AGENDA CULTURAL

2.3.20

Literatura e mulheres


Hélio Consolaro*

A questão do feminino na literatura é bem polêmica. Se existe diferença de ser entre os dois sexos, essa diferença deve se manifestar também no jeito de ver o mundo.

Na Idade Média, no chamado Trovadorismo português, as canções de amigo tinham como característica serem escritas por homens, cujo eu lírico era feminino. Ou seja, o homem escrevia como se fosse uma mulher, como na letra da música “Atrás da Porta”, de Chico Buarque.

E por muito tempo, a mulher não teve voz própria na literatura, que era uma atividade para homens. O ser feminino não podia pensar em si, nos seus problemas existenciais e muito menos expressá-los.

Há escritoras que não aceitam o tratamento de poetisa, porque dizem que a poesia não tem sexo, querem ser chamadas de poetas.
Dizem as próprias mulheres que não há uma literatura masculina o outra feminina, o que há é literatura de autoria masculina e de autoria feminina. Disse Freud que o sexo não chega a se manifestar no inconsciente.

Numa conversa, a escritora Maria Luzia Villela me revelou anos atrás que uma leitora de seu conto publicado no livro Experimentânea 6 – Na rede da varanda - lhe dissera que o texto tinha um olhar masculino.

É possível, pois há mulheres que não contestam a subalternidade aos homens, consideram mesmo que o homem é superior. E quando escrevem, essa masculinidade subliminar aflora. 

Em Araçatuba, a publicitária Cintia Brasileiro escreveu seu TCC “Uma análise sobre as escritoras araçatubenses”, sob orientação de Tito Damazo, na UniToledo, e expôs aos acadêmicos da Academia Araçatubense de Letras. Há muitas mulheres escrevendo na cidade.

Ser mulher e ser escritora já foi mais difícil. Cora Coralina quem o diga, precisou esperar o marido falecer para se mostrar como escritora, não lhe era permitido ter visibilidade como tal.



Clarice Lispector quando surgiu no cenário da literatura brasileira, dominado pelos escritores nordestinos, como Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Jorge Amado, suas obras foram tratadas como literatura menor, uma espécie de autoajuda feminina. Hoje, ao lado de Machado de Assis, é a escritora brasileira mais estudada em universidades estrangeiras.

Na Academia Brasileira de Letras, só em 1977, a primeira mulher adentrou seus portais, era Raquel de Queirós. E a eleição da primeira presidenta só ocorreu em 1996, com Nélida Piñon.

A escritora mulher precisou conquistar seu espaço aos empurrões. Às vezes, rebelde e chamada de nomes nada agradáveis pela sociedade conservadora. Não estava nela apenas a literatura, com sua voz própria, mas também a feminista. Para fazer isso, precisou ter quarto para si e renda própria, como pregava a escritora inglesa Virgínia Woolf (1882-1941).

*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Membro das academias de letras de Araçatuba-SP, Andradina-SP, Itaperuna-RJ  

2 comentários:

Jane Novaes disse...

Infelizmente a mulher ainda negligência a sua capacidade. ..É muito triste

Unknown disse...

Não só na temperatura. A a maioria das mulheres do meu tempo eram escravizados pelos pais e pelos maridos.