Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Araçatba-SP
Dizer que a esquerda foi derrotada com a eleição de
Bolsonaro no Brasil é apenas um jogo de palavras, porque na verdade a
valorização da democracia no Brasil atual foi construída por governos de
centro-esquerda, tanto do PSDB como do PT.
Até outro dia, eu achava o tucanato o pior dos mundos,
contaminado pelo jogo de poder no meu estado, São Paulo. Com a eleição de
Bolsonaro e as ações de seu governo, descobri que o PSDB não é tão ruim assim,
é uma centro-direita civilizada.
Se os radicais da direita estão acuados atualmente dentro
do atual governo, isso se deve à educação promovida pela esquerda quando esteve
no governo. A esquerda não foi tão incompetentes ao governar.
Se houve o auxílio emergencial à população nesta pandemia
(cheio de irregularidades), se deve à implantação do Bolsa Família de Eduardo
Suplicy. Se o Fundeb permaneceu, passando por vitória esmagadora na Câmara dos
Deputados, foi uma vitória da esquerda, pois mostrou que o fundo é uma
ferramenta válida, como avaliou Fernando Haddad.
Nesta pandemia, nunca se
valorizou tanto o Sistema Único de Saúde, até lideranças da direita se renderam
e valorizam o SUS.
Numa sala de espera de agência bancária, durante a
eleição de 2018, ouvi um sujeito dizer em voz alta que votaria em Bolsonaro, “mas
se não prestar, a gente tira, no voto, com impeachment”. Não ouvi a palavra
golpe militar. Em recente pesquisa feita pela Folha, 75% dos brasileiros apoiam
a democracia.
As forças progressistas (chavão bastante usado) não pode
reduzir a luta política a uma manobra maniqueísta, o objetivo é construir um
mundo de excelência, fazer com que o coração da humanidade seja repleta de bons
sentimentos. As recaídas fazem parte do processo de aprendizagem. Como afirma Leonardo
Boff, Deus vai escrevendo nas linhas tortas de nossa história.
Às vezes, a direita quer repetir algumas medidas da
esquerda e mostra incompetência, falta-lhe a natureza para o social, porque
sempre praticou a exclusão. Incluir não é passar a mão na cabeça do pobre.
AUXÍLIO EMERGENCIAL
Ninguém tem a memória tão curta para esquecer as constantes
denúncias de fraudes que eram feitas pela direita sobre os desvios do programa
Bolsa Família quando o governo federal era comandado pelo PT. Na verdade, as
denúncias de corrupção no auxílio emergencial são bem maiores, um dinheiro
entregue sem nenhuma contrapartida de quem o recebe. Bem parecido com esmola.
Bolsa Família era um programa descentralizado em que
todas as forças políticas da nação participavam dele, inclusive as próprias
prefeituras. Em ações descentralizadas, as irregularidades são mais possíveis
de ocorrer.
Não era como o auxílio de R$ 600,00 cuja administração é
feita de forma centralizada, por aplicativo, sem nenhum controle da sociedade,
sem preocupação em formar cidadania.
Um governo que desprezou todas as ONGs, chamando-as, sem
exceção, de corruptas, não iria pedir que elas participassem da distribuição do
dinheiro e a fiscalizassem. Afinal, Bolsonaro é um governo que não admite a
participação popular. Apenas confia no Twitter, em relações unilaterais.
EIS ALGUMAS DENÚNCIAS:
· 189
695 militares receberam indevidamente o auxílio emergencial de R$ 600,00;
· Dono
das lojas Havan foi beneficiado com a ajuda de R$ 600,00 do governo federal;
· Falhas
escandalosas dos governos federais permitem fraudes no auxílio emergencial;
· Até
presidiários receberam o abono.
As redes sociais que pareciam algo avançado, e são, pois são
ferramentas importantes nas democracias modernas, foi apropriada pela direita
para fazer manipulação eleitoral por meio de robôs e ganhar eleição em vários
países, como no Brasil. As esquerdas precisam repensar isso, valorizar mais as
redes sociais.
As forças progressistas têm muito a comemorar se
permanecerem juntas nas futuras eleições, não fazendo o jogo do adversário.
Valorizar o legado.
(Artigo publicado no site Todo Dia É Dia - Brasília, 10/08/2020)
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