Leio tudo o que tenho vontade e gosto de avaliar a maneira como as pessoas se portam. Na verdade, o jornalismo me trouxe a ferramenta da observação e pude ver muitos dos meus ídolos ao vivo, com isso, acho que, naturalmente, vou agregando tudo aquilo que me inspira.
14 – Em contraste com o tipo de música que você produz, vê-se, já há um bom tempo, no Brasil e em vários lugares do mundo, o sucesso de muitas canções musicalmente pobres, de péssimo gosto. O que dizer disso?
São modismos. E como todo modismo é efêmero e vazio. Acho que toda manifestação artística de verdade se sustenta com o tempo. O problema é não haver espaço para artistas verdadeiramente talentosos.
15 – Muitas músicas têm favorecido a degradação moral, especialmente da mulher, por meio de letras e danças extremamente promíscuas. O que você acha disso e o que se pode fazer a respeito?
Acho que a música de má qualidade é uma consequência da cultura de modo geral no Brasil e no mundo.  O que posso fazer é não parar de produzir minha música como a vejo, pois acredito que por mais que não seja o que se tem como comercial nos dias de hoje, é a minha arte. É a minha verdade. E algumas poucas pessoas ainda se identificam com arte sendo feita desta maneira.
16 – Tudo isto reflete, sem dúvida, uma violenta degradação cultural: há alguns séculos tínhamos música erudita de excelente qualidade; há algumas décadas tínhamos Jazz, Blues, Samba, Forró, Bossa Nova e outras belas manifestações da música popular (hoje temos um pouco de tudo isso, mas perdendo espaço para a música sem valor artístico algum). Como vê sua música em meio a esse cenário?

Acredito que minha música, infelizmente, não vai chegar a muitas pessoas por fugir da atual proposta do que é comercial. Mas, tenho um público específico, que já gosta do gênero, de pessoas que pesquisam novos artistas e que, normalmente, não consomem o “mainstream”. 

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