AGENDA CULTURAL

8.6.16

Morreu Sidney Cinti, um homem que sabia cavar a vida


Hélio Consolaro* 

Recebi uma mensagem pelo Messenger "Cinti morreu", porque o Gordo, como às vezes era chamado, já havia morrido antes, numa cirurgia bariátrica. 

No momento de uma notícia dessa, há um sentimento de fraqueza, ou seja, todos têm a sua hora, não somos ninguém. O seu passamento me trouxe várias recordações.

Eu fui eleito vereador em 1982, quando eu tinha 34 anos, na sublegenda 3, cujo candidato a prefeito era o vereador recém-egresso da Arena Sidney Cinti (naquela época existia isso, repartir o partido em até três fatias), uma forma de driblar o bipartidarismo. De lá para cá, Cinti não parou em partido algum. Foi um apoiador incondicional de Collor.

As outras sublegendas do PMDB foram ocupadas por Waldir Felizola e João Rezek. Um vendedor de seguros, que até livro de marketing político publicou posteriormente, para se virar na vida, tendo como vice um eminente advogado e professor da Toledo, Valter Tinti, derrotara os dois fazendeiros. Cinti fora eleito prefeito de Araçatuba com pouco mais de 13 mil votos: 1/5 dos votos. Veja, caro leitor, que absurdos produziram os casuísmos praticados pela ditadura militar.



Sylvio Venturolli, do PDS, não quis saber de sublegenda, saiu sozinho. Individualmente, foi o mais votado, mas não levou, porque a soma das três sublegendas do PMDB deu o dobro de sua votação, sendo Cinti o mais votado dentre os três.  

Sidney Cinti que se apresentava como o vicentino fervoroso teve a adesão da esquerda do PMDB. Esse namoro só durou o primeiro ano de governo. Em 1984, Roque Soares deixara a administração como secretário, eu já era oposição na Câmara Municipal e em 1985, passei para o PT.

Depois disso, o Gordo, como era popularmente chamado, foi deputado estadual, voltou a ser vereador e presidente da Câmara Municipal. Na eleição de 2012, fez marcação cerrada em cima do candidato Dilador Borges (PSDB), pois embora não morasse mais na cidade, seu domicílio eleitoral continuava sendo Araçatuba. Durante a campanha a prefeito, ficou hospedado no Pekin Hotel.  

A marca registrada de sua passagem pela Prefeitura Municipal de Araçatuba foi a construção do Calçadão da Marechal e da Princesa Isabel. Havia uma oposição dos comerciantes do local a isso, mas na madrugada de uma segunda-feira, as máquinas da Prefeitura entraram e cavoucaram tudo. 



Foi um alvoroço. Naquela época se podia fazer isso; antes da Constituição de 1988, o prefeito mandava e desmandava, não havia o Ministério Público que mandasse mais que o Executivo, como acontece hoje.  

Na sua última vereança, houve um atrito da atual vereadora Edna Flor (que era PT), juntamente com o padre Valdir Silvestre, envolvendo a presença de um guarda-roupa defronte ao Palácio 9 de Julho. Ele era impulsivo, desbocado.

Durante o seu mandato de prefeito, separou-se da mulher para se juntar (e depois casar) com sua secretária Conceição Okida, uma carioca então casada com um médico de Araçatuba. E a colocou como presidenta da antiga autarquia, o DAEA. Foi um escândalo. 



Em 1986, antecipou sua saída da Prefeitura por causa de acusações da oposição, que envolvia o Projeto Cura (Governo Federal), que permitiu a canalização do córrego Machado de Melo, que transbordava nas chuvas, invadindo o Mercadão Municipal e as casas das adjacências. Helião afirmava que tinha documentos comprometedores numa pasta, Cinti achou melhor antecipar o seu afastamento para participar das eleições de deputado estadual. Assumiu o vice Válter Tinti.

A oposição da época na Câmara Municipal era composta pelos seguintes vereadores: o médico Synésio de Oliveira Borges, empresário Hélio Pereira de Souza, professor Hélio Consolaro. E, às vezes, o despachante Eduardo Lóis e o radialista Valtenir Pereira Dias, o Tuta, que oscilavam entre situação e oposição. 

A nossa última conversa foi na Rádio Excelsior de Araçatuba (comunitária), onde ele tinha um programa radiofônico, eu fora entrevistado por ele. Preparava sua candidatura a prefeito de 2012. 

A nossa vida é como arquivo digital no computador. De vez em quando, saímos a deletar alguns arquivos. Alguns farão falta, outros só ocupavam espaço. Assim, o Pai Eterno apagou uma pasta chamada Sidney Cinti. 

A sua morte enfraquece o velho modelo de fazer política, o populismo. Araçatuba, nesta eleição municipal de 2016, terá candidatos mais contidos, sem discursos eloquentes e gestos rasgados. 

A perda sempre é dolorida. Minhas condolências aos familiares.

*Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. 

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