AGENDA CULTURAL

7.8.20

Viver e deixar o outro viver. Abaixo o fanatismo religioso


Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP

O Sebastião Jr, pré-candidato a prefeito de Araçatuba pelo PT (pois candidato bom tem que ser assim, porreta, não tolera injustiça, não faz média com a intolerância e o preconceito) me chamou a atenção para uma numa notícia: "Mãe perde guarda da filha após jovem participar de ritual do candomblé". Juro que li isso muito rapidamente numa notificação do UOL (leia-se Folha de São Paulo) na tela do computador e não dei a devida atenção. 

Como acontece todos os absurdos por esse mundo de meu Deus, nunca imaginava que isso estava acontecendo em Araçatuba, debaixo de meu nariz. Com a indicação do Sebastião, corri atrás da notícia. 

Como é difícil ser negro, viver em paz, num país que foi construído por gente de cor. Não podem nem professar a religião de seus ancestrais. Ninguém denuncia alguém que leva uma criança pela mão a uma igreja evangélica, católica e outras. O fanatismo faz criar a intolerância, a inventar a mentira, a calúnia, a produzir fake news.

Todas as religiões têm algo estranho, elas trazem em seus ritos a ancestralidade. A católica tem como símbolo uma homem sendo torturado numa cruz. Que imagem mais mórbida, mais chocante, com tanta violência. Como sou católico, acho o crucifixo a coisa mais normal do mundo.

Os evangélicos pentecostais entram em transe, gritam, durante os cultos. Como moro ao lado de uma igreja assim, escuto as mais variadas manifestações. Nunca chamei a polícia para internar todos num hospício. E isso faz 38 anos. Porque não atrapalham o meu sono, não me impedem de fazer as festas de vez em quando no fundo de meu quintal. Já me acostumei tanto com eles, que são meus vizinhos amigáveis. Isso se chama tolerância, vivo e deixo o outro viver também.

No mesmo quarteirão onde moro (ele é diverso e ecumênico, graças a Deus), há uma casa com um terreiro de candomblé. Na sexta feira, há os cultos, embora seja quase defronte à minha casa, o barulho é abafado e baixinho, nunca me incomodou. Quero que eles vivam, tenham a sua fé, são meus irmãos. 

Já participei de várias campanhas eleitorais. Todos os candidatos visitam igrejas e também os terreiros. Ser candidato é uma aprendizagem, ser prefeito, vereador, secretário municipal também; a pessoa passa a conhecer todos os metros quadrados da cidade.  

Não vou descadeirar a evangélica que fez a denúncia, inventou uma série de coisa, porque ela foi cegada pelo fanatismo. As nossas autoridades não podem navegar no mesmo atraso, estamos sob o vigor da Constituição Cidadã de 1988.  

(Sebastião Júnior, obrigado, continue assim, não se cale diante do descalabrado, pensando que está ganhando votos.) 

LEIA A NOTÍCIA DO UOL, CLICANDO AQUI.  

NOTÍCIA DA MOBILIZAÇÃO:
https://www.folhadaregiao.com.br/2020/08/14/manifestantes-vao-as-ruas-em-protesto-contra-a-intolerancia-religiosa-em-aracatuba/

NOTÍCIA DA VITÓRIA:
https://g1.globo.com/sp/sao-jose-do-rio-preto-aracatuba/noticia/2020/08/14/justica-revoga-guarda-provisoria-concedida-a-avo-de-menina-que-passou-por-um-ritual-de-candomble.ghtml 
           

Um comentário:

ESTACÃO BRASIL (UP GRADE) disse...

Não é surpreendente ou incomum que membros de uma mesma família tenham discordâncias religiosas até radicais...a História está cheia disso. O que é INCOMUM E ILEGAL é que o ESTADO, na pessoa de CONSELHO DA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA E PROMOTORIA ajam desta maneira. Trespassando o fino véu de Proteção que está representado pela LEI os AGENTES PÚBLICOS só PODEM FAZER O QUE ESTÁ PREVISTO NA LEI, ao contrário dos cidadãos, QUE PODEM FAZER TUDO o que não está EXPRESAMENTE PROIBIDO LEGALMENTE. Nos casos mais EXIGENTES, a LEI estabelece O QUE DEVE SER GARANTIDO PELO ESTADO como DIREITO MÍNIMO E GARANTIDO PARA TODOS!
A LEI não pode servir para DAR APOIO A NENHUMA VISÃO OU PONTO DE VISTA RELIGIOSO SOBRE OUTRO PONTO DE VISTA RECONHECIDO COMO TAMBÉM RELIGIOSO.
Uma vez COMPROVADO que a menina NÃO TINHA QUALQUER DANO FÍSICO ou psicológico VISÍVEL a Promotoria deveria, por Lei, devolver a guarda da menina.
Ao não fazê-lo interferiu no Direito da família, mãe e pai, de escolher sua Religião e por consequência COMETEU UM ABUSO LEGAL ao tomar partido em uma DISPUTA RELIGIOSA.
Não cabe ao agente público no Estado Democrático de Direito escolher QUAL RELIGIÃO os pais devem seguir para educar uma criança. A UMBANDA, assim como muitas outras instituições religiosas TEM GARANTIDA POR LEI SUA EXISTÊNCIA não havendo NENHUM IMPEDIMENTO LEGAL que nela participem crianças.