O pai do jornalista Jean Oliveira é o Seu Jeová, morador de Andradina, apreciador de meu estilo de escrever. Mal sabe ele que tem um filho que escreve melhor do que eu, o Jean. Gostei tanto da última crônica dele publicada na Folha da Região que a estou reproduzindo aqui, neste blog, com autorização do autor. Isso aqui não é um nobre portador, trata-se de uma nova mídia, pode ser que estou rebaixando o texto do jovem, mas é o que tenho para expressar minha admiração. Parabéns, Jean; por tabela, parabéns, Seu Jeová.
Deus age pelas beiradas
Jean Oliveira*
“Deus é paciência. O contrário é o
diabo”. A frase é do personagem Riobaldo, de “Grande Sertão: Veredas”, livro de
João Guimarães Rosa escrito em 1956. Nesta, e em outras passagens do livro, o
sertanejo matuto explica sua visão sobre o bem e o mal. E com sua sabedoria de
homem que viveu muito e aprendeu observando a vida, explica que Deus age pelas
beiradas, aos poucos, fazendo sua obra, em nós, devagar e sempre.
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Capa de livro |
Em certa passagem do livro, Riobaldo
conta que aprendeu como Deus opera quando trabalhava em um curtume. Nesta
ocasião, ele deixou uma pequena faca cair em um tonel em que o couro era
preparado, mas por ser noite, deixou para pegá-la no outro dia. Só que quando
voltou, a lâmina havia sido consumida quase toda pelo produto químico. Por
curiosidade, a deixou lá para ver o que aconteceria. No final do dia, da faca
havia sobrado apenas o cabo que era feito de chifre - por isso não fora
corroído. A lâmina, nada restava.
Nesta passagem, Riobaldo explica que
“Deus vem vindo: ninguém não vê. Ele faz é na lei do mansinho – assim é o
milagre. E Deus ataca bonito, se divertindo, se economiza”. Com isso, Ele vai lapidando
as pessoas, pois como bem disse Guimarães Rosa por meio do seu personagem, “o
mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre
iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando.”
Por isso tudo, a vida sempre exige
que a gente tenha força e perseverança. Devemos aprender a nos desapegar do
imediatismo do qual estamos acostumados. Como tudo está à beira de um clique,
de uma decisão instantânea, acabamos achando que Deus tem a mesma urgência.
Associamos o poder Dele ao nosso desejo de que tudo se resolva como um passe de
mágica.
Devemos entender que Deus não está necessariamente preocupado com nossas
demandas cotidianas. Claro que Ele nos ajuda quando procuramos seu auxílio,
pois disse que abrirá sempre a porta àquele que bater. Porém, é melhor desejar
que Ele faça o que é melhor para nós, no tempo Dele.
E neste sertão da nossa vida, que sem sempre é vereda, mas pode ser
sempre bela paisagem, temos que nos lapidar para entender que além da areia
branca, existe a árvore verde das coisas boas que resiste à seca de bons
sentimentos e à falta de chuva de tranquilidade. Assim é o milagre que sempre
queremos, mas nunca vemos.
Perdoem-me os leitores que não têm fé, mas como afirma Riobaldo, "como
não ter Deus?! Com Deus existindo, tudo dá esperança: sempre um milagre é
possível, o mundo se resolve. Mas, se não tem Deus, há-de a gente perdido no
vaivém, e a vida é burra. É o aberto perigo das grandes e pequenas horas, não
se podendo facilitar - é todos contra os acasos. Tendo Deus, é menos grave se
descuidar um pouquinho, pois no fim dá certo. (...) Deus existe mesmo quando
não há”.
*Jean Oliveira é jornalista efetivo da Prefeitura Municipal de Araçatuba-SP
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